Pandemia de Covid19 amplia a subnotificação da violência contra crianças e adolescentes
O avanço do isolamento social tem se mostrado um desafio à proteção de crianças e adolescentes contra a violência, sobretudo as violações sexuais. Ao longo do ano de 2020, a média mensal de violações sexuais denunciadas ao Disque 100 (Disque Direitos Humanos) sobre violações sexuais caiu de 1631 ocorrências, em janeiro, para 1127, no mês de dezembro – uma redução de 30,9%. Dentre elas, chama a atenção os dados registrados sobre estupros. A comparação entre o primeiro e último mês, do último ano, aponta um declínio de 68,4% na média mensal de violações desta natureza denunciadas. Especialistas da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) alertam para o aumento da vulnerabilidade de crianças e jovens devido à restrição de circulação e maior tempo exposta a eventual contato de adultos com comportamento abusador.
Os dados coletados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH) apontam queda mais acentuada nos períodos de maior recrudescimento da pandemia de Covid-19. A ginecologista Dra. Erika Krogh, membro da Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Infanto Puberal da Febrasgo, comenta que, “muitos serviços de denúncia e acolhimento tiveram redução de suas atividades, em função da crise sanitária, gerando menor número de notificações e busca por serviços de saúde. Precisamos considerar os serviços de saúde às vítimas como serviço essencial”.
A médica acrescenta que essa subnotificação dificulta a responsabilização de abusadores. Comumente, as vítimas de abuso, violência e exploração sexual encontram barreiras para denunciar seus agressores dadas as dificuldades em realizar flagrantes; provar a ocorrência de violência, sobretudo quando esta não deixa marcas no corpo; o preconceito contra a vítima de abuso; e ainda ao fato de a palavra da mulher ser muito colocada em cheque.
De acordo o MDH, abuso sexual de crianças
e adolescentes consiste numa relação desigual de poder em que o agressor adulto
ou adolescente mais velho se apropria e anula as vontades da vítima, tratando-a
como objeto de prazer e alívio sexual, não como uma pessoa sujeita de direitos.
Os termos englobam todo ato de natureza erótica, com ou sem contato físico, com
ou sem força.
Prevenção
O ginecologista Dr. Robinson Dias de Medeiros, presidente da Comissão Nacional Especializada em Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei, aponta que 85,7% das vítimas de violência sexual são do sexo feminino e, em sua maioria (57,9%), tem no máximo 13 anos de idade*. O médico explica que “os fatores que envolvem a prevenção de abusos e exploração sexual abarcam toda a cultura de um povo, o combate ao machismo estrutural. Eu vejo que a somente a educação e a redução da situação de vulnerabilidade – isto é, a diminuição da pobreza e melhora da condição de vida das famílias – associadas a políticas de saúde que promovam o acolhimento podem proteger nossas crianças e jovens“.
Os especialistas explicam que os sinais
de uma possível situação de abuso ou exploração sexual pode se manifestar por
meio de:
- Mudança brusca de comportamento (por
vezes, na forma de agressividade ou retração);
- Compulsão alimentar ou perda de
apetite;
- Automutilação;
- Sexualização precoce (atos ou
comentários que indicam maior exposição a conteúdos ou experiências sexuais);
- Aversão a pessoas mais velhas, sobretudo
com perfil semelhante ao do agressor;
- Desejo de fugir de casa.
- Presença de infecções sexualmente transmissíveis.
Dentre as consequências do abuso
sexual, figuram tendências depressivas e suicidas, ao abuso de álcool e drogas,
à prostituição e, por vezes, dificuldade futura de desenvolver relações sexuais
desejadas.
*Dados do
Anuário Brasileiro e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020.
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