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sexta-feira, 2 de abril de 2021

O uso desafiador de aparelhos ortodônticos em pacientes autistas

Abordagens diferentes em busca do mesmo objetivo


O Dia Mundial de Conscientização do Autismo é comemorado em 2 de abril e essa data simboliza uma luta diária por inclusão e maior divulgação de informações corretas sobre o transtorno, que é uma realidade para mais de 70 milhões de pessoas em todo mundo. 

O transtorno relacionado ao desenvolvimento neurológico – Transtorno do Espectro Autista (TEA) –, popularmente conhecido como autismo, se caracteriza por sinais e sintomas que se manifestam na dificuldade em se comunicar, em interagir socialmente e por movimentos ou interesses repetitivos. O TEA apresenta uma grande variedade quanto à severidade dos sintomas e os graus da doença são diferenciados de acordo com o nível de dependência e necessidade de suporte de cada indivíduo. 

“A Odontologia é a mesma para todos”, essa é a definição da presidente da Câmara Técnica de Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais e cirurgiã-dentista, Adriana Zink, quando o assunto é o uso de aparelhos ortodônticos por pessoas com TEA. Ela esclarece que a ortodontia e a ortopedia caminham juntas e visam uma harmonia de forma e função no sistema estomatognático (conjunto de estruturas bucais que consiste de constante participação da mandíbula). Com isso, o resultado que se espera no tratamento dos autistas é o mesmo que dos demais pacientes.

A necessidade de tratamento ortodôntico na comunidade autista se equivale ao restante da população, mas é importante levar em consideração que pessoas com TEA têm muitas alterações sensoriais e, por conta disso, encontram dificuldades ao lidar com texturas, cheiros, toques: “Muitas vezes, o tamanho da escova, o sabor do creme dental, a força que a mãe aplica na escovação, a proximidade da mão da mãe ao escovar, entre outros fatores, podem provocar incômodo no paciente autista”, explica a profissional.

Os autistas também costumam ser muito visuais e essa característica deve ser considerada ao explicar para uma criança com TEA que ela irá usar um aparelho ortodôntico. Para isso, uma boa alternativa é usar materiais estruturados com pistas visuais.  

Adriana explica que pessoas com TEA são realmente únicas e, por isso, requerem atenção especial, mas o ideal é não impor limites a ninguém e trabalhar as potencialidades de cada um: “É possível tentar qualquer tratamento em pessoas com TEA. Temos que condicionar o paciente para minimizar o estresse durante as consultas e tornar o tratamento previsível". 

De acordo com a cirurgiã-dentista, infelizmente não há como prometer o sucesso dos procedimentos. "Devemos dividir com os pais as possíveis formas de tratamento, expor as dificuldades e juntos decidir a melhor alternativa”. Para exemplificar, Adriana supõe que, no caso de gêmeos com TEA, um pode aceitar bem o tratamento ortodôntico, enquanto o outro não.  

Quanto à escolha do tipo de aparelho a ser usado, ela deve ser personalizada: “Já tive pacientes que se adaptaram bem aos aparelhos móveis e outros ao fixo. Como também, tive aqueles que jogaram o aparelho móvel pela janela do apartamento e outros que quase arrancaram o dente tentando remover o fixo. Temos que ter muita responsabilidade nestas indicações e estar atento às alterações comportamentais para evitar acidentes”, alerta.

Adriana reforça a importância de acompanhar de perto cada caso. “Já aconteceu de o paciente usar o aparelho fixo por 6 meses e de repente querer retirar. Nesse caso não temos o que argumentar, devemos remover o aparelho antes que ele tente retirar sozinho”. 

Um outro caso mais complexo envolveu um paciente que precisou ser internado após um surto e a equipe médica solicitou que o aparelho fosse removido, pois ele estava mutilando as mãos com mordidas. "Fiz uma avaliação na clínica e, junto com a família, resolvemos que a remoção seria realmente a melhor opção”.

Há três níveis de autismo (do mais leve ao mais severo), mas isso não caracteriza o nível de aprendizado. Por isso, segundo a profissional, é essencial que não se rotule ninguém pelo diagnóstico mas que se individualize o paciente“Podemos ter um autista nível 3 que aceite o tratamento ortodôntico e um nível 1 que não aceite”, afirma Adriana Zink, que recebe frequentemente pessoas com os três níveis de autismo em seu consultório – com uma prevalência de pacientes meninos no nível 2 (moderado).


Pandemia trouxe novos desafios aos tratamentos

Há mais de um ano afetados pela pandemia de Covid-19, a cirurgiã-dentista relata como estão os tratamentos dos seus pacientes com TEA. “Muitos pacientes ficaram sem terapias e isso desorganizou os tratamentos. Percebi que muitos diminuíram o número de escovações e aumentaram a ingestão de carboidratos. Alguns tiveram um agravante com a compulsão alimentar e observei um aumento de cárie e doenças gengivais". 

Para amenizar a situação, ela explica que todos os seus pacientes têm materiais para trabalhar a higiene bucal em casa por meio de orientação com o cirurgião-dentista, aplicativos, pistas visuais e vídeos. "Esse material auxilia os pais a manterem a atividade da ida ao dentista na rotina da criança e isso favorece o retorno", garante

Para a cirurgiã-dentista todos estão tendo que se adaptar às novas rotinas e hábitos impostos pela pandemia. "Estamos tentando reorganizar tudo isso. Por conta das alterações sensoriais, os pacientes com TEA têm dificuldade de aceitar o uso de máscaras (direito adquirido na justiça para o não uso), e estão mais expostos à contaminação pela Covid-19. Isso também aumenta o risco do profissional de se contaminar, exigindo ainda mais cuidados".

 



Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP)

www.crosp.org.br


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