De forma prática e
objetiva, a COVID-19, doença causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, exigiu que
nefrologistas, urologistas e equipes multidisciplinares de atendimento ao
transplante renal procedessem ajustes nas tomadas de decisões, diante de
incertezas provocadas pela ausência de experiência relacionada à pandemia e os
riscos para o receptor.
A qualidade de vida de
pacientes que apresentam falência renal definitiva é algo que deve ser
considerado diante da necessidade de diálises periódicas como forma de manter a
vida, quando não há a possibilidade de um transplante renal.
Lembramos que as
principais funções dos rins são: eliminar as impurezas do sangue; regular a
pressão arterial; produzir hormônios; participar na formação e na manutenção
dos ossos e estimular a produção de glóbulos vermelhos.
O transplante renal
é considerado o melhor meio de retorno ao equilíbrio da função renal e das
rotinas cotidianas, resultando na imediata melhora da qualidade de vida do
paciente. O transplante é um procedimento cirúrgico, em que um rim saudável de
uma pessoa viva ou com morte encefálica é doado a um paciente portador de
insuficiência renal crônica avançada (receptor).
No último ano, em
razão da pandemia pela COVID-19, houve um impacto universal na rotina dos
transplantes. Estudos mostram que nos Estados Unidos, ainda na primeira semana
após a declaração da pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 19 de
março de 2020, observou-se a suspensão das cirurgias na ordem de 80% nos
serviços que realizam os programas de transplante de rim de doador cadáver (morte encefálica) e 72% dos doadores
vivos. Sabemos que os receptores de transplante de rim têm um maior risco de
doenças infecciosas em razão do uso de remédios imunossupressores, necessários
para evitar a rejeição do órgão transplantado.
Segundo dados da Sociedade
Brasileira de Nefrologia e da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos
(ABTO), no ano de 2019, que antecedeu a pandemia da COVID-19, o Brasil era o
segundo país em termos absolutos de transplantes renais no mundo (6417
transplantes renais), atrás apenas dos Estados Unidos, com 24.273
procedimentos. Em números relativos por milhão de pessoas, éramos o 25º
colocado dentre os países com mais doadores (vivos e cadáveres), não suprimindo
a necessidade nacional. A demanda aumentava com a admissão de novos pacientes,
perto de 10.000 novos casos/ano, e aproximadamente 1.300 pacientes morriam na
fila aguardando uma oportunidade de transplante. Existiam cerca de 130.000
pacientes em diálise no Brasil e, destes, aproximadamente 30.000 estavam
inscritos em serviços habilitados do Programa Nacional de Transplante Renal.
Dados da Associação
Brasileira de Transporte de Órgãos (ABTO) mostram que no último ano houve uma
queda nas taxas de doação e de transplante de órgãos com doador falecido. As
taxas variaram entres as regiões e períodos, diante da gravidade da pandemia, e
em algumas vezes os procedimentos cirúrgicos foram suspensos temporariamente,
em razão da necessidade de disponibilizar leitos em hospitais; e também por
serem considerados eletivos ou pelo potencial risco para o receptor e doador,
em se tratando de transplantes de rim com doador vivo. Ressaltamos que os
transplantes renais, a partir de doadores cadáveres portadores da Covid-19 são
formalmente contraindicados, seguindo as diretrizes e normativas do Ministério
da Saúde.
Em 2020, observou-se
no território nacional uma queda de 24,5% na taxa de transplantes renais, sendo
de 17,2% nos transplantes com doador falecido e de 59,6% naqueles com doador
vivo, valor que retomava taxas obtidas no ano de 2009. Em oposição, a lista de
espera para transplante renal cresceu 6,2%, enquanto o ingresso em lista caiu
32% e a mortalidade em lista aumentou 27%, talvez em decorrência do maior risco
de exposição à COVID-19 e pela necessidade de realizar hemodiálise.
No início de 2021, o
Departamento de Transplante Renal da Sociedade Brasileira de Nefrologia e a
Associação Médica Brasileira (AMB) elaboraram recomendações, baseadas em
evidências atualmente disponíveis sobre a vacinação contra a COVID-19, em que
orientam os receptores adultos de transplante renal a receberem a vacina que
estiver disponível em sua região, sob supervisão do médico assistente.
O momento atual é
extremamente preocupante diante dos números crescentes de casos e óbitos,
somados às variantes virais já identificadas. Diante do apresentado,
recomendamos o distanciamento social, o uso de máscaras, lavar as mãos
frequentemente e vacinar-se assim que possível. Por outro lado, não podemos
deixar de incentivar a doação de órgãos com doadores falecidos por causas não
infecciosas, se for uma realidade no serviço de saúde em que o paciente está
cadastrado, diante do ritmo da pandemia. A qualidade de vida de um paciente que
necessita de diálise para viver é muito desgastante. Converse com sua família
sobre essa opção, seja um doador de órgãos.
Hospitais e
consultórios seguem rigorosos protocolos de prevenção ao coronavírus, conforme
orientações do Ministério da Saúde e Vigilância Sanitária; portanto, se tiver
alguma dúvida não tenha receio em conversar com o seu Urologista ou seu
Nefrologista (de modo presencial, telefone ou por videoconferência), ele vai
saber lhe orientar.
Dr. Marco Aurélio Lipay - Doutor em Cirurgia (Urologia) pela UNIFESP
(Universidade Federal de São Paulo), Titular em Urologia pela Sociedade
Brasileira de Urologia, Membro Correspondente da Associação Americana e Latino
Americano de Urologia e Autor do Livro "Genética Oncológica Aplicada à
Urologia".
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