Milhas aéreas,
bitcoins e previdência privada tornam-se cada vez mais valiosos e também podem
ser divididos no processo de divórcio
Além de imóveis, carros e investimentos mais
tradicionais, hoje em dia os casais em processo de divórcio passaram a ter
direito de dividir também outros tipos de bens que, afinal de contas, também
são acumulados durante a vida em comum. É o caso de milhas aéreas, bitcoins e
planos de previdência privada.
Cláudia
Stein, advogada especializada em Direito de Família e Sucessões e sócia
escritório Stein, Pinheiro e Campos, destaca que as partilhas
mudaram de configuração. "As pessoas podem acumular milhas aéreas durante
o casamento ou união estável e, muitas vezes, elas ficam armazenadas no cartão
de crédito de uma das partes. A princípio, as companhias aéreas não são
obrigadas a aceitar essa partilha, então deve-se pleitear ao juiz que ele mande
um ofício para a empresa declarando que aquelas milhas que existem em nome de
um titular deverão ser resgatadas na proporção de metade do titular e metade do
cônjuge", explica ela.
"Quando existe um acordo entre casal, deve-se
documentar que essas milhas serão divididas e que o titular se compromete a
resgatá-las e emitir as passagens para o outro", destaca. Na partilha dos
bitcoins, como as aplicações são feitas com corretoras e empresas
especializadas, o caminho é mais direto. "Conseguimos chegar até eles para
descobrir se, eventualmente, há algum tipo de tentativa de sonegação do bem e,
normalmente, essas empresas fazem a divisão na própria corretora", destaca
Cláudia Stein.
No
caso da previdência privada, no entanto, pode haver partilha ou não. Tudo vai
depender de acordo e diálogo entre o ex-casal. "Recentemente o Tribunal de
Justiça de São Paulo (TJ-SP) julgou um recurso,apresentado por mim, e decidiu
que a previdência fechada não é partilhável. Nesse tipo, sobretudo nas
multinacionais, a companhia chama o funcionário para integrar esse investimento
e o empregado faz uma contribuição de um determinado valor ao mês, enquanto a
empregadora realiza a outra parte. Existem requisitos para esse dinheiro ser
resgatado e só na aposentadoria do empregado isso pode ser feito sem descontos
ou multas. Se quiser antes desse prazo, perde-se o dinheiro que a empresa
investiu", explica ela. No julgamento recente do TJ-SP, a advogada destaca
que houve esse entendimento, mas ele não é totalmente pacificado porque existem
outros julgamentos que definiram que a previdência fechada pode ser do casal.
"Com a chance de haver perda de valores fazendo o resgate prematuro, seria
melhor calcular o valor próximo do que resgataria ao fim do período de
investimento e compensar em outro bem. Vai depender de cada caso e de um bom
acordo entre as partes", pondera.
A princípio, os direitos citados podem ser
usufruídos tanto em casamento formal quanto num contrato de união estável, mas,
neste último caso, existe a dependência da interpretação do juiz. "A
rigor, hoje quem vive em união estável está equalizado a quem está casado na
questão de sucessão ou morte do outro, mas a definição de união estável é
difícil estabelecer de uma maneira única. Existem várias formas: moram juntos,
estão juntos, são convidados para os mesmos eventos sociais, há testemunhas de
que vivem como marido e mulher etc. O que costuma definir é o espírito de
constituir família e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) até já citou a figura
do 'namoro qualificado', em que há convivência e vínculo, mas a decisão costuma
ser caso a caso, ficando sob análise do juiz", detalha a advogada. A
grande diferença nas modalidades de união é no momento do divórcio: para
casados, a prova é a certidão. Na união estável, além de pedir a dissolução, é
preciso solicitar o reconhecimento da união para que ela possa ser encerrada.
CLÁUDIA STEIN - advogada especializada em Direito de Família e das Sucessões, área em que atua há 38 anos, sócia do escritório Stein, Pinheiro e Campos Sociedade de Advogados, Mestre e Doutora em Direito Civil pela Universidade de São Paulo; Professora de Direito Civil no curso de Pós-Graduação da Escola Paulista de Direito-EPD, na Escola Brasileira de Direito - EBRADI e em diversos outros cursos; co-autora de diversas obras, entre elas “Transformações no Direito Privado nos 30 anos da Constituição – Estudos em homenagem a Luiz Edson Fachin” e “Coronavírus: impactos no Direito de Família e Sucessões”.
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