Desde o início da pandemia, mais de 522 mil empresas fecharam as portas definitivamente, segundo o IBGE. Além do forte impacto social - como as famílias que perderam essas fontes de renda, especialmente as que se encontram em maior situação de vulnerabilidade - o fim de um negócio representa, muitas vezes, a permanência de dívidas e pendências contratuais e tributárias.
Mesmo com a retomada das atividades, é fato que boa
parte das empresas continuará sentindo uma queda no faturamento, uma vez que
ainda há recomendação de isolamento social. Com menos dinheiro em caixa,
demissões podem se tornar inevitáveis, agravando ainda mais a crise econômica
em que o país se encontra.
Prevendo o aumento de processos de recuperação
judicial e falência de empresas, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou
novas regras para estimular a conciliação entre os envolvidos, como a
padronização de relatórios e mediação de conflitos feita por tribunais, nos
moldes dos procedimentos realizados no Cejusc (Centro Judiciário de Solução de
Conflitos).
As medidas são importantes, mas com certeza não
serão suficientes. Se o estímulo à conciliação fosse realmente eficaz, não
teríamos tantas ações judiciais no país. O acordo via conciliação não é
obrigatório, então, vai depender da disposição das partes em resolver a disputa
de forma amigável – o que, como sabemos, nem sempre acontece.
Falência - E, afinal, como se dá um
processo de falência? Na maioria das vezes, a falência é requerida quando a
empresa deixa de pagar, sem razão relevante, dívida protestada pelo credor e
que ultrapassa o valor de 40 salários mínimos, ou é decretada pelo juiz quando
não cumpre o plano de recuperação judicial. Em ambos os casos, não é preciso
provar a insolvência da empresa, ou seja, o estado de insolvência é presumido.
Nesse sentido, o devedor que tem a falência requerida pelo credor pode afastar
o risco de ter a quebra decretada se efetuar o pagamento da dívida (depósito
elisivo).
No entanto, a Lei de Falências prevê a
possibilidade de se requerer a decretação da falência quando o devedor adota
determinadas ações, como, por exemplo, a liquidação do seu ativo, simula
negócios jurídicos visando retardar ou fraudar os credores, assume obrigações e
concede garantias que os deixe sem bens suficientes para fazer frente às
dívidas, etc. Nessa situação, cabe ao credor, ao requerer a falência, provar
que o devedor adotou qualquer das ações previstas na Lei e que podem levar à
falência da empresa.
Antes de se chegar ao estado de insolvência que
leva à falência, a empresa tem a possibilidade de buscar a equalização das suas
dívidas, com exceção das fiscais, por meio de recuperação judicial ou extrajudicial.
É nessa etapa que agiriam as novas regras estabelecidas pelo CNJ.
Logo após a decretação da falência, a empresa para
de funcionar. Todas as dívidas vencem antecipadamente, os administradores
deixam de representar a sociedade, que passa a ser gerida pelo Administrador
Judicial nomeado pelo juiz da falência e a empresa não pode dispor dos seus
bens, ou seja, não poderá dá-los em garantia, transferi-los ou vendê-los. O
Administrador Judicial nomeado pelo juiz da falência levantará os ativos e o
passivo da empresa; os créditos serão classificados na forma da lei
(trabalhistas, com garantia real, tributário, com privilégio especial, com
privilégio geral, quirografário, multas contratuais, administrativas e/ou
tributárias e os créditos subordinados); ao final, havendo ativo, os bens serão
alienados e o saldo arrecadado pela massa falida será rateado entre os credores
obedecida a ordem legal.
Vale lembrar que a falência só se aplica às
sociedades empresárias, ou seja, aquelas definidas pelo Código Civil como sendo
as empresas que exercem atividade econômica organizada para a produção ou
circulação de bens ou de serviços. Ou seja, a falência não se aplica às
empresas que exercem atividades de natureza científica, literária ou artística.
Portanto, sociedade de médicos, advogados, arquitetos, por exemplo, não podem
ter sua falência decretada. Além disso, a própria Lei de Falências exclui da
sua aplicação as empresas públicas (Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos, por exemplo), sociedades de economia mista (Petrobras, por exemplo)
e a instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito,
consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano
de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e
outras entidades legalmente equiparadas às anteriores.
Sabendo que o inevitável se aproxima, caberá aos
órgãos de Justiça agir pela mediação de conflitos e ao Governo Federal
possibilitar que as empresas encontrem soluções para que possam sobreviver,
como ampliar linhas e programas de crédito. O momento pede socorro e muita
gestão do negócio, levando em consideração as áreas jurídica, fiscal,
financeira e tributária. Organizar a casa desde já pode garantir um 2021 menos
turbulento – inclusive para o Judiciário.
Mário
Conforti - advogado e líder da área cível do escritório
Marcos Martins Advogados.
https://www.marcosmartins.adv.br/pt/
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