Com amplos
diferenciais competitivos e abundância de recursos renováveis, país precisa
explorar a oportunidade de influenciar a agenda ambiental internacional e
requalificar seu desenvolvimento econômico
Historicamente, o Brasil é protagonista nas
discussões e ações globais referente à pauta ambiental. Ciente de sua
relevância e da abundância de recursos naturais em nosso território, o
protagonismo brasileiro foi construído a partir de uma forte atuação
diplomática, da liderança técnica em debates complexos e do avanço gradual das
políticas ambientais no país. Basta lembramos a Conferência da ONU para o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, a Rio-92,
quando 179 países firmaram compromissos para lidar com temas fundamentais como
a biodiversidade, a mudança do clima e a desertificação.
A Convenção sobre Diversidade Biológica (do inglês
CBD) foi assinada em 1992 por 168 países e ratificada pelo Congresso Brasileiro
em Fevereiro de 1994. A Convenção busca preservar um patrimônio nacional
fundamental: a biodiversidade do território brasileiro. O Brasil é o país com a
maior diversidade no mundo, com mais de 103.870 espécies animais e 43.020
espécies vegetais conhecidas, o que representa 20% do total de espécies do
planeta, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente.
Em 1994, o Brasil ratifica a Convenção Quadro das
Nações Unidas sobre Mudança do Clima (do inglês UNFCCC), que visa estabilizar a
concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera em um nível seguro
para o sistema climático. O Brasil foi agente central na construção da agenda
climática que culminou, em 1997, no Protocolo de Quito. Em junho de 1997, o
Congresso Brasileiro ratificou a Convenção das Nações Unidas de Combate à
Desertificação (do inglês UNCCD), que tem objetivo de lidar com o desafio da degradação
e da desertificação em regiões árias e semiáridas. No Brasil, as regiões de
risco correspondem a 15,72% do território nacional e incluem uma população de
mais de 31 milhões de habitantes, concentradas não apenas na região nordeste,
mas também em Minas Gerais e no Espírito Santo.
Agenda 21 e a relação meio ambiente e
desenvolvimento
Outro resultado importante da Rio-92 foi o
estabelecimento da Agenda 21, um marco na relação entre meio ambiente e
desenvolvimento e que estabeleceu um plano global de ação estratégica, com
objetivo de promover um novo padrão de desenvolvimento, conciliando métodos de
proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica. É neste momento que
novos agentes são formalmente integrados à agenda da diplomacia ambiental. A
Agenda 21 foi um plano de ação que reconheceu que as ações não podem ser
unicamente de governos nacionais, mas também demanda envolvimento e integração
dos governos locais, das organizações não governamentais, de grupos
subrepresentados, da sociedade civil e do setor privado.
A RIO-92 impulsionou o crescimento mundial de
cooperações multilaterais e foi sem dúvida o movimento que colocou a sociedade
na direção de algo em comum. O avanço desta agenda culminou na definição dos
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) em 2000, e nos Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável (ODS) em 2015, também conhecida como Agenda 2030.
A atual agenda internacional para a promoção do
desenvolvimento sustentável tem um elemento marcante: o setor privado como
pilar fundamental da transformação econômica, social e ambiental. Ao alinhar
suas estratégias aos objetivos do desenvolvimento sustentável, as empresas
assumem lugar de relevância, se posicionam em relação aos desafios globais de
desenvolvimento e constroem vantagem competitiva. Quer uma prova? Em seu
relatório “Better Business, Better World”, de 2017, a Bussiness and
Sustainable Development Commision aponta que modelos de negócios sustentáveis
podem gerar oportunidades no valor de US$ 12 trilhões e criar 380 milhões de
novos postos de trabalho até 2030. Para a Comissão, fica claro que ao
incorporar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável em suas estratégias, as
companhias podem desencadear uma mudança radical no processo de produção e
criar um boom de investimentos em infraestrutura e tecnologias sustentáveis.
Agenda 2030 também ganha força no setor financeiro
O interesse do setor privado na Agenda 2030 também
é reflexo de um novo agente: o setor financeiro. Em 2018, mais de 90% dos
investidores globais levaram em consideração fatores ambientais, sociais e de
governança (ESG, sigla em inglês) no processo de investimento, segundo estudo
da consultoria EY. Em 2017, o número de profissionais que usavam informações
ESG era de 68%. O aumento registrado em 2018 reflete que, cada vez mais, os
investidores têm a perspectiva e a compreensão sobre os riscos e oportunidades
para os negócios e ativos nos quais estão investindo, principalmente em
períodos de desaceleração da economia.
Pode-se notar que este é um movimento sem volta, no
qual a sustentabilidade deixa de ser um conceito e passa a permear os
negócios gerando maior segurança, aumento de receitas e maior geração de valor.
Clima como direcionador de ações
Entre os ODS a Ação Climática é, sem dúvida,
prioritária. A urgência de lidarmos com o desafio da mudança do clima reflete o
pouco tempo para ação, o fato dos compromissos nacionais (NDCs) estarem
desalinhados dos compromissos do Acordo de Paris e do clima afetar, e ser
afetado, de maneira transversal por outros objetivos.
Podemos notar que cerca de 70% das emissões globais
de gases de efeito estufa (GEE) são geradas por aproximadamente 100 empresas.
Este fato nos permite entender a força da iniciativa privada para a pauta
ambiental e como mobilizar essas companhias é crucial para toda a Agenda 2030,
e não apenas para a agenda climática. O engajamento e ação do setor privado
pode ser observado fora e dentro do Brasil.
O relatório “Como as empresas vêm contribuindo com o Acordo de
Paris”, divulgado recentemente pelo CEBDS (Conselho Empresarial
Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), mostra que entre 2016 e 2017,
33% das companhias membros do CEBDS diminuíram suas emissões de GEE. Além
disso, o valor investido em projetos ligados a redução das emissões saltou US$
26,5 bilhões em 2015 para US$ 36,2 bilhões, em 2017. Juntos, esses projetos
contribuíram para uma redução de 217,9 milhões de toneladas de CO2
na atmosfera. A ação privada está, claramente, ancorada em oportunidades de
negócio. Contudo, também é crescente o número de regulações internacionais para
nortear a atuação de governos, mercados e empresas na redução de emissões.
Instrumentos de precificação de carbono nacionais e subnacionais estão sendo
amplamente adotados e regulações específicas para o controle de emissão nos
setores de transporte naval e a aviação internacional serão adotadas. O risco
de não estar em conformidade com essas regulações internacionais é altíssimo,
especialmente para países exportadores como o Brasil.
Brasil precisa retomar protagonismo
No Brasil, felizmente estamos observando uma
mobilização positiva e proativa do setor privado. Como dito anteriormente,
grandes empresas estão encabeçando compromissos e solicitando do governo
federal clareza e segurança regulatória para a mitigação de gases de efeito
estufa. Em ecossistemas cada vez mais interdependentes e interligados, os
riscos e oportunidades da sustentabilidade se distribuem pelas cadeias de valor
e as companhias sabem que isso se reflete em competitividade. Um bom exemplo no
Brasil é o setor agropecuário de alta tecnologia, que conhece seu potencial de
contribuição e tem se posicionando firmemente sobre a importância da adoção de
políticas ambientais.
O afastamento do país de sua posição de liderança e
protagonismo abre brechas que vêm sendo ocupadas por competidores
internacionais. A China vem se tornando líder em geração de energia renovável e
está desbravando a locomoção elétrica em escala. A Índia, com uma economia de
serviços vibrante, também se esforça em reduzir a dependência do carvão. Nos
EUA, o afastamento do governo federal culminou na iniciativa We are
still in (Ainda estamos dentro), na qual lideranças políticas, da
sociedade civil e privada, se mobilizaram para ampliar ações e ambições de
maneira unilateral e voluntária.
Por aqui temos uma oportunidade sobre a mesa.
A iniciativa privada pode tomar a dianteira para requalificar o desenvolvimento
econômico do país tendo como norte a sustentabilidade e a economia de baixo
carbono. A competitividade de nossa economia estará ancorada em elementos não
convencionais e as empresas já entenderam isto.
Henrique
Pereira, CEO da WayCarbon
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