Há
alguns dias, presenciei emergir em sala de aula mais uma daquelas discussões
saudáveis sobre o que são verdadeiras atitudes sustentáveis. A habilidade de se
expressar, a pluralidade dos pontos de vista e a capacidade de avaliar de forma
crítica com base em argumentos sólidos são características que aprecio muito e
que, portanto, procuro incentivar em minhas aulas.
Assim,
enquanto vejo os alunos engajados e instigados a opinar, questionar e criticar,
sorrateiramente deixo as vozes correrem soltas e apenas observo. Mal sabem eles
que, para mim, esse é um momento de grande aprendizado e satisfação.
Na
vanguarda pela educação para a sustentabilidade já participei de muitas dessas
discussões. Ainda em 2004, estive com o ex-secretário geral da ONU, Kofi Annan,
em um importante evento da iniciativa Pacto Global que busca inspirar empresas
a adotarem princípios mais responsáveis; em 2006, reuni-me com outros reitores
de universidades do mundo todo para traçar os Princípios da Educação Executiva
Responsável (PRME); conheci Ban Ki Moon, também ex-secretário-geral da ONU em
2015, no lançamento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável; e no ano
passado, estive com outros diretores de escolas em um evento comemorativo dos
dez anos do PRME, onde pensamos os novos passos da iniciativa rumo ao horizonte
2030.
Portanto,
para mim, ver os alunos discutindo sustentabilidade é um retrato de como toda
essa concepção está sendo entendida pela sociedade. Ao escutá-los avaliarem as
iniciativas das empresas, questionando o que é de fato legítimo ou não; vê-los
defenderem mudanças estruturais nos modelos de gestão seja na esfera pública ou
corporativa; e principalmente, presenciar discussões sobre os modelos de ensino
e a importância da disseminação da educação e da cultura para a
sustentabilidade representa uma conquista.
Mostra
o quanto evoluímos das resoluções do Relatório de Brundtland para um mundo em
que o pensamento sustentável e, consequentemente, os Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável fazem parte não somente da agenda dos Governos, das
empresas, das escolas e da sociedade civil, mas principalmente, são parte do
cotidiano das pessoas.
A
grande questão é que o termo sustentabilidade começou sua trajetória cercado
por enigmas que somente grupos específicos sabiam lidar. Atrelado ao cunho
prioritariamente ambiental foi por vezes mal interpretado, mal compreendido e
até mesmo maquiado (o famoso greenwashing). O desenho do tripé que atribuiu o
mesmo peso aos eixos social, econômico e ambiental veio facilitar o
entendimento comum da abrangência da sustentabilidade e a importância desse
equilíbrio. Porém, essa ainda é uma visão limitada.
Principalmente
se considerarmos as colocações de ecossocioeconomista, Ignacy Sachs, que de
forma extraordinária, nos mostrou que há muitas outras dimensões a considerar.
Para Sachs, há ainda questões culturais, ecológicas, territoriais, políticas e
planetárias que representam implicações nesse caminho para o equilíbrio.
Por
isso, mesmo já ultrapassado 30 anos do que ficou conhecida como a primeira
definição do conceito de desenvolvimento sustentável, isso está longe de ser
unanimidade. O que particularmente, acho ótimo!
Tanto
o conceito quando o que representam as práticas do ideal sustentável ainda
precisam ser construídos. Assim como observado pelo pesquisador Steven Johnson,
as boas ideias surgem da colisão entre palpites que se unem para formar algo
maior, porém precisam de tempo para amadurecer (vídeo “Como surgem as boas
ideias”). Por isso, acredito na riqueza dessas discussões sejam elas nas salas
de aula, nos corredores das empresas ou nas mesas de café. O importante é a
combinação das ideias em uma construção contínua e coletiva, pois é no dissenso
que encontraremos o consenso para um mundo mais justo e responsável.
Um
dos meus exercícios favoritos nas aulas de mestrado é convidar os alunos a
reconstruírem o conceito de desenvolvimento sustentável. Há sete anos levamos
mais de duas horas para chegar a um consenso. Na última turma de 2017, em
trinta minutos tínhamos uma resposta. E quer saber qual a palavra mais
recorrente em todas as novas definições encontradas? Transformação.
Afinal,
o que é encontrar o consenso a partir do dissenso senão experienciar um
processo de transformação. É exatamente isso que encontro ao observar as
calorosas discussões em sala de aula: alunos que evoluem da posição de
observadores para – empoderados de conhecimento – se transformarem em
protagonistas desse desenvolvimento sustentável.
Norman de Paula Arruda Filho - Presidente
do ISAE – Escola de Negócios, conveniado à Fundação Getulio Vargas, professor
do Mestrado em Governança e Sustentabilidade do
ISAE/FGV, e Coordenador do Comitê de Sustentabilidade Empresarial
da Associação Comercial do Paraná (ACP).
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