Mar de alegrias e grandes desafios
A costa brasileira é formada por quase nove
quilômetros de beleza. São praias, dunas, falésias, restingas, manguezais e
baías que reúnem uma das mais ricas biodiversidades do mundo. Um país
verdadeiramente bonito por natureza, como diz Jorge Ben. Essa riqueza natural
se mistura com a cultura praiana presente nas canoas de pesca, no artesanato,
na culinária. O mesmo cenário em que depositamos nossas esperanças ao
entardecer, tornando impossível contar a nossa história sem que os olhos sejam
voltados para o oceano Atlântico.
Dizer que a gente fica melhor quando está em frente
ao mar, parafraseando Nando Reis, não é apenas uma licença poética da canção!
Um número crescente de pesquisas mostra o que o conhecimento popular já sabia:
que estar próximo do mar faz bem à saúde, previne doenças e promove o
bem-estar. Isso pode explicar o que leva mais de dois terços da população
mundial viver no litoral ou áreas próximas à costa.
Nossos mares e oceanos são tão importantes que
influenciam a vida de todo nós – de Norte a Sul, de Leste a Oeste –, e não só
dos brasileiros que vivem na zona costeira. Os oceanos são a base da
sobrevivência de toda humanidade, pois garantem a produção de oxigênio,
recursos pesqueiros, regulam o clima até das regiões interioranas. Além de
representarem local de esporte, lazer e turismo, abrigam os portos que conectam
regiões e continentes, nos quais transita a maior parte do comércio e da
economia. Dados recentes indicam que 19% do PIB do Brasil advêm dos nossos
mares e oceanos, ficando atrás apenas da agricultura (21%).
São tantos os benefícios e serviços ecossistêmicos,
que até a ONU declarou o período de 2021 a 2013 como a Década dos Oceanos!
Nesse mar de alegrias e riquezas, algumas tristezas
chamam nossa atenção. Apesar da imensa importância econômica, ecológica, social
e cultural, os mares não têm recebido os cuidados e investimentos que deveriam
e estão ficando doentes. Novamente, não é apenas uma licença poética. Os peixes
e outros recursos pesqueiros estão entrando em colapso. Algumas de nossas
praias, antes paradisíacas, estão se tornando um cenário de sujeira e descarga
de esgoto. As mudanças climáticas são reais, basta sentir as ondas de calor ou
frio extremos, as chuvas intensas e inundações, o aumento do nível do mar e as
ressacas cada vez mais frequentes que afetam quase 60% das cidades costeiras no
Brasil.
Esse é o cenário do Antropoceno: a nova era
geológica em que entramos, na qual atividades humanas começaram a ter um
impacto global significativo no clima do planeta e no funcionamento dos seus
ecossistemas. Temos um ambiente tão rico e tão lindo, mas temos uma capacidade
inigualável de alterar o meio em que vivemos, a ponto de colocar em risco a
nossa própria existência e das gerações futuras.
Neste balanço de alegrias, riquezas, tristezas e
preocupações, nosso poder transformador pode também ser a solução. Somos
criativos e devemos usar nossa criatividade, nossa alegria e nossa força para
mudar o cenário atual, com soluções inovadoras, novas tecnologias e,
principalmente, mudanças de comportamento.
Das pequenas ações – como consumir só o que
precisamos, descartar o lixo corretamente, respeitar o ambiente e desmatar
menos – às grandes mudanças – como a cobrança dos poderes Executivo e
Legislativo para garantir a segurança do nosso meio ambiente. Assim, não importa
se hoje estamos passando a tarde em Itapoã, numa barca para a Ilha do Mel ou
surfando as ondas do céu de Brasília, todos nós somos responsáveis pelos mares.
Deles dependemos para viver e para eles podemos deixar o nosso melhor.
Janaína Bumbeer - analista de Projetos Ambientais
da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
Ronaldo Christofoletti - professor da UNIFESP e faz
parte do grupo de 30 cientistas voluntários brasileiros convocados pela ONU
para traçar pareceres sobre o que já foi feito para os oceanos.
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