Em recente julgamento
meramente virtual, o Excelso Supremo Tribunal Federal declarou haver
"repercussão geral" no tema alusivo às contribuições assistenciais,
aprovadas em favor dos Sindicatos por suas assembleias extraordinárias.
O Supremo Tribunal Federal -
STF havia declarado, não há muito tempo, que a matéria não era credora de
um pronunciamento. É infraconstitucional e não apresenta repercussão geral.
Nesse julgamento, relatado pelo ministro César Peluso, teve-se a seguinte
Ementa: “EMENTA. RECURSO. Extraordinário.
Incognoscibilidade. Contribuição
assistencial. Cobrança de trabalhadores não filiados a Sindicato. Questão
infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso
Extraordinário Anão conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso
extraordinário que, tendo por objeto questão relativa à exigibilidade da
contribuição assistencial, instituída por assembleia, de trabalhadores não
filiados, versa sobre matéria infraconstitucional." (AI 752633 RG/SP,
São Paulo. 17/9/2009. Tribunal Pleno Virtual. Rel. min. Cezar Peluso, com grifo
nosso). E o ministro Gilmar Mendes foi vencido.
Visto que não é de sua
personalidade, como a do ministro Marco Aurélio, conviver com sabedoria com o
fato de sair vencido de uma decisão colegiada, Gilmar Mendes voltou à
carga, solertemente, em outro processo. Dado que, preliminarmente, seria
necessário reconstruir a tese da repercussão geral, fê-lo por meio
"virtual", é dizer, por mensagens de computadores trocadas entre os
ministros. E nada foi debatido. Ficou-se, apenas, no "há" ou
"não há", simplismo incompatível com a conduta de qualquer Suprema
Corte do mundo. E nula a decisão, porque o art. 93, IX, da Constituição
Federal, determina que todas as decisões judiciais devam ser fundamentadas e
públicas.
É certo que a primeira
decisão, agora contrariada, também se deu por meio "virtual".
Dê-se de barato que ambas sejam ofensivas ao Estado Democrático de Direito, porém a segunda
é de maior gravidade, posto que "revisitou" matéria julgada, em
sentido contrário.
A seguir, "reconhecida a
repercussão geral" (sic), o ministro passou ao mérito e declarou a
inconstitucionalidade da taxa assistencial, aprovada pelas categorias de
trabalhadores em assembleias, para fortalecer seus sindicatos, que,
concomitantemente, em favor eles resgatam importantes institutos de
tutela do trabalho, como reajuste e aumento real, vale-refeição,
vale-transporte, estabilidade às gestantes, auxílio-creche e perto de mais
cinquenta cláusulas que tornam possível a vida dos trabalhadores e de suas
famílias no Brasil.
Para melhor compreensão dos
não iniciados em direito e, especialmente, no intrincado sistema de acesso ao
STF, que desafia até mesmo os cientistas da normatividade, devemos esclarecer
que, antes de apreciar um recurso de um caso determinado, o Supremo deve dizer
se aquele recurso traz embutida uma "repercussão geral", e dizer, se
trata de matéria idêntica à de vários outros processos. Estes ficam suspensos
até o pronunciamento da Corte. Depois, são considerados julgados, pouco
importando os entendimentos dos demais Tribunais ou dos juízes. Em síntese, o
Supremo dá sua última palavra - e única - sobre determinado assunto, para
aplicação a centenas ou milhares de outros processos submetidos à jurisdição do
País.
Ora, se o sistema, em si, já
é discutível, empobrecê-lo, como o fez o ministro Gilmar Mendes, por meio de
uma conduta oblíqua, em que a revogação de uma tese anterior se deu no silêncio
dos gabinetes, por meio virtual, sem o confronto físico da inteligência dos
ministros, sem sustentações orais, sem publicidade e transparência, sem uma
descida vertical aos meandros do teorema jurídico, foi um pecado capital que
torna prejudicado o prosseguimento do debate e o provimento de fundo, voltado a
fazer o Brasil retroceder a um capitalismo selvagem.
Ressalte-se o voto vencido do
ministro Marco Aurélio e a abstenção dos ministros Cármen Lúcia e Ricardo
Lewandovsky, que, por certo, perceberam estarem sendo induzidos a grave erro
jurisdicional.
Muito mais importante que o
assunto, em si, é o apequenamento de nossa Suprema Corte, última instância a
tutelar os direitos dos cidadãos, especialmente quando exerce uma
“avocatória", com outro nome, tão combatida pelos democratas quando o
governo militar pretendeu criá-la e, além disso, deturpa seu procedimento.
Sem um STF confiável, podemos dizer, com segurança, que já chafurdamos num
crise institucional, a que mais corrói uma nação.
Amadeu
Roberto Garrido de Paula - Advogado
e sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados, com uma ampla visão
sobre política, economia, cenário sindical e assuntos internacionais.
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