Estudo realizado por cientistas
brasileiros e colaboradores estrangeiros aponta que terremotos, furacões,
tsunamis e erupções vulcânicas aumentam o risco de extinção de mamíferos, aves,
répteis e anfíbios. Eventos podem ter sinergia com ameaças causadas por humanos
Em artigo publicado hoje (17/06) na
revista PNAS, um grupo de pesquisadores apoiado pela FAPESP estima
que mais de 3 mil espécies de vertebrados terrestres estejam em risco de
extinção por conta de eventos como terremotos, furacões, tsunamis e erupções
vulcânicas.
O levantamento foi feito a
partir da sobreposição da área do planeta em que ocorreram esses eventos com os
locais de ocorrência de mamíferos, répteis, anfíbios e aves que têm menos de
mil indivíduos na natureza ou que ocupam uma área menor do que 2,5 mil
quilômetros quadrados, o que traz dificuldades para se reproduzirem e recuperarem
a viabilidade da população diante de fenômenos naturais críticos.
“Hoje existem no mundo 8.813
espécies com uma população muito pequena ou vivendo numa área restrita. Nossas
estimativas apontaram que 42% [3.722] delas estão em regiões em que ocorreram
um ou mais desses eventos nos últimos 50 anos, o que é bastante ameaçador para
o futuro desses animais”, explica Fernando Gonçalves, primeiro autor do trabalho, realizado em parte durante pós-doutorado no
Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (IB-Unesp), em Rio
Claro, com bolsa da FAPESP.
O estudo é conduzido no âmbito
do Centro de Pesquisa em Biodiversidade e Mudanças do Clima (CBioClima), um Centro de Pesquisa,
Inovação e Difusão (CEPID) apoiado pela FAPESP.
Entre as espécies ameaçadas
pelos fenômenos naturais, 70% vivem em ilhas. Levando em conta as regiões do
planeta, 34% estão nos Neotrópicos, área que se estende do sul do México até o
norte da Argentina.
No mar do Caribe e no golfo do
México, estão suscetíveis principalmente a furacões, enquanto vulcões,
terremotos e tsunamis são as principais ameaças no chamado Anel de Fogo do
Pacífico, região com maior atividade tectônica do mundo que inclui a
Cordilheira dos Antes e a costa oeste dos Estados Unidos e do Canadá.
“Muitas dessas espécies vivem
em locais de alto risco de eventos desastrosos porque foram empurradas para lá
depois de terem perdido seus hábitats em florestas que foram desmatadas, por
exemplo”, conta Mauro Galetti,
professor do IB-Unesp e um dos coordenadores do estudo.
Um exemplo é a
rã-foguete-de-quito (Colostethus jacobuspetersi), antes amplamente
distribuída pelas regiões norte e central dos Andes, mas agora restrita a áreas
em torno do vulcão Cotopaxi, no Equador, que entrou em erupção mais de 50 vezes
desde 1738.
Proteção
Os pesquisadores definiram um
alto risco para 2.001 espécies, por terem 25% ou mais de sua distribuição em
áreas em que ocorreram um ou mais dos quatro fenômenos naturais descritos no
trabalho. Para 16% dessas espécies, as áreas onde vivem têm dois ou mais desses
eventos com alta incidência.
Outro fator alarmante é que 30%
dessas espécies sob alto risco vivem em locais completamente fora de áreas
protegidas, enquanto apenas 15% possuem um plano específico de conservação.
O Brasil tem apenas duas
espécies listadas no estudo. A lagartixa-da-areia (Liolaemus lutzae),
criticamente ameaçada de extinção, vive na restinga da costa fluminense e
entrou para os registros por conta de uma ressaca em 2004 no Rio de Janeiro,
considerada um tsunami de magnitude 1.
O sapo-de-barriga-vermelha (Melanophryniscus
cambaraensis), por sua vez, vive entre os Estados de Santa Catarina e do
Rio Grande do Sul. Pode estar sujeito a furacões, como o que ocorreu na região
20 anos atrás, de baixa magnitude.
Dos quatro fenômenos naturais levados em conta no estudo, apenas os furacões possuem relação direta com o aquecimento do planeta. As previsões do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) dão conta de um aumento de eventos extremos como esse.
“Espécies que sobreviveram a
eventos naturais do passado podem estar mais propensas a resistir a situações
similares. No entanto, adaptações que as ajudaram antes, como dieta
generalista, alta capacidade de dispersão e grande número de filhotes, podem
não ser suficientes para sobreviver à sinergia entre os eventos naturais e os
impactos causados pela humanidade”, aponta Gonçalves, atualmente pós-doutorando
na Universidade de Copenhague, na Dinamarca.
Entre as alternativas para
mitigar os efeitos sobre as espécies mais ameaçadas, os pesquisadores listam a
criação de corredores ecológicos para interligar populações isoladas,
reprodução assistida em cativeiro, translocação de populações para áreas
seguras em que viviam antes e a conservação tanto em áreas protegidas
quanto ex situ.
Nesses casos, um número de indivíduos passa a viver e se reproduzir em cativeiro para garantir uma reserva genética da espécie, podendo ser reintroduzidos no ambiente em caso de extinção.
O trabalho teve apoio da FAPESP
ainda por meio de outros auxílios e bolsas (11/50225-3, 14/18800-6, 15/15172-7, 17/23548-2, 19/00648-7, 21/03868-8, 22/09561-4 e 23/03965-9).
O artigo A global map
of species at risk of extinction due to natural hazards pode ser
acessado em: www.pnas.org/cgi/doi/10.1073/pnas.2321068121.
André Julião
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/fenomenos-naturais-ameacam-10-das-especies-de-vertebrados-terrestres-do-mundo/51970