Especialistas renomados estiveram reunidos durante o 71º Congresso Brasileiro de Coloproctologia para discutir as várias afecções intestinais. Chamou atenção o espaço ocupado na grade de uma doença benigna que afeta cerca de 7 milhões de brasileiras: a endometriose.
A Endometriose é uma doença benigna caracterizada
pela presença do tecido que reveste o útero (endométrio) fora do mesmo que
afeta até 10% das mulheres em idade reprodutiva e se manifesta principalmente
por dor pélvica e infertilidade. São sintomas comuns: cólicas menstruais, dor
durante as relações sexuais, dor ao urinar ou defecar relacionada ao ciclo
menstrual, cansaço, inchaço abdominal, alterações intestinais durante o período
menstrual, sangramento menstrual aumentado ou irregular.
A presença da doença na grade do maior evento de
coloproctologia se justifica pelo caráter sistêmico da endometriose que requer
o concurso de várias especialidades médicas para sua abordagem adequada segundo
consensos internacionais. A endometriose intestinal pode ocorrer em 5 a 27% das
mulheres com endometriose, sendo que o reto e retossigmoide (porções finais do
intestino) respondem por 70-93% das lesões intestinais. Estas lesões podem ser
silenciosas (assintomáticas), apresentarem sintomas semelhantes ao intestino
irritável (alternância de diarreia e prisão de ventre, dores e inchaço
abdominal) ou em casos raros, mas graves levarem até a obstrução intestinal.
Outros sintomas incluem dor: durante as relações sexuais, dor pélvica crônica,
e cólicas menstruais. A intensidade da dor nem sempre está relacionada à
extensão da endometriose intestinal.
Nas duas últimas décadas, a prevalência da
endometriose aparentemente aumentou, o que na verdade, parece refletir maior
reconhecimento da doença por médicos e pacientes assim como a melhora nos
métodos diagnósticos. O ginecologista tem papel central no diagnóstico e
condução da paciente com endometriose profunda, mas para casos de envolvimento intestinal
a participação do coloproctologista é fundamental. A avalição clínica
criteriosa associada a exames complementares adequados evitam a postergação
deste diagnóstico, fato crítico para orientar as intervenções e otimizar os
resultados de fertilidade e alívio da dor. Apesar de numerosos estudos
publicados, a melhor abordagem para mulheres com endometriose intestinal ainda
não foi estabelecida. Os dados sobre as chances de gravidez espontânea em
mulheres com endometriose intestinal e os fatores de risco de infertilidade
neste contexto permanecem assim mal identificados.
O tratamento da endometriose intestinal requer
avaliação por uma equipe multidisciplinar que deverá levar em consideração o
número e a localização das lesões de endometriose, a idade da mulher assim como
a presença de sintomas e o desejo de gravidez ou presença de infertilidade. O
tratamento pode incluir uso de medicamentos para suspender a menstruação,
analgésicos, dieta, atividade física e cirurgia. Em casos de infertilidade, o
uso de técnicas de reprodução assistida pode ser uma opção. Tem por objetivo
principal resolver o problema da paciente, isto é, buscar o alívio da dor
pélvica e a resolução da infertilidade assim como melhorar sua qualidade de
vida.
Ao longo da vida, a endometriose pode comprometer o
enfrentamento aos desafios pessoais e profissionais dessas mulheres, resultando
em limitações para alcançar objetivos de vida, como concluir os estudos;
avançar na vida profissional; interferir no desenvolvimento de relacionamentos
estáveis e gratificantes ou afetar as chances de gravidez e formação de uma
família, o que em suma acaba alterando profundamente a trajetória de vida de
uma pessoa. Dessa forma, o potencial da endometriose para impactar o curso de
vida das mulheres é considerável, visto que o início dos sintomas geralmente
ocorre em uma fase de decisões cruciais para elas.
Independente da modalidade terapêutica escolhida, o
objetivo principal é o alívio da dor, a obtenção de gravidez e a prevenção de
recorrências. A doença vem sendo estudada há anos e não há uma receita única
que resolva todas as alterações provocadas pela endometriose. Um ponto,
entretanto, parece pacífico: o foco do tratamento é a mulher que deve ser
adequadamente informada sobre sua situação e convidada a participar ativamente
do seu tratamento. Os melhores resultados neste contexto são obtidos quando o
tratamento é feito por uma equipe multidisciplinar que congrega várias
especialidades médicas e demais profissionais de saúde trabalhando em prol da
qualidade de vida dessas mulheres.
Márcia Mendonça Carneiro - Diretora científica Clínica ORIGEN. Professora
Titular – Departamento de Ginecologia Faculdade de Medicina - UFMG
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