Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em parceria com a University College London (Inglaterra), mostrou, pela primeira vez, que o acúmulo de gordura abdominal é um fator de risco para insuficiência e deficiência de vitamina D em pessoas com mais de 50 anos. Considerada um hormônio, a vitamina D desempenha diversas funções no organismo e sua carência pode acarretar diversos problemas, como na absorção de cálcio e fósforo e no funcionamento do sistema imune, por exemplo.
“Tanto a obesidade
abdominal quanto a insuficiência e deficiência de vitamina D são questões
prevalentes na população idosa. No entanto, com esse estudo mostramos que é a
gordura abdominal que aumenta o risco de insuficiência e deficiência de vitamina
D e não apenas a relação inversa, como alguns estudos já haviam demonstrado.
Não estamos descartando que a vitamina D levaria à obesidade, apenas
demonstrando que o acúmulo de gordura abdominal também é uma via para a
carência dessa vitamina”, afirmou Tiago
da Silva Alexandre, professor de Gerontologia da UFSCar e autor do
estudo publicado na revista Nutrients.
O trabalho envolveu
a análise de um banco de dados de 2.459 britânicos com mais de 50 anos
acompanhados por quatro anos. Os participantes da pesquisa integram o
projeto English Longitudinal Study of Aging (ELSA), estudo
longitudinal conduzido na Inglaterra que coleta dados multidisciplinares de uma
amostra representativa da população inglesa. A análise contou com o apoio
da FAPESP.
Para verificar a correlação entre os
dois fatores, os pesquisadores selecionaram participantes do projeto ELSA com
mais de 50 anos e que apresentavam taxas normais de vitamina D (maiores que 50
nmol/L). Os participantes foram divididos em dois grupos: um formado com
pessoas com pouca gordura abdominal e outro, com acúmulo de gordura no abdômen
(circunferência de cintura maior que 102 cm para homens e maior que 88 cm para
mulheres).
“Ao avaliar o índice de vitamina D
desses indivíduos quatro anos depois da primeira coleta de dados, verificamos
que aqueles que apresentavam obesidade abdominal tinham 36% mais risco de
desenvolver insuficiência e 64% mais risco de deficiência de vitamina D, quando
comparado com o grupo que não tinha obesidade abdominal”, diz Alexandre.
No estudo, pessoas consideradas com
insuficiência de vitamina D apresentavam taxas entre 30 e 50 nmol/L da
substância na corrente sanguínea, enquanto a deficiência estava configurada
para aqueles que tinham menos de 30 nmol/L de vitamina D.
Redução de
receptores
Alexandre explica que estudos
anteriores já haviam relacionado a falta de vitamina D com o desenvolvimento da
obesidade. “No entanto, são estudos baseados em medidas de Índice de Medida
Corporal (IMC), que usam dados de peso e altura, dão uma análise
global da obesidade e são muito imprecisos. Porém, a pergunta que fica é
como tantos países com alta ou baixa incidência solar têm prevalência muito
grande de deficiência de vitamina D. A resposta é porque existe alta
prevalência de obesidade”, diz o pesquisador.
A obtenção de vitamina D se dá,
sobretudo, por meio da luz solar. Isso porque é nas camadas mais profundas
da pele que uma substância precursora da vitamina D fica armazenada. Quando a
pele é exposta ao sol sua estrutura é modificada e, por meio de vários
processos metabólicos, a vitamina D é convertida em sua forma ativa que passa a
circular pelo organismo e realizar várias funções.
Alexandre explica que, ao longo do
processo de envelhecimento, é natural que ocorram mudanças na composição corporal,
como o maior acúmulo de gordura na região do abdômen, por exemplo. Além disso,
também é comum que haja uma diminuição da espessura da pele e, por
consequência, uma menor disponibilidade da substância precursora da vitamina D
na epiderme, bem como uma menor capacidade de síntese da forma ativa dessa
vitamina.
“Por isso, no nosso estudo,
utilizamos medidas de circunferência abdominal, que é uma medida prática é
acessível que verifica o acúmulo de gordura no abdômen e é mais
precisa que o IMC, por exemplo”, afirma.
Outra modificação apontada com o
envelhecimento é a diminuição do número de receptores de vitamina D nos tecidos
corporais, o que dificulta a captação dessa vitamina circulante no organismo.
No entanto, ressalta o estudo, o
acúmulo de gordura abdominal tem papel importante no “sequestro” da vitamina D
circulante na corrente sanguínea. “Ao analisarmos as células de gordura dessas
pessoas, é possível observar que as enzimas da vitamina D estão baixas. Isso
acontece porque um receptor da vitamina D (VDR) passa a capturar a vitamina D
que está na corrente sanguínea. Isso ocorre como forma de compensar o baixo
nível de enzimas na célula de gordura. De modo simplificado, é como se o tecido
adiposo sequestrasse a vitamina D. O que faz com que haja uma menor
biodisponibilidade de vitamina D nos exames de sangue, como vemos. É esse
processo que vai acarretar insuficiência ou até deficiência de vitamina D”,
explica Thais Barros Pereira da Silva, aluna de iniciação científica e primeira
autora do estudo.
Alexandre ressalta que o estudo
reforça a necessidade de políticas públicas para a prevenção e o enfrentamento
tanto da obesidade quanto da carência de vitamina D na velhice. "Todos
sabemos que é mais fácil prevenir que remediar e comprovamos que a obesidade
abdominal pode interferir nas concentrações de vitamina D do sangue, algo que
pode desencadear uma série de problemas de saúde nos idosos", disse.
O estudo Is Abdominal Obesity a Risk Factor for the Incidence of Vitamin D
Insufficiency and Deficiency in Older Adults? Evidence from the ELSA Study pode
ser lido em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9572900/.
Maria Fernanda Ziegler
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/acumulo-de-gordura-abdominal-aumenta-risco-de-insuficiencia-de-vitamina-d-aponta-estudo/41545/
Nenhum comentário:
Postar um comentário