Disparada nos preços desses
insumos, potencializada pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, já afeta
produtores - em especial os pequenos. Veja dicas de especialistas em Direito
Agrário para evitar maiores problemasFOTO: Governo Federal
A crise no abastecimento
de fertilizantes já
afeta seriamente empresas do agronegócio e produtores rurais, em especial os
pequenos, com o descumprimento contratual por parte dos fornecedores desses
insumos.
O alerta é do escritório
Bueno, Mesquita & Advogados, especializado em Direito Agrário, onde os
advogados já preparam notificações extrajudiciais exigindo o cumprimento de
acordos superiores a R$ 2 milhões.
Desde o ano passado, o preço
dos fertilizantes já vinha sofrendo grandes alterações devido à disparada do
dólar. O início do conflito armado entre Rússia e Ucrânia, em fevereiro
último, levou a situação a sair do controle, já que o fornecimento foi
interrompido, afetando a alta dependência do Brasil - de cerca de 85% - de
insumos desses países.
Só em 2021, 23% da produção
russa foi importada por produtores brasileiros, segundo dados do Comex Stat
(sistema de consulta de dados relativos ao comércio exterior brasileiro ligado
ao Siscomex).
Nesse cenário, a alta nos
preços já ultrapassou 200% desde o início de 2022, pela estimativa
dos analistas jurídicos do escritório. Com isso, fornecedores que
fecharam contratos com preço antigo se recusam a fazer a entrega já que, para
eles, é mais vantajoso repassar os insumos a quem compra agora, para poderem
praticar os valores já reajustados.
Essa "manobra" é
que leva ao descumprimento dos contratos antigos, afetando o lado mais fraco
dessa equação: os pequenos produtores, segundo o advogado Francisco de Godoy
Bueno, sócio fundador do escritório.
As grandes empresas do setor
conseguem, na maioria das vezes, ter um relacionamento mais estreito e direto
com os fornecedores, e são menos suscetíveis a sofrerem com a quebra contatos
de longo prazo, explica.
"Já o pequeno, quando
não atua em uma cooperativa, por exemplo, acaba lidando com distribuidores
muito menores, menos preparados para as oscilações de mercado, e se sente
pressionado a negociar em condições desvantajosas."
PROBLEMA SISTÊMICO
É prática no agronegócio que
o produtor rural adquira os insumos para a próxima safra com antecedência, como
no primeiro semestre de 2022, para plantar nos meses de setembro, outubro e
novembro, segundo os especialistas do Bueno, Mesquita & Advogados.
Porém, a quebra dos contratos
vem obrigando os agricultores a buscar alternativas emergenciais para a
produção, como consultoria agronômica para fazer uso racional de fertilizantes,
usando reserva de solo.
Na safra de 2021, por
exemplo, a soja começou a ser plantada com o preço de R$ 80 a saca. No final
desse período, já chegava a R$ 160. "Houve grande pressão das tradings e
das revendedoras de produtos, que se movimentaram para não entregar pelo valor
contratado devido à grande mudança que aconteceu no mercado", lembra Francisco
Bueno.
O prejuízo ficou com o
produtor: quem fez planejamento de longo prazo e conseguiu travar custos mais
baixos, acabou sendo forçado a renegociar contratos de entrega futura com a
alta excessiva nos preços de fertilizantes e defensivos.
Mesmo assim, o advogado
destaca a importância dos contratos de longo prazo pois, além de darem
previsibilidade e serem usados estrategicamente para ancorar custos, estimulam
compradores na ponta a buscarem mecanismos de proteção. "Se houvessem
políticas públicas para dar mais segurança em tempos de calamidade, não se
descumpririam contratos."
Mas não para por aí. Bueno
lembra que a quebra de contrato pode afetar os dois lados. Primeiro, os
produtores, que fazem compras antecipadas para travar preços e equilibrar
custos. E segundo, os distribuidores, que terão dificuldade em repor seus
estoques - o que pode gerar quebradeira no setor. "É um problema
sistêmico", reforça.
A seguir, confira as
orientações dos especialistas para minimizar os efeitos dessas práticas abusivas:
CUIDADOS AO ELEGER
FORNECEDORES - Além de fazer
uma escolha minuciosa do fornecedor de insumos, prospectando empresas sérias,
sólidas e com tempo significativo de atuação no ramo, é preciso elaborar um
contrato bem estruturado, com previsões claras, que protejam ambas as partes e
incluam obrigações e penalidades por descumprimento, orienta o
escritório.
NÃO ADIANTE NENHUM VALOR - Com a disparada dos
preços dos fertilizantes e a eventual quebra de contratos por parte de
fornecedores, o escritório explica que produtores e empresas do setor têm
preferido firmar contratos em dólar para se proteger da volatilidade do câmbio.
Mas alerta: não adiante
valores, fixando o pagamento para a data de entrega do insumo. Um contrato
obriga a parte a cumprir o que foi previsto, independentemente da antecipação
do pagamento. Portanto, melhor esperar a operação ser concluída, orienta
Francisco Bueno.
"Quem adianta dinheiro
fica desprotegido em caso de oscilação econômica - principalmente em um momento
como agora, em que o risco de contraparte é real."
ESTOQUE COM SEGURANÇA - Caso o produtor tenha
adquirido o fertilizante a preço justo, o escritório recomenda estocar o insumo
com segurança. Para isso, entretanto, é importante que a propriedade disponha
de uma infraestrutura adequada para armazenamento.
Além de redobrar a atenção
contra furtos e roubos, já que esses produtos têm sido alvo de criminosos
devido ao preço elevado, eles também exigem proteção contra umidade no
armazenamento para evitar perdas.
Mesmo em cargas pequenas,
defensivos e fertilizantes valem milhões de reais, e são alvos fáceis de
receptadores, que se livram dos produtos simplesmente jogando-os na lavoura,
sem deixar pistas do crime. A prática afeta inclusive os distribuidores.
"É um risco de contraparte muito alto, e ter um seguro é um fator de
extrema importância."
PESQUISE OS MOTIVOS - A primeira providência, em
caso de quebra de contrato, é fazer uma pesquisa aprofundada sobre o motivo
dessa quebra e partir para a mediação para garantir o seu cumprimento, explica
Bueno.
A ideia é descobrir se a
quebra foi provocada por insolvência da empresa, eventuais roubos ou por
arbitragem de preços, mesmo. "É importante não tolerar o
descumprimento por oportunismo: afinal, essa construção das estratégias empresariais
de longo prazo na agricultura brasileira foi essencial para o setor chegar ao
patamar atual."
JUDICIALIZAÇÃO E ARRESTO - Apelar para o
Judiciário, como os clientes do Bueno, Mesquita & Advogados estão fazendo,
são casos extremos, quando se descobre que, definitivamente, o cumprimento do
contrato está em risco.
Nesse caso, se não houve sucesso na renegociação entre as partes e nem na mediação, é momento de buscar medidas cabíveis, segundo o advogado. "Se for constatado que esse fornecedor vai receber a carga e privilegiar contratos novos em detrimento dos antigos, cabe liminar acautelatória para fazer o arresto do seu estoque", orienta.
Repórter lignelli@dcomercio.com.br
Fonte: https://dcomercio.com.br/categoria/negocios/crise-dos-fertilizantes-o-fornecedor-quebrou-o-contrato-e-agora
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