A mesma dieta balanceada que para a maioria traz benefícios à saúde, pode ser inadequada para quem tem síndrome da quilomicronemia familiar (SQF)
Seguir uma alimentação saudável e
equilibrada é essencial para nutrir e manter a saúde do corpo humano.
Entretanto, para pessoas com síndrome da quilomicronemia familiar (SQF) esta
mesma dieta pode gerar problemas. Estes indivíduos precisam consumir
quantidades muito restritas de gordura, entre 10 e 20g de gordura por dia,
quantidade considerada muito baixa, tendo em vista que uma colher de café de
manteiga, ingrediente bastante utilizado no preparo de alimentos, já contém
essa medida de gordura[1]. Essa restrição é necessária porque estes pacientes
possuem um elevado nível de triglicérides no sangue e não conseguem metabolizar
essa gordura[2].
A SQF é uma doença genética rara, hereditária, que afeta homens e mulheres, que
pode se manifestar em qualquer momento da vida. O aumento de triglicérides no
organismo dos pacientes ocorre por uma anomalia nos genes responsáveis pela
produção ou função da enzima lipoproteína lipase (LPL)[3]. Essa enzima é
encarregada de "quebrar" os triglicérides presentes nos quilomícrons
(uma das moléculas responsáveis pelo transporte de lipídeos)[4] possibilitando
que elas sejam enviadas para tecido adiposo e músculo. O restante, é
transportado diretamente ao fígado. A ausência dessa enzima leva a um acúmulo
de quilomícrons no sangue que elevam a quantidade de triglicérides, causando
diversos sintomas[2].
"Os principais sinais e sintomas dessa condição são dores abdominais,
nódulos de gordura na pele, e pode ainda provocar pancreatite aguda. Em razão
de serem semelhantes à outras doenças, acabam levando à um diagnóstico
incorreto e tardio. Entretanto, existem outros sinais que podem ser observados
em conjunto como: triglicérides elevados; sangue viscoso com uma camada de
gordura visível já durante a coleta do exame de sangue; depósito de gordura na
retina; fadiga e em alguns indivíduos, alteração de memória. Assim, o
diagnóstico precoce é essencial para evitar as complicações dessa doença,
especialmente a ocorrência de pancreatite", explica a nutricionista Ana
Maria Pita Lottenberg.
Para quem tem a síndrome, é fundamental o acompanhamento nutricional constante,
uma vez que a principal forma de tratamento da doença é a adequação da
alimentação. "Com a confirmação do diagnóstico da SQF, o primeiro passo é
elaborar uma dieta restrita em gorduras para esse paciente, o que significa
retirar não apenas alimentos industrializados e embutidos, mas também os alimentos
considerados saudáveis que possuem grande quantidade de gordura, como óleos
vegetais (canola, soja e oliva), castanhas, nozes, abacate. E apostar em
alimentos como hortaliças, cereais, carnes pouco gordurosas, produtos lácteos
desnatados e grãos. Assim, a dieta é composta por alimentos saudáveis
consumidos normalmente em uma alimentação equilibrada, no entanto com o consumo
mínimo de alimentos ricos em gordura", esclarece Lottenberg.
Além do acompanhamento do nutricionista, esses pacientes devem contar também
com outras especialidades médicas, já que a condição traz diversos sintomas e
pode afetar outras áreas do organismo. "Por ser uma doença que pode se
manifestar do nascimento até a vida adulta, é necessário que o paciente tenha
um acompanhamento multidisciplinar constante, podendo procurar por
especialistas como cardiologistas, pediatras, endocrinologistas,
hepatologistas, hematologistas, geneticistas, dermatologistas e nutricionistas,
por exemplo.
Ainda que os pacientes com SQF tenham que seguir uma dieta restrita, é
importante que consigam aderi-la e mantê-la com constância e, com a ajuda do
nutricionista, podem experimentar modos de preparos diferentes e novas receitas
para conseguir uma variedade em sua alimentação.
Saiba mais sobre a
síndrome da quilomicronemia familiar
A SQF é uma doença genética de herança
recessiva, ou seja, é necessário que tanto o pai quanto a mãe de um indivíduo
afetado, tenham um gene alterado; portanto, o risco de recorrência para a prole
(os filhos) de pais portadores (do gene alterado) é de 25% para cada gestação
do casal. Além disso, estima-se que a prevalência seja entre uma e duas em cada
um milhão de pessoas. [2,3]
O diagnóstico da síndrome pode ser feito através
do exame clínico ou laboratorial. Em um exame de sangue é possível avaliar a
ausência ou deficiência da enzima LPL, assim como os níveis de triglicérides.
Além disso, pode ser solicitado também um exame genético[5]. Em geral, o
diagnóstico é feito tardiamente por conta dos sintomas bastante comuns e pela
doença poder se manifestar em qualquer idade. Logo, é importante que a
população tenha conhecimento sobre ela e fique atenta aos sinais.
Referências
[1] Burnett JR, Hooper AJ, Hegele RA, et al. Familial Lipoprotein Lipase
Deficiency. In: GeneReviews® [Internet]. Sea le (WA): University of Washington,
Sea le; 1993?2020.
[2] Falko JM. Familial Chylomicronemia Syndrome: A Clinical Guide For
Endocrinologists. Endocr Pract. 2018;24(8):756-763.
[3] Baass A, Paquee M, Bernard S, Hegele RA. Familial chylomicronemia syndrome:
an under recognized cause of severe hypertriglyceridaemia [published online
ahead of print, 2019 Dec 16]. J Intern Med. 2019;10.1111/joim.13016.
[4] AYNES, John W.; DOMINICZAK, Marek H. Bioquímica médica. 4. ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2015
[5] Sugandhan S, Khandpur S, Sharma VK. Familial chylomicronemia syndrome.
Pediatr Dermatol. 2007;24(3):323-325
Nenhum comentário:
Postar um comentário