Apesar de
representar apenas 5% dos tumores que afetam homens, incidência tem aumentado
nos últimos anos Pixabay
Quando se fala em doença que afeta a população
masculina, o câncer de próstata aparece como o principal algoz da saúde dos
homens. As campanhas de prevenção e cuidados são todas envolvendo a doença na
próstata, que é o segundo câncer que mais atinge homens e representa 7,1% de
todos os tipos de câncer considerados, segundo dados do Instituto Nacional do
Câncer (INCA).
Entretanto, há outra neoplasia que tem recebido
atenção nos últimos tempos, pois os números começaram a crescer e despertar
olhares da comunidade médica e dos pacientes homens. Trata-se do tumor de
testículo, um nódulo que aparece no órgão e pode ocasionar dores e uma sensação
de peso no testículo, que é o órgão responsável pela produção de hormônios e
espermatozoides.
O tumor de testículo corresponde a 5% do total de
casos de câncer entre os homens e, segundo o Atlas da Mortalidade por Câncer de
2019, o número de mortes causadas por tumor de testículo foi de 446. Além do
baixo índice de mortalidade pela doença em si, muitos pacientes podem
experimentar complicações do tratamento que podem os acompanhar ao longo de
toda a vida, se não levar a óbito por outras causas. Portanto, a detecção
precoce colabora com as chances de cura da doença e com menor sofrimento por
parte do paciente em relação ao tratamento. Outra preocupação é que o tumor de
testículo acomete praticamente homens jovens – entre 15 e 40 anos – de modo que
as sequelas do tratamento e o risco de vir a desenvolver um outro tipo de
câncer podem acompanhar o paciente por toda a vida.
O especialista no assunto, o uro-oncologista Dr.
Willy Baccaglini esclarece que o câncer de testículo muitas vezes é
negligenciado. “Muitas vezes o câncer de testículo é confundido com uma
inflamação na bolsa escrotal ou até mesmo um trauma local, o que faz com que a
pessoa demore para chegar ao urologista. Isto pode interferir na taxa de cura
destes homens, assim como pode interferir em sua fertilidade, assim como a
produção de hormônios fundamentais tal como a testosterona”, afirma o
urologista e mestre em Medicina Sexual pela FMABC.
O aumento do câncer de testículo, ao longo do
século XX, veio acompanhado do aumento de outras desordens no sistema
reprodutor masculino, algumas relacionadas à descida do testículo para a bolsa
escrotal durante as fases de desenvolvimento, e a infertilidade.
Portanto, uma das hipóteses para o surgimento do
câncer de testículo é que ocorra alguma alteração comum para estas alterações
e, consequentemente, um substrato genético muito importante. Este componente
genético é corroborado pela maior incidência em homens filhos de homens com
câncer de testículo ou irmãos de homens com câncer de testículo. Outro dado que
fortalece esta associação genética é que são pacientes muito jovens que são
diagnosticados (pico entre 15-35 anos) o que sugere que estes homens já trazem
consigo alterações que os tornem suscetíveis ao desenvolvimento do tumor em si.
O médico ainda alerta que dentre os homens mais
jovens, entre 15 e 40 anos, o tumor de testículo é o mais comum entre todos.
“Pelo fato do diagnóstico de câncer se algo incomum entre pessoas jovens, o
câncer de testículo em si, comparado a outros tumores, não é uma doença comum,
porém quando olhamos apenas para homens entre 15-40 anos, o câncer de testículo
é o tipo mais comum, e falta de informação a respeito disso pode impactar
diretamente no diagnóstico precoce e complexidade do tratamento destes
pacientes”, diz .
Dr. Willy Baccaglini elenca algumas dúvidas mais
comuns acerca do câncer de testículo:
1 – Quais os sintomas e como detectar?
O principal sintoma é o aparecimento de um nódulo
duro, geralmente indolor, de tamanho variável, que pode crescer rapidamente.
Mas é importante ficar atento a outras alterações, como aumento ou diminuição
no tamanho dos testículos, endurecimentos, dor na parte baixa do abdômen,
sangue na urina e aumento do volume ou da sensibilidade nos mamilos.
“A genética é um dos principais fatores
relacionados ao câncer de testículo. Os principais fatores de risco para esta
doença são: parentes de primeiro grau diagnosticados com a doença (irmãos e
pai), diagnóstico prévio de testículos ‘não descidos’ e homens com alterações
de tamanho do testículo”, complementa o especialista.
Assim como é recomendado às mulheres, nos casos de
câncer de mama, o autoexame nos testículos é um dos primeiros passos para
identificar qualquer anormalidade, nódulos ou inchaço nos testículos. A partir
disso, exames laboratoriais ou clínicos, além de investigação sobre casos na
família e possíveis sintomas, complementam a investigação e podem confirmar o
diagnóstico.
O acompanhamento preventivo e a detecção precoce de
qualquer anormalidade no corpo são fundamentais para garantir uma vida mais
saudável. Os índices de cura do tumor de testículo são altos, quando a doença é
descoberta de maneira precoce.
“Portanto, é muito importante que a educação e informação
sobre o autoexame de testículo seja algo difundido, não apenas para reduzir o
risco de morte pela doença, como também para que aqueles que são diagnosticados
recebam tratamentos com menor risco de sequelas permanentes para toda a vida”,
aponta.
2- Pode afetar o pênis?
Pela proximidade dos órgãos e por trabalharem
juntos, uma grande preocupação em relação ao câncer de testículo é afetar o
pênis e acabar espalhando a doença, ou até prejudicando o desempenho sexual ou
algo do gênero. Porém, o especialista afirma que, apesar de existir a
possibilidade do tumor se espalhar para outros órgãos, como o abdômen e próximo
aos rins, o pênis não é afetado.
“O testículo é um órgão que ‘nasce’ durante o
desenvolvimento do bebê na barriga da mãe, de um tecido próximo ao tecido que
dá origem aos rins e, só ao final da gestação que os testículos se posicionam
na bolsa escrotal. Portanto, o trajeto que o câncer de testículo ‘escolhe’ para
se ‘espalhar’ é para o abdome, em uma região próxima aos rins chamada de retroperitônio
e, não para o pênis”, detalha Baccaglini.
3- Pode ter alguma relação com a Covid-19?
Principal inimigo da saúde humana durante o último
ano, as sequelas e consequências da Covid-19 ainda são nebulosas e estão sendo
investigadas pela comunidade médica. Recentemente, além da impotência sexual
observada em alguns pacientes acometidos pelo coronavírus, uma pesquisa da
Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) apontou que de 26 pacientes com casos
leves e moderados da doença, que não se queixavam de dores escrotais, 42,3%
apresentaram epididimite, uma inflamação em um canal atrás dos testículos, mas
sem relação direta com câncer.
Além desse fato, o Dr. Willy alerta que a pandemia
interferiu nos diagnósticos e, consequentemente, no tratamento do tumor. “Historicamente,
o câncer de testículo é uma doença ignorada e que é caracterizada pela demora
do paciente em procurar o sistema de saúde por falta de conhecimento, vergonha
e medo. Portanto, a pandemia pode sim ter um impacto maior ainda neste atraso
do paciente ser diagnosticado e receber um pronto atendimento”, detalha.
4- Pode causar esterilidade masculina?
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os
homens são os responsáveis em 40% dos casos de infertilidade.
De acordo com o Dr. Willy, a infertilidade
apresenta uma forte associação com tumor de testículo. Sabe-se que mais da
metade (50-60%) dos homens com câncer de testículo apresentam alguma alteração
no espermograma, com destaque para redução no número de espermatozoides, e até
10-15% são azoospérmicos = ou seja, não têm espermatozoides no espermograma”
esclarece.
Estes dados não somente alertam para o fato da
correlação, como também da importância de se oferecer alternativas do ponto de
vista de fertilidade para estes homens antes do início de tratamentos mais
agressivos, tais como a quimioterapia e a radioterapia, os quais podem piorar
ainda mais a qualidade do sêmen.
Alguns poucos pacientes (2-2,5%) apresentam o
câncer em ambos os testículos e o tratamento acaba os deixando estéreis
invariavelmente, além de precisarem repor testosterona para o resto da
vida.
5 - E o tratamento, como funciona?
Uma vez que o diagnóstico é positivo, a primeira
opção de tratamento é cirúrgica, na tentativa de remover completamente o tumor
alojado na bolsa escrotal. Em casos muito selecionados em que o nódulo é
pequeno, onde há suspeita de um tumor benigno (não um câncer), é possível
optar por biópsia durante a cirurgia com intuito de se preservar o testículo e
retirar apenas o nódulo. Em caso positivo para câncer, o testículo é removido
totalmente. O mais comum é a equipe médica realizar a retirada completa do
testículo afetado.
Dr. Baccaglini esclarece que a alta chance de cura
é resultado justamente da boa resposta do paciente aos tratamentos. “A boa taxa
de cura dos tumores de testículo está relacionada à boa resposta destes à
quimioterapia, que é considerada um marco no tratamento desse tipo de doença.
Hoje, de uma maneira em geral, a cura pode ser alcançada na maior parte dos
tumores em 90-95% dos casos, apesar do tratamento em uma parte considerável dos
casos ser bastante agressivo e associado a complicações e elevada
toxicidade", explica.
Willy
Baccaglini - Especialista em Uro-Oncologia; Membro do Corpo
Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein como Uro-Oncologista.
Mestre em Medicina Sexual pela FMABC.
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