Não é incomum pacientes com doenças autoimunes ter dúvidas
sobre vacinação. Devo me vacinar? Qualquer tipo de vacina é compatível? Quais
são as recomendações? Para sanar essas e outras dúvidas, conversamos com o
neurologista Dr. Herval Ribeiro Soares Neto, que explicou a importância da
vacinação em quem lida com uma doença crônica, como a esclerose múltipla
(EM), doença autoimune, na qual o sistema imunológico ataca o
sistema nervoso central (cérebro e medula espinhal).
"Existem diversos mitos e argumentos contrários à
vacinação. E quando se trata de imunização em doenças autoimunes, a
desinformação normalmente é maior. Por isso, antes de mais nada, precisamos
reforçar que o ganho com a imunização, de maneira geral, é muito grande,
ultrapassa a prevenção individual", esclarece o especialista.
Quem tem esclerose múltipla está mais suscetível a contrair
infecções.
Verdade. Pessoas com a doença
têm um risco maior de contrair infecção quando comparamos com quem não tem uma
condição autoimune[2]. Isso pode acontecer porque quando a doença não está
controlada, o corpo fica mais suscetível ao ataque de vírus e bactérias. E
devemos lembrar que as infecções podem elevar o risco de surtos e aumentar a
incapacidade[3], daí a relevância de se vacinar.
A vacinação não é recomendada em pessoas que têm EM.
Mito. A vacinação é um pilar
da saúde pública e uma das formas mais seguras e eficazes de prevenir doenças
infecciosas[4][5]. Órgãos internacionais, como a National Multiple
Sclerosis Society e a Academia Americana de Neurologia (AAN),
recomendam que pessoas com EM recebam vacinas de acordo com as
diretrizes-padrão. As entidades propõem que a estratégia de imunização seja
individualizada por paciente[6], uma vez que o aspecto clínico da esclerose
múltipla varia de indivíduo para indivíduo.
Não é qualquer tipo de vacina que é recomendada para quem tem
esclerose múltipla.
Verdade. As vacinas podem ser
divididas em dois grupos: as atenuadas e as inativadas. Quem tem
EM, deve evitar as vacinas atenuadas. Esse tipo de imunizante pode acentuar os
sintomas da doença ou causar outros[1]. Por isso, é recomendado evitá-las.
Entre as vacinas atenuadas, por exemplo, temos as de tuberculose, sarampo,
caxumba, rubéola e da febre amarela, que são, geralmente, contraindicadas para
pessoas com sistema imunológico enfraquecido[1]. Normalmente, as vacinas
toleráveis em quem tem esclerose múltipla são as de vírus inativado[7],
quando o agente infeccioso foi morto e é incapaz de causar a doença; de
subunidade[1], quando é utilizada uma parte da proteína ou de um antígeno,
e a toxoide[1][8], que contêm uma toxina bacteriana quimicamente
modificada, que estimula uma resposta imunológica, ajudando a formação de
anticorpos.
Quem usa medicamentos modificadores da doença não precisa
reavaliar o status de vacinação para confirmar a imunoproteção.
Mito. Após a imunização é
fundamental que o paciente faça uma reavaliação com o profissional de saúde
para checar a imunoproteção[4]. A resposta autoimune pode variar em cada caso,
por isso, a necessidade dessa checagem com o profissional de saúde que o
acompanha.
Quem está em surto deve atrasar a vacinação.
Verdade. De acordo com as
diretrizes internacionais, os pacientes em surto devem atrasar a vacinação. Contudo,
não temos como estabelecer um período, pode variar de pessoa para pessoa. Esse
prazo precisa ser discutido com o médico.
As recomendações a respeito da vacinação para quem tem EM,
servem para todos os pacientes.
Mito. As recomendações podem
variar. Os profissionais de saúde devem avaliar cada situação de maneira
individual.
Para finalizar, Dr. Herval reforça que o paciente sempre deve
buscar informações com um especialista. "O paciente deve seguir as
recomendações de quem o acompanha. Esses profissionais são as pessoas mais
aptas para dar as diretrizes mais adequadas, uma vez que conhecem o histórico e
sabem qual é o perfil da doença do paciente", conclui.
Saiba mais sobre a esclerose múltipla[9][10][11]: a EM é caracterizada por um processo de inflamação crônica
que pode causar desde problemas momentâneos de visão, falta de equilíbrio até
sintomas mais graves, como perda de visão e paralisia completa dos membros. A
esclerose múltipla está relacionada à destruição da mielina - membrana que
envolve as fibras nervosas responsáveis pela condução dos impulsos elétricos do
cérebro, medula espinhal e nervos ópticos. A perda da mielina pode dificultar e
até mesmo interromper a transmissão de impulsos nervosos. A inflamação pode atingir
diferentes partes do sistema nervoso, provocando sintomas distintos, que podem
ser leves ou severos, sem hora certa para aparecer. A doença geralmente surge
sob a forma de surtos recorrentes, sintomas neurológicos que duram ao menos um
dia. A maioria dos pacientes diagnosticados são jovens, entre 20 e 40 anos, o
que resulta em um impacto pessoal, social e econômico considerável por ser uma
fase extremamente ativa do ser humano. É uma doença inflamatória e
degenerativa, que progride quando não tratada. É senso comum entre a classe
médica que para controlar os sintomas e reduzir a progressão da doença, o
diagnóstico e o tratamento precoce são essenciais.
Referências
[1] Guia de Discussão sobre Esclerose Múltipla no Brasil - Juntos para um Novo
Futuro. Acesse em: www.guiadaem.com.br
[2] Luna G et al. JAMA Neurol. 2019;77(2).
[3] Loebermann M et al. Nature Rev Neurol. 2012;8:143-151.
[4] Chevalier-Cottin E. Infect Dis Ther. 2020 Jun 24 [Epub ahead of print].
[5] Poljak M et al. Clin Microbiol Infect. 2014;20 Suppl 5:1.
[6] Farez M et al. Neurology. 2019;93:584-594.
[7] Ciotti J. Mult Scler Relat Disord. 2020 Aug 1;45:102439 [Epub ahead of
print].
[8] Vetter V et al. Ann Med. 2018. 50:110-120.
[9] Neeta Garg1 & Thomas W. Smith2. An update on immunopathogenesis,
diagnosis, and treatment of multiple sclerosis. Barin and Behavior. Brain and
Behavior, 2015; 5(9)
[10] Noseworthy JH, Lucchinetti C, Rodriguez M, Weinshenker BG. Multiple
sclerosis. N Engl J Med. 2000;343(13):938-52.
[11] Cristiano E, Rojas J, Romano M, Frider N, Machnicki G, Giunta D, et al.
The epidemiology of multiple sclerosis in Latin America and the Caribbean: a
systematic review. Mult Scler. 2013;19(7):844-54.
Nenhum comentário:
Postar um comentário