DIVULGAÇÃO |
O
nascimento de um bebê impacta fortemente a vida de um casal, sejam pais de
primeira viagem, sejam os mais experientes. Uma perspectiva romântica na
construção da família tem origem na ideia de que duas pessoas que se amam são
responsáveis pela felicidade um do outro, as metades das laranjas, as almas
gêmeas, e o filho seria a coroação desse relacionamento. O fato é que, em
muitos casos, o nascimento está mais para um belo drama. Os
primeiros anos da vida do bebê são um período especialmente crítico. E o
principal motivo está relacionado às demandas de cuidado frente aos
comportamentos naturais do novo membro da família e à maneira como nos
estruturamos socialmente. Encontrar um ponto de equilíbrio entre as
necessidades inerentes à nossa espécie e às rotinas impostas pela organização
social é um desafio. Refletir sobre isso é a única maneira de evitar que os
bebês, tão sensíveis, paguem o preço dessa conta. Um
exemplo muito claro dessa pressão social sobre comportamentos está
relacionado ao sono do bebê. O padrão de sono infantil é muito diferente do
padrão de sono de um adulto. De forma resumida, o sono dos bebês é composto
pelo sono “REM” (uma fase mais ativa do sono em que o bebê se mexe, resmunga,
choraminga ou muda de lado) e pelo sono “não REM” (uma fase de sono mais
calmo). E, para passar de um ritmo de sono para outro, os bebês apresentam o
que chamamos de “sono de transição”. Durante toda a noite, há alternância
entre esses tipos de sono. Cada
ciclo pode durar de 90 a 110 minutos, e, quanto menor a idade, mais curto o
ciclo. Em alguns momentos, a criança terá um pequeno despertar, irá abrir os
olhos e procurar os pais. Ao nascer, a proporção entre sono “REM” e “não REM”
é de meio a meio. À medida que o bebê cresce, a duração da fase mais ativa e
agitada vai diminuir e os ciclos ficarão mais longos. Em poucas palavras,
comparando com os adultos, os bebês têm ciclos de sono mais curtos e mais
tempo de sono agitado e leve. Ao nascer, o bebê dorme muito durante o dia e à
noite. Com o tempo, o sono vai se tornando predominantemente noturno, com o
desaparecimento gradual das sonecas diurnas. Para
adormecer, a criança precisa se sentir segura. E, obviamente, essa segurança
significa o colo, o peito, a presença dos pais. É um instinto de
preservação que nos acompanha desde os primórdios. Do outro
lado, encontramos pais exaustos. Mas isso está relacionado com a rotina que
criamos, e não com o nosso desenvolvimento neurofisiológico natural.
Entretanto, vivemos um problema quando tentamos tratar o não tratável, curar
um problema que não existe e modificar um comportamento natural. Não há
como “treinar” o sono dos bebês. A médica australiana Pamela Douglas
conseguiu provar que bebês submetidos a algum tipo de treinamento de sono,
antes dos 6 meses de idade, podem sofrer desmame precoce. Interferir
no padrão natural de sono do bebê implica em vários ciclos de sono
sequenciados, sem solicitação dos pais. O bebê irá mamar menos vezes e o seio
materno será estimulado muito menos na madrugada. Vale lembrar: quanto mais o
bebê suga, mais leite é produzido. Quanto menos suga, menos leite haverá no
dia seguinte. Para
muitas mulheres, fartas em leite, a produção menor pode não fazer diferença
na amamentação. O bebê continua mamando bem de dia e ganha peso satisfatoriamente.
Para outras, o resultado pode ser outro. A pouca estimulação leva à baixa
produção de leite com inquietação do bebê durante as mamadas, choro e baixo
ganho de peso. Outra
questão é que o leite materno noturno é rico em substâncias que são auxiliares
no sono do bebê. E se o bebê ingere menos deste leite, pode ter um sono mais
agitado, apesar de todas as técnicas ensinadas. Os
treinamentos de sono sugerem que o bebê permaneça no berço, porém, para o
bebê, estar longe dos pais pode ser percebido como ameaça à sua
sobrevivência. E o choro não atendido pode levar a um estado de hiperativação
do corpo da criança, com liberação de hormônios do estresse que aumentam a
frequência cardíaca, dilatam a pupila, elevam a respiração, causam
suor. Deixar de atender aos “chamados” do
bebê leva ao desamparo aprendido, com impactos para toda a vida, ensinando a
criança a se acostumar com situações ruins sem motivação para buscar ajuda.
Acolha sempre seu bebê. |
Os
“consultores de sono” sugerem que esse contato com a criança é prejudicial ao
sono. Assim como não recomendam embalar ou deixar dormir no peito ou no colo.
Não faz sentido. Tentar sobrepor tabelas de sono e tempos determinados de
sonecas a comportamentos instintivos é uma falácia que leva as famílias a pensar
que seus bebês são doentes, que têm problemas, distúrbios graves, ou que não
são bebês “normais”.
Procure refletir sobre essas questões –
e tenha uma boa noite!
Marcio André Bosse - psicólogo, especialista em desenvolvimento infantil (Instagram: @papaimarcio)
Nenhum comentário:
Postar um comentário