Ataques aéreos na
região vêm elevando o número de pessoas deslocadas desde 1º de dezembro de 2019,
segundo levantamento das Nações Unidas
Ataques aéreos combinados com uma ofensiva terrestre conduzida por
forças do governo sírio e seus aliados russos
provocaram uma enorme onda de deslocamento na única área ainda controlada pela
oposição no país, localizada no noroeste da Síria. Com
cidades e acampamentos a oeste de Aleppo atingidos por bombardeios
nos últimos dias, as estradas engarrafaram com a fuga de pessoas para zonas de
segurança, cada vez mais em menor número no país.
"As pessoas estão enfrentando uma situação
desesperadora", diz Julien Delozanne, coordenador-geral
na Síria da organização de ajuda humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF).
“Regiões
que antes eram consideradas relativamente seguras agora estão sob ataque. As
pessoas que fogem para o norte estão sendo encurraladas em um território cada
vez menor, entre a frente de batalha a leste e a fronteira turca a oeste, que
está fechada. As condições de vida dos deslocados que estão em acampamentos já
são críticas. Se a operação militar continuar, um novo afluxo de pessoas para a
área tornará a situação ainda pior.”
As forças do governo sírio assumiram o controle da
rodovia que liga as cidades de Damasco e Aleppo
e agora avançam, ameaçando áreas densamente povoadas no oeste da última cidade.
Nos dias 14 e 15 de fevereiro, bombardeios
atingiram campos localizados ao redor da cidade de Sarmadah,
onde dezenas de milhares de pessoas que fugiam dos combates no sul de Idlib
haviam chegado recentemente. Várias pessoas ficaram feridas e algumas tendas
foram destruídas. A cidade de Takad, a cerca de 20 km a leste,
foi atingida várias vezes desde o dia 13 de fevereiro, fazendo com que a
maioria dos moradores da cidade fugisse.
"A maioria das pessoas está fugindo de Takad por
causa dos recentes ataques de artilharia, mísseis e aviões de guerra",
diz Mustafa Ajaj, diretor do centro de saúde apoiado por MSF em Takad.
“As
únicas pessoas que ficaram são as que não podem comprar um veículo ou não sabem
para onde ir. Estamos transferindo nossos suprimentos médicos para outro local
e estou procurando um local seguro, em uma área onde as necessidades médicas estão
se tornando cada vez mais urgentes, para retomar nossas atividades. Mas
deixamos alguns suprimentos médicos básicos para as pessoas que ainda estão em
Takad.”
O hospital na cidade de Al Atareb,
que recebeu kits de emergência de Médicos Sem Fronteiras, teve que
fechar no dia 16 de fevereiro após ataques à cidade. O hospital em Darat-Izaa
também fechou no dia 17 de fevereiro por medo de ser bombardeado. Como
resultado, agora não há hospitais em funcionamento na província rural de
Aleppo.
Diante da situação instável e imprevisível, a
população na província de Idlib (norte) e na província de Aleppo (oeste) – já
deslocadas inúmeras vezes anteriormente –, vivenciam grande incerteza. "Ninguém
sabe como será o dia de amanhã. Só sabemos que há bombardeios e que as forças
do governo estão avançando", diz um médico de MSF que trabalha
no campo de Deir Hassan, 30 km a oeste de Aleppo. "Vivemos com
medo e estressados."
Mais de 875 mil pessoas foram deslocadas dentro do
noroeste da Síria desde o dia 1º de dezembro de 2019, segundo a ONU. Os campos
de deslocados internos estão sobrecarregados e as pessoas contam que conseguir
alugar um quarto nas cidades é impossível, independentemente da distância em
que acontecem os bombardeios. Sem ter para onde ir, a população monta tendas em
encostas, beiras de estrada e muitos dormem ao relento.
"Há as mortes geradas pelos bombardeios e existem as
mortes que acontecem nos acampamentos – as últimas não são instantâneas, mas,
sim, a longo prazo", disse um deslocado que chegou
recentemente com sua família a um dos campos onde MSF trabalha.
"Sempre que os bombardeios se intensificam, novas
pessoas chegam", diz o médico de MSF no campo de Deir Hassan.
“A
maioria das pessoas não conseguem encontrar abrigo nas cidades para onde fogem,
então, são forçadas a armar suas tendas onde podem. Essas áreas estão tomadas
por tendas e, quanto mais perto você chega da fronteira com a Turquia, mais
tendas existem. Quem não tem condições de comprar uma tenda, divide com outras
famílias. Você também vê pessoas sentadas na beira da estrada e embaixo de
oliveiras, com cobertores. Algumas fugiram sem nada, apenas com as roupas
que estavam vestindo."
Em Idlib e Aleppo há inúmeros assentamentos
informais, onde a população deslocada vive em condições adversas, com pouca
proteção contra o frio durante o inverno. Na última semana, as temperaturas
caíram abaixo de zero e a neve intensa bloqueou estradas. Uma família de quatro
pessoas morreu de asfixia depois de usar combustível de baixa qualidade para manter
a tenda aquecida. "Nossa situação humanitária é péssima",
disse um pai à equipe de MSF durante uma distribuição em um campo. “Não há
aquecimento. Nem pão. Nem água. Estamos usando folhas de oliveiras para fazer
uma fogueira e nos aquecer. Nós precisamos de ajuda."
Não é nenhuma surpresa que a equipe médica da
clínica móvel de MSF tenha tratado muitos pacientes com infecções
respiratórias, por causa das condições de vida e do clima de inverno. As
equipes de Médicos Sem Fronteiras também prestaram assistência médica a um
número significativo de mulheres grávidas e crianças nas últimas semanas.
MSF também tem respondido às necessidades de
recém-chegados com distribuição de itens de primeira necessidade em diferentes
locais da província rural de Idlib. Desde o dia 1º de dezembro, equipes de MSF
distribuíram cobertores, roupas de inverno e kits de higiene para mais de 13
mil pessoas, em mais de 20 campos e assentamentos informais em Harim, Salqin,
Sarmadah, Killi e Maarat Misrin, além de fornecer materiais para ajudar as
pessoas a se aquecerem. MSF também está distribuindo água potável para dezenas
de milhares de pessoas nos campos. As necessidades da população deslocada são
enormes e, mesmo com as atividades de ajuda, MSF enfrenta dificuldades para
fornecer assistência de que necessitam.
Com a continuidade da ofensiva terrestre e dos
ataques aéreos, as pessoas estão constantemente em movimento. Alguns campos a
oeste de Aleppo foram evacuados entre os dias 15 e 16 de fevereiro. Alguns em
condições de pagar transporte seguem para o norte, em direção a Afrin e Azaz,
perto da fronteira com a Turquia; outros viajam distâncias menores. No entanto
não há certeza de assistência médica ou de outros serviços.
"A guerra já ocorre há quase nove anos",
diz o médico de MSF. "Mas, só neste ano, já enfrentamos o equivalente aos
nove últimos anos, se considerarmos todas as dificuldades que estamos vivendo.”
Sobre Médicos Sem Fronteiras
Médicos Sem Fronteiras é uma organização
humanitária internacional que leva cuidados de saúde a pessoas afetadas por
conflitos armados, desastres naturais, epidemias, desnutrição ou sem nenhum
acesso à assistência médica. Oferece ajuda exclusivamente com base na
necessidade das populações atendidas, sem discriminação de raça, religião ou
convicção política e de forma independente de poderes políticos e econômicos.
Também é missão da MSF chamar a atenção para as dificuldades enfrentadas pelas
pessoas atendidas em seus projetos.
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