Consumo indirscriminado de opioides preocupa
psiquiatras Divulgação |
Estudo da Fiocruz
aponta que uso de medicamentos sem prescrição médica está em segundo lugar no
ranking do consumo de substâncias que causam dependência; aumento do uso
indiscriminado de opioides preocupa psiquiatras
Amanhã (20 de fevereiro) é Dia Nacional de Combate
às Drogas. Nessa ocasião, muito se fala sobre o uso indevido de substâncias
como álcool, cigarro, crack e cocaína. Esses são certamente um sério problema
de saúde pública de ordem internacional que preocupa nações do mundo inteiro.
No entanto, a data também é uma oportunidade de
debater sobre a automedicação de substâncias que também promovem dependência,
tais como o uso de benzodiazepínicos, anfetaminas para emagrecer, indutores do
sono e analgésicos.
O 3º Levantamento
Nacional sobre o Uso de Drogas, coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) e divulgado em agosto do ano passado, apontou que o uso de
medicamentos está em segundo lugar no ranking do consumo de substâncias legais
e ilegais que causam dependência – perde apenas para a maconha.
O estudo é o levantamento nacional mais recente
sobre drogas realizados em território nacional. Participaram da pesquisa até
mesmo moradores de municípios de pequeno porte e de zonas de fronteira, por
exemplo. Os entrevistados foram questionados a respeito do uso e do abuso de
numerosas substâncias: tabaco, álcool, cocaína, maconha, crack, solventes,
heroína, ecstasy, tranquilizantes benzodiazepínicos (diazepam, clonazpam,
alprazolam), esteroides anabolizantes, sedativos barbitúricos, estimulantes
anfetamínicos, analgésicos opiáceos, anticolinérgicos, LSD, quetamina, chá de
ayahuasca e drogas injetáveis.
Os entrevistados responderam fazer uso dos
analgésicos opiáceos e dos tranquilizantes benzodiazepínicos. Nos 30 dias
anteriores à pesquisa eles foram consumidos de forma não prescrita, ou de
modo diferente àquele recomendado pela prescrição médica, por nada menos que
0,6% e 0,4% da população brasileira, respectivamente.
Outro estudo, encomendado ao Instituto DataFolha
pelo Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CFF), apontou que tomar
remédio por conta própria é um hábito comum de 77% dos brasileiros. Quase
metade (47%) afirmou se medicar sem prescrição médica pelo menos 1 vez por mês,
sendo que 25% dos entrevistados disseram que usam remédios sem a consulta de um
profissional uma vez por semana ou todo dia.
Para a psiquiatra Alessandra Diehl esse resultado
demonstra um padrão de risco e requer alerta. "A automedicação é um
fenômeno preocupante e bastante comum na nossa cultura. A busca de um alívio
imediato pode retardar um adequado diagnóstico e consequentemente uma resolução
adequada de um quadro clínico. Vivemos em uma sociedade que tem pressa e não
parece suportar qualquer dor e frustração. Acho que é muito dentro deste
contexto que as medicações prescritas podem gerar automedicação e abuso",
diz Alessandra.
Ela acrescenta que muito embora originalmente
comercializados como alternativas seguras aos benzodiazepínicos (os quais
conhecidamente causam dependência), há uma grande preocupação clínica em
relação ao uso do zaleplon, zolpidem e zopiclone ("drogas- Z") em
relatos científicos nos últimos anos. “Esse medicamento, que para muitos parece
inofensivo e visto como um aliado para driblar a insônia, possui efeito
sedativo e hipnótico. Muitos casos de uso indevido de zolpidem vem sendo
relatado na literatura até o momento. Na maioria deles, já havia um histórico
de abuso de álcool ou drogas. As pesquisas revelam que as pessoas que tomam o
medicamento podem ter sonambulismo, crescente prejuízo cognitivo, principalmente
de memória e, sobretudo, tolerância e consequente dependência”, afirma
Alessandra Diehl.
Diante das evidências científicas, o FDA, agência
reguladora de alimentos e remédios dos Estados Unidos da América (EUA), passou
a alertar a comunidade médica e aos pacientes sobre os efeitos colaterais dos Z
- compostos desde 2013. Deve-se tomar cuidado ao prescrever essas moléculas,
especialmente para pacientes com doenças psiquiátricas e / ou histórico de
abuso de drogas. “Recomendamos a necessidade de investir em atividades
pró-ativas de farmacovigilância para detectar, entender e melhor prevenir
prontamente qualquer possível potencial de uso indevido dos medicamentos
prescritos”, alerta Alessandra Diehl.
Na opinião dela, o aumento na prescrição de
opioides nos últimos anos também tem sido frequentemente associado à
utlilização dessa classe de medicamentos sem orientação médica. A carga
considerável para a sociedade imposta pelo uso indevido e abuso dessas drogas
se deve em grande parte aos custos monetários associados ao uso sem a
prescrição de um especialista, diminuição da produtividade econômica e efeito
indireto no acesso a cuidados de saúde adequados.
“O uso indevido de opioides é um importante
problema de saúde pública nos EUA e no Canadá, sobretudo em adolescentes e
adultos jovens. O uso indevido de medicamentos opióides está associado a
consequências evitáveis à saúde (por exemplo, depressão respiratória grave,
convulsões, insuficiência cardíaca e morte). Cerca de 14% dos adolescentes
norte-americanos fazem uso indevido de opioides. Adolescentes que relataram uso
indevido de opioides prescritos têm maior probabilidade de se envolver em uma
ampla gama de comportamentos de risco. Os prestadores de cuidados de saúde que
rastreiam o uso indevido de opioides prescritos podem estar em situação
privilegiada para identificar esses jovens de alto risco e iniciar intervenções
precoces. Os casos relatados no exterior servem de base para conscientizar a
população e os médicos brasileiros sobre a utilização indevida dos opioides”,
finaliza Alessandra Diehl.
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