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quinta-feira, 9 de abril de 2015

O desmatamento virtual e o real




Recentemente foi anunciado mais um relatório sobre o desmatamento na Amazônia, que continua a aumentar. Segundo dados da IMAZON (Fevereiro-2015) comparado com fevereiro de 2014, houve um aumento de 282% na área desmatada da Amazônia, região de onde continuam a sair grandes quantidades de madeiras cortadas ilegalmente.
Como sempre faz, o governo desmente a informação e alardeia outros números para mostrar avanços nessa área, tergiversa afirmando que se trata de metodologias diferentes.  E assim tudo caminha, com dados e informações seguidas de desmentidos que se repetem ano a ano.
Que o desmatamento continua de forma sistemática em todo Brasil não é difícil constatar. A imprensa regularmente aponta áreas em que o desmatamento ocorre ostensivamente; ONGs fazem o mesmo. Na área da Mata Atlântica, por exemplo, os aglomerados urbanos continuam a avançar sobre as áreas de floresta, dando lugar a sítios, chácaras, loteamentos e condomínios em todo o litoral.
O governo se esconde atrás de dados estatísticos. Mas de concreto, o que indica que ocorrerão mudanças em médio prazo? Quais propostas foram implementadas para se reverter a situação? Pois não basta combater o desmatamento, há que se recuperar inúmeras áreas destruídas que mantêm importantes ecossistemas e espécies ameaçadas de extinção. Isto implica em planejamento, seleção de sementes e de mudas, plantio, escolha de áreas, treinamento de pessoal, logística, enfim uma  gestão do processo de recuperação.
Por que não se envolve mais a população no monitoramento da situação em todo país? Comunidades que dependem da floresta podem se tornar excelentes aliados, mas tem que ser valorizados e ouvidos.  Incrementar o nível de informação sobre o papel das florestas para os estudantes de todos os níveis já seria outro grande passo, pois muitos deles desconhecem que tudo que consumimos – direta ou indiretamente -  têm origem no mundo natural, em particular das áreas florestais. Desconhecem que muitos objetos de consumo usual não existiriam se não existissem as florestas. Compreender esse vínculo é essencial para a realização de uma política de sucesso contra o desmatamento.
No plano global, há necessidade de aumentar a pressão sobre a União Europeia (UE), que é a principal consumidora de produtos derivados de áreas desmatadas. Segundo a ONG FERN (Em inglês fern, significa samambaia) países da UE importaram em 2012 cerca de 6 bilhões de euros em carne, couro, soja e óleo de palma extraídos de áreas desmatadas clandestinamente de países com grandes áreas de floresta. Destaca-se que neste número não está incluído o consumo de madeira, bastante expressivo.
Os países desenvolvidos sempre cobram medidas para proteger as florestas. Contudo continuam consumindo produtos de origem duvidosa.
Com o aumento da população do planeta, e o consequente aumento do consumo, enfrentar o desmatamento não é tarefa fácil, mas necessária. Exige que se avance do discurso para as ações concretas de grande envergadura. Há necessidade de se adotar políticas que ampliem o envolvimento da população, a partir das crianças sendo educadas compreendendo nossa imensa dependência do mundo natural, passando pela transparência das empresas varejistas na comercialização de produtos, certificando sua origem e, finalmente, com uma atuação mais consequente e firme no enfrentamento dos países desenvolvidos, que devem se responsabilizar pelo consumo de produtos de origem florestal duvidosa.
A floresta cumpre um papel relevante para a nossa existência no planeta. No mínimo é um regulador hídrico importante, além de cumprir função decisiva na absorção do CO2, um dos principais gases que provocam o efeito estufa. Ignorar isso é tentar tapar o sol com a peneira, ou melhor, considerar o desmatamento como um fenômeno virtual.

Reinaldo Dias - professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Campinas, mestre em Ciência Política e doutor em Ciências Sociais pela Unicamp.

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