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sábado, 11 de abril de 2015

BRASIL CARECE DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE PARA TRATAMENTO DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA




Ø  Estudos realizados no País destacam que 15% das crianças e adolescentes brasileiros possuem algum tipo de transtorno mental, como o autismo, e apenas 20% destes têm acesso a profissionais de saúde capacitados

Ø  Especialistas reunidos no Fórum Self Azul, promovido esta semana em São Paulo, destacam que diagnóstico e intervenção precoces são fundamentais para reduzir os impactos do transtorno do espectro autista ao longo da vida e no convívio familiar 
Realizado esta semana em São Paulo, o Fórum Self Azul, que reuniu alguns dos principais especialistas em autismo do País e do Exterior, trouxe à tona um dado preocupante: 15% das crianças e adolescentes do Brasil possuem algum tipo de transtorno mental, sendo que, a cada mil nascimentos, são registrados quatro casos de Transtorno do Espectro Autista (TEA). E mais: apenas 20% das crianças diagnosticadas com algum transtorno mental têm acesso a tratamentos com profissionais especializados.

“Há uma carência enorme de psiquiatras no País, principalmente com conhecimentos específicos em transtornos da infância e adolescência. Hoje, são apenas 500 profissionais com esta especialização atuando no Brasil”, alerta o médico Jair Mari, psiquiatra e coordenador do Programa de Pós-Graduação do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Ele destaca que, apesar do Brasil figurar na 13% colocação do ranking mundial de produção científica, respondendo por 2,7% das pesquisas na área de psiquiatria, há um descompasso entre o que a academia conquistou e as políticas de saúde pública.

Médico psiquiatra e presidente do Centro Pró-Autista (CPA) - entidade beneficente com parcerias internacionais e atuação nas áreas de assistência, ensino e pesquisa -, Wanderley Domingues, chama atenção para o fato das secretárias de saúde, ao invés de ampliarem as redes conveniadas, estão cortando os convênios estabelecidos com instituições especializadas no tratamento do autismo. “Serviços como o SUS não são suficientes e não têm qualificação para atender os pacientes portadores desse transtorno. É de extrema importância que se faça uma pressão social para que os órgãos públicos entendam este problema e deem continuidade aos convênios”.

Estima-se que atualmente no País haja mais de 2 milhões indivíduos portadores de autismo. Trata-se de um transtorno multifacetado e multifatorial, considerado o mais grave que atinge as crianças. Em 85% dos casos vem acompanhado de outras condições clínicas, como transtornos do sono e de ansiedade, déficit de atenção, entre outros.

“Quanto mais precoce for o diagnóstico e a intervenção, mais chances a criança tem de melhoras significativas na interação social, na linguagem e na capacidade cognitiva”, explica Domingues, acrescentando que a janela de 2 a 7 anos de idade é uma das faixas etárias mais importantes, pois é quando se desenvolvem o comportamento e a linguagem. “O autismo não é uma sentença”, reforça o especialista.

O psiquiatra Jair Mari acrescenta que o autismo, que é um transtorno do neurodesenvolvimento, possui um espectro de inteligência que varia desde a deficiência cognitiva até a super inteligência. “A Escola de Ciência Avançada para Prevenção de Distúrbios Mentais da FAPESP está desenvolvendo um programa específico para treinar pediatras para o diagnóstico e tratamento do autismo. Além disso, foi firmado um consórcio entre universidades para a realização do primeiro ensaio clínico do mundo relativo ao treinamento de pais para aquisição de habilidades sociais para interagir com filhos autistas. O objetivo deste estudo é produzir um vídeo que será fornecido em larga escala em todo o País”.

Como tratar o autismo
Coordenadora geral do CPA, a psicóloga Maria Clara Nassif, que acaba de lançar o livro “Livro: Neuropsicologia e Subjetividade”, enfatiza que está mais do que na hora de se abrir um campo definitivo para a causa do autismo no Brasil. “É fundamental que haja profissionais preparados para diagnosticar bebês de risco e fazer uma intervenção apropriada, evitando impactos dos transtornos ao longo da vida e no convívio familiar”.

Ela é uma das responsáveis pela aplicação no Brasil de um método de tratamento inovador do autismo, o Programa Abrangente Neurodesenvolvimental (PAN), que prevê diagnóstico e intervenção precoce, passando por todas as etapas de desenvolvimento até a idade adulta. Para isso, foi desenvolvido um protocolo de atendimento modulado de acordo com a complexidade de cada etapa de desenvolvimento.

Por se tratar de um transtorno originado a partir de alterações neurobiológicas, o autismo desencadeia uma desconexão cerebral. Por isso, o portador desse transtorno tem dificuldades de filtrar de uma vez os vários estímulos que recebe do ambiente. “Já é possível, por meio de exames como o eye tracking, diagnosticar o autismo em bebês por meio da orientação visual social atípica, ou seja, o bebê tem dificuldade de fixar a visão nos olhos de outra pessoa. A hipofunção característica do autismo na região do cérebro conhecida como ‘cérebro social’ também já pode ser detectada em exames de ressonância e PET”, conta Maria Clara.

Composto pelo tripé “Bio”, “Psico” e “Social”, o protocolo PAN adotado pelo CPA contempla programas de estruturação neurodesenvolvimental que levam em conta a idade e o estágio do paciente. As intervenções englobam terapias de troca e desenvolvimento individuais e em grupo, programas de habilidades sociais e até mesmo de inserção profissional. Em função das alterações neurofisiológicas na condução dos estímulos cerebrais, também é necessário o ajuste através de medicação, para proporcionar mais estabilidade para as crianças. “A estimulação do ambiente tem fundamental importância, já que pode modificar e ampliar as estruturas cognitivas”, frisa a especialista.

Mestre e pesquisadora da Université Paris Descartes na área de autismo e doenças com impacto neurocognitivo, a psicóloga francesa Marie-Hélène Plumet esteve no Brasil pela primeira vez para participar do Fórum Self Azul sobre autismo. Ela explicou que o cérebro do ser humano também se desenvolve em função das experiências, e que comunicar é uma das atividades mais complexas, por exigir ações sequenciais e sincronizadas. “Antes mesmo de ter a linguagem, o bebê típico, ou seja, que não possui o transtorno do espectro autista, já faz tudo isso”, acrescenta.

A psicóloga francesa destaca que, em função de ser alto o risco de casais que têm um filho autista terem um segundo filho com o mesmo transtorno, vem sendo amplamente difundida a importância de se fazer o diagnóstico e intervenção já na fase neonatal. Até os 8 meses de idade, o bebê típico passa a conseguir distinguir os rostos humanos, entender movimentos gestuais e, a partir dos 9 meses, começa a interagir com o mundo e a compreender o outro. Já nos bebês autistas, essas competências são comprometidas, já que o processamento cerebral é pouco integrativo.

“Em crianças normais, partes diferentes do cérebro são ativadas ao olhar pessoas e objetos. Já nas crianças autistas, a mesma região cerebral é ativada e há uma alternância entre hipo e hiper-reações sensoriais. Daí a dificuldade de distinguirem emoções e sons”, detalha Marie.

Sobre a Iniciativa Self Azul  
Promovida pela Guardian, uma das maiores fabricantes de vidros e espelhos do mundo, juntamente com o Centro Pró-Autista (CPA), a iniciativa Self Azul foi criada com o objetivo de discutir, conscientizar e sensibilizar empresas, sociedade civil e órgãos governamentais sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA), cujo diagnóstico ainda é difícil e demorado porque muitas famílias, e inclusive profissionais de saúde, desconhecem os sintomas.

Lançado durante a Virada da Saúde, que acontece em São Paulo até o dia 12 de abril, o Self Azul engloba ações que incluem uma instalação artística composta por esculturas de espelho, assinada pelo artista plástico Eduardo Srur, e a realização, no dia 9 de abril, de um fórum na sede da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), entidade que também é apoiadora da iniciativa. O evento contou com a participação de mais de 300 pessoas de diversas partes do País.
Composta por seis esculturas de espelho, a obra de Srur está em exposição no vão livre da FIESP e nas estações de Metrô Paraíso e Trianon-Masp. Na FIESP, duas peças foram instaladas em uma espécie de uma sala de espelhos, um convite aos transeuntes da Avenida Paulista para compartilharem uma experiência estética e de conhecimento sobre o complexo universo do autista.

Sobre o Centro Pró-Autista
Fundado em 4 de abril de 2000, o Centro Pró-Autista atende pacientes de todo o Brasil, juntamente suas respectivas famílias, prestando serviço de diagnóstico e indicações terapêuticas para cada perfil de paciente com autismo. Realiza ainda tratamento terapêutico multidisciplinar em seu ambulatório, no centro de atenção diária e nas oficinas, utilizando técnicas de trabalho de padrão internacional.

Sobre a Guardian
Fundada em 1932 em no estado de Michigan (EUA), a Guardian é uma das maiores fabricantes de vidros e espelhos do mundo. A companhia está presente em mais de 25 países, entre eles o Brasil, onde mantém duas fábricas, uma em Tatuí (SP) e outra em Porto Real (RJ), e possui um Centro de Distribuição em Fortaleza (CE).

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