A Lei Maria da Penha, criada em 7 de agosto de 2005 com o
objetivo de proporcionar às mulheres diversas medidas protetivas, de urgência e
assistenciais diante de casos de violência doméstica.
A advogada especialista em direito de família, Regina
Beatriz Tavares da Silva, afirma que a lei é efetivamente um marco no combate à
violência doméstica contra a mulher, porém precisa ser realmente bem
interpretada para que os culpados sejam sempre penalizados corretamente.
Contudo, os números ainda não refletem o sucesso da lei. Segundo o Mapa da
Violência, divulgado em 2015 pela Faculdade Latino-Americana de Ciências
Sociais (Flasco), o Brasil ocupa o 5º lugar, dentre os 83 países com maior
número de ocorrências de homicídios femininos.
Mesmo com uma década de existência, muito se tem a entender
sobre quais os casos de violência doméstica são auxiliados pela justiça e há
ainda acontecimentos pouco divulgados, assim como:
Relacionamento homoafetivo
Em casos de casais de mulheres em um relacionamento homoafetivo
a Lei deve acontecer do mesmo modo, o direito tem que ser igualmente aplicado.
A Lei Maria da Penha visa coibir qualquer tipo de violência doméstica e
familiar, independente da orientação sexual.
A lei garante proteção a todas as mulheres e pode ser
aplicada igualmente às mulheres homossexuais. No entanto, no meu modo de ver,
todos os que são efetivamente vulneráveis deveriam estar incluídos na proteção
da Lei Maria da Penha, cite-se, a propósito, o homossexual masculino mais
fragilizado na relação homoafetiva.
Transexuais
A lei trata da mulher como “gênero feminino”, portanto,
transexuais, que tenham se submetido a cirurgia de mudança de sexo, enquanto
pertencentes ao grupo feminino, havido como vulnerável, devem receber proteção
judicial e serem acolhidos por esse ordenamento. Isso fica muito claro quando
lemos os artigos 2º e 5º da lei, que veda qualquer forma de discriminação em
razão da orientação sexual.
A Lei Maria da Penha visa repelir a violência de gênero,
decorrente de uma posição de hipossuficiência física ou econômica, no âmbito da
unidade doméstica, da família ou de qualquer relação íntima de afeto, a qual
gera uma situação de opressão da vítima. No entanto, já que essa lei somente
considera vítima a mulher, não oferece proteção aos homossexuais masculinos, o
que nos parece errado, assim como é equivocado o conceito legal que
desconsidera os filhos homens de menor idade e outros homens que são
efetivamente vulneráveis.
Tribunais de 5 estados já concederam os direitos da lei
Maria da Penha para transexuais, a decisão mais recente aconteceu esta semana.
Um Juiz de Direito do estado do Acre, interpretou um caso de violência
doméstica contra uma transexual dentro da Lei Maria da Penha. Nestes
casos deve sempre prevalecer em primeiro lugar o princípio da dignidade da
pessoa humana, presente no artigo 1º, inciso III da nossa Constituição Federal.
Não podemos tolerar nenhum tipo de violência. Tramita na Câmara dos Deputados o
Projeto de Lei 8032/14 de autoria da Deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que
estende a pessoas transexuais e transgêneros que se identifiquem como mulheres
a proteção da Lei Maria da Penha.
Mulheres que apanham de desconhecido
A Lei Maria da Penha é aplicável em casos de agressões
contra a mulher em qualquer idade, inclusive quando é menor e sofre violência
doméstica praticada por seu genitor, tendo como elemento comum a caracterização
de relação familiar ou de afeto entre o agressor e a vítima. Ou seja, a Lei age
em prol da mulher em casos que envolvam o marido, o companheiro, o pai, irmãos,
ex-namorados e, até mesmo, em relação à cunhada.
Não sendo possível sua aplicação em caso de agressões contra
homens, como pretenderam alguns. Isso porque é a
mulher a
parte mais fisicamente vulnerável desta relação afetiva, o que é comprovado
pelas diversas estatísticas sobre o assunto.
Menores de idade agredidos
Neste ponto as medidas protetivas presentes na Lei Maria da
Penha são fundamentais para garantir a proteção das crianças, mas somente as do
sexo feminino. Entre as sanções estão: possibilidade de suspensão do direito de
visitas do pai à criança, bem como de seu afastamento do lar, de proibição de
contato ou de frequência aos locais onde esteja a criança, estas são
ferramentas extremamente eficazes para que as vítimas crianças não fiquem mais
sujeitas à situação de risco em que se encontravam até então.
A lei pode valer em caso de violência da mãe contra filha e
da filha contra mãe. O que é necessário para a sua aplicabilidade é que a
vítima da agressão seja do gênero feminino.
Homens vulneráveis
Existem casos em que a mulher é sim mais forte e detentora
do poder dentro do relacionamento. Em casos como esse, o homem não é acolhido
pela Lei Maria da Penha. Contudo, ele pode registrar a violência por meio dos meios
tradicionais.
Nos últimos anos, tem-se presenciado casos de abuso na
utilização da Lei de Combate à Violência Doméstica por algumas mulheres que
desrespeitam o conteúdo dessa lei. Automutilações por vezes são realizadas para
demonstrar violência doméstica inexistente. Gritos sem causa real são gravados
por mulheres para fingir que estão sofrendo ameaças de violência. Provocações
contra o homem para que ele agrida a mulher, infelizmente por vezes também
ocorrem.
Há mulheres que chegam a seduzir o marido em estado de
semiembriagues, provocando relações sexuais, para gravarem-nas e fingirem que
foram estupradas, tudo com o fito de incriminarem o marido, chegando a gritar
no meio da relação sexual para demonstrarem a violência, que na verdade não
existiu.
Mulheres de menor poder aquisitivo
As mulheres que sofrem violência doméstica e que estão na
classe menos favorecida economicamente são, muitas delas, aquelas que sustentam
a casa, o que torna ainda mais espantoso que se submetam a esse tipo de
agressão masculina. Namoradas e ex-namoradas, mesmo sem a constituição de
relação de família, também estão incluídas na proteção da Lei Maria da Penha,
como já reconheceu o Superior Tribunal de Justiça. Não são só os companheiros e
os cônjuges que podem ser apenados pela Lei Maria da Penha.
A especialista também responde dúvidas gerais sobre como atuar em
casos de violência doméstica:
Qual é a função da Delegacia da Mulher? Qualquer mulher agredida
pode recorrer ou somente aquelas que foram agredidas por companheiros?
A função da Delegacia da Mulher é a de prestar o melhor
atendimento às vítimas de agressão moral ou física, aqui incluída a sexual,
assegurando proteção à população feminina vítima de violência em casa.
Importante ressaltar que atendem somente mulheres vítimas de violência
doméstica. Todos os demais casos de crimes cometidos contra a mulher são de
competências das delegacias comuns.
O que deve ser feito após sofrer a agressão?
A vítima deve ir o mais rápido possível a uma Delegacia
da Mulher e relatar o ocorrido, para se evitar a prescrição dos crimes.
Situações antigas de agressão tornam-se cada vez mais difíceis de serem
comprovadas com o passar do tempo. No local, será orientada sobre o que fazer
em seguida.
Em caso de estupro é importante, se possível, não jogar as
roupas fora e leva-las à delegacia quando for relatar o ocorrido. Se for
necessário, haverá o encaminhamento para atendimento hospitalar.
Se o autor da agressão for um desconhecido, é importante
guardar os traços e a fisionomia do agressor, a roupa que utilizava, bem como
outros detalhes relevantes que ajudem na sua identificação.
O que a mulher agredida tem direito?
A Constituição Federal, em seu art. 226, parágrafo 8º,
dispõe que o Estado deve criar mecanismos para coibir a violência no âmbito de
suas relações. Entre as medidas de urgência e assistenciais estão o afastamento
do suposto agressor do lar ou local de convivência com a vítima, a fixação de
limite mínimo de distancia, suspensão da posse ou restrição do porte de armas,
dentre outras.
O que pode ser considerado violência doméstica?
De acordo com a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha),
configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou
omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual
ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
Quanto tempo a mulher tem para fazer a denúncia?
O tempo dependerá do prazo prescricional de cada crime
cometido contra a mulher, mas a recomendação é de que a faça rapidamente, tanto
pelas marcas corporais que precisam ficar evidenciadas no processo, quanto para
evitar a continuidade das agressões, por meio das medidas protetivas.
Regina Beatriz Tavares da Silva - Pós-Doutora em Direito da
Bioética pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa - FDUL (2013).
Doutora (1998) e Mestre (1990) em Direito Civil pela Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo - USP. Graduada em Direito pela Universidade
Presbiteriana Mackenzie (1979). Presidente e Fundadora da Associação de Direito
de Família e das Sucessões - ADFAS (www.adfas.org.br).