A obesidade infantil é considerada um
dos maiores problemas de saúde pública pediátrica, afetando cerca de 224
milhões de crianças em todo o mundo
O Brasil passou por um fenômeno
interessante nos últimos 50 anos em se tratando de nutrição infantil. O país
saiu de um quadro onde a desnutrição era o maior desafio familiar para um
momento em que o excesso de peso extrapola aquela antiga associação de crianças
gordinhas à saúde e se junta ao cenário pandêmico mundial da Obesidade
Infantil.
De acordo com o IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística), pesquisa realizada em 2019 indicou que
16,33% das crianças brasileiras entre 5 e 10 anos se enquadram na categoria de
obesidade, definida pela OMS (Organização Mundial de Saúde). “Só no Brasil estima-se que quase 7 milhões de
crianças apresentam excesso de peso e segundo o Ministério da Saúde viu-se que
uma em cada 10 crianças brasileiras de até 5 anos está com o peso acima do
ideal: são 7% com sobrepeso e 3% já com obesidade”, relata a nutricionista,
pós-graduada em Nutrição Funcional e CEO da CalcLab (plataforma que faz leitura
diagnóstica de exames laboratoriais), Karla Lacerda.
A obesidade infantil é
considerada um dos maiores problemas de saúde pública pediátrica, afetando
cerca de 224 milhões de crianças em idade escolar em todo o mundo. As
tendências pós-anos 2000 previram um mundo onde, pela primeira vez, haveria
mais crianças e adolescentes obesos do que com baixo peso. Segundo a OMS sua
prevalência é crescente e se atribuí a fatores políticos, econômicos, sociais,
culturais, genéticos, ambientais e comportamentais.
A luta
O desafio da atualidade é trazer atenção e conscientização da sociedade
para esse alerta, promover diálogo e visibilidade sobre a relevância e o
impacto dos hábitos de vida na saúde dos pequenos.
De acordo com a
nutricionista, a obesidade é uma condição complexa, multifatorial e
pró-inflamatória que está associada à uma combinação de fatores incluindo a
exposição das crianças a um ambiente que estimula a ingestão de alimentos
densamente calóricos, o sedentarismo, o excesso de telas e suas respostas
biológicas a esse ambiente.
“Antigamente, a
obesidade era um problema quase que exclusivamente de adultos, mas aos poucos
foi se estendendo a faixas de idades cada vez menores, chegando hoje inclusive
a acometer gravemente crianças menores de 5 anos”, relata Karla.
Ela ainda observa que
a partir dessa informação é possível fazer uma previsão sobre os adultos do
futuro, pois atualmente as doenças advindas da obesidade já atingem crianças
cada vez mais novas apontando para perspectivas de adultos mais doentes.
“Inclusive, a Sociedade Brasileira de Pediatria relembrou uma previsão
sombria da OMS, que antevê que em 2030, o Brasil pode ser o quinto país com o
maior número de crianças e adolescentes obesos. Se nada for feito, a
possibilidade de reverter a projeção é de somente 2%”.
De acordo com o Estudo
Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil recente, 80% das crianças
brasileiras de até 5 anos consomem alimentos ultraprocessados, como bolachas
recheadas, o que também é observado entre bebês com menos de 2 anos.
Karla explica que um momento muito
determinante para essa situação é a gestação, pois já é sabido que a nutrição
inadequada da mãe e o excesso de peso já influenciam o perfil alimentar do bebê
que ainda nem nasceu. “Outro problema identificado pelos especialistas é a
desobservância e descumprimento da exclusividade do aleitamento materno até os
seis meses de idade, inserindo a criança no ambiente de alimentação não
saudável mesmo antes dela estar apta a comer e introduzindo industrializados e
ultraprocessados já durante os primeiros meses de vida”.
A nutricionista
ressalta a importância da família se atentar aos riscos dos alimentos
ultraprocessados. Mesmo este modelo de alimento apresentar maior durabilidade,
e atenderem a demanda alimentar fast food impulsionada pela falta de tempo da
vida moderna, eles não devem fazer parte da rotina alimentar uma vez que
apresentam elevadas quantidades de açúcar, sal, gordura trans e aditivos
químicos que podem ser prejudiciais à saúde.
“Já está mais que
comprovado que o consumo regular de ultraprocessados como sorvete, suco de
caixinha, biscoitos recheados, macarrão instantâneo, achocolatados, bolos
industrializados, embutidos, por exemplo, é uma das fortes razões do ganho de
peso excessivo na infância e essa tendência de consumo é o reflexo do impacto
do marketing e políticas permissivas sobre alimentação infantil”.
Na prática, explica
Karla, para uma melhor visualização e entendimento dos pais uma criança que tem
seu peso 25% maior que o desejável para sua idade, já apresenta sobrepeso, que
é um primeiro alerta para a obesidade. “Quando o peso está 30% acima, ela já é
considerada obesa. Ambas as condições podem favorecer a doenças como diabetes,
hipertensão, hipercolesterolemia, depressão, câncer e doenças cardiovasculares.
O aumento de peso entre os pequenos hoje resultará em um
aumento significativo no futuro nos custos da saúde”.
Há de se colocar na
balança a pandemia da Covid-19 que ainda agravou a situação quando causou uma
interrupção abrupta e significativa na rotina das crianças, aumentou o
sedentarismo e teve impacto negativo na saúde mental e bem-estar, pois, sem
espaço para gastar energia propiciou ambiente ideal para ter tempo de folga com
os eletrônicos e suas estratégia agressivas de marketing.
Decisão
Diante desta situação
faz-se, necessário pôr em prática ações que favoreçam a melhora desse quadro e
pensando nisso o primeiro passo é identificar que a criança está acima do peso.
“Essa é a maior dificuldade dos pais ou responsáveis, pois normalmente,
identificam apenas quando as crianças já estão muito obesas ou já apresentam
doenças advindas do excesso de peso. Os adultos tendem a não dar tanta atenção
ao fato de a criança estar gordinha até que isso vire um problema grave de
saúde”.
A nutricionista ainda instiga a
família, como um todo, a mudar os hábitos pois a criança repete o que ela vê os
adultos a sua volta fazendo, então se todos se sentam a mesa, sem telas, com
alimentos saudáveis, se é um momento tranquilo e bom a criança replicará esse
comportamento e desenvolverá uma relação melhor com a comida. Isso inclusive
está no guia alimentar para a população brasileira, que orienta comer com
atenção em ambiente tranquilo e sempre que possível em companhia.
“Além disso, criança precisa ter rotina. A rotina é
uma segurança para a criança e permite que ela se desenvolva melhor num
ambiente seguro, onde ela está ciente das atividades que vão acontecer no dia
da família, incluindo seu momento de brincar, de estudar, de comer, de dormir,
gerando menos tensão e estresse na hora de concluir as tarefas”.
Uma última dica de Karla é incluir a
criança já desde bem pequena nas compras da feira e na produção da alimentação,
dando oportunidade para que ela conheça e escolhas os vegetais, frutas,
legumes, hortaliças que vão compor o cardápio da semana.
“As estratégias preventivas provaram
ser a intervenção de saúde pública mais eficaz para conter esta pandemia. Uma
abordagem multidisciplinar envolvendo modificação da dieta e implementação de
um estilo de vida saudável, incluindo atividade física regular, minimizando o
tempo de tela e intervenções comportamentais, foi considerada a mais benéfica
na prevenção da obesidade”, finalizou.
CalcLab