O ano mal começou e o mundo assistiu estarrecido mais uma
cidade brasileira ser arrebatada por um imenso mar de lama, que assassinou
pessoas, destruiu casas, dizimou animais e detonou o meio ambiente. A visão de
Brumadinho (MG) debaixo dos rejeitos da Vale é desconcertante. E depois de
assistir inúmeros vídeos da tragédia e ouvir relatos das vítimas, fica difícil
de acreditar que a palavra da moda no Brasil seja “transparência”.
Ela está no discurso de todos os agentes da sociedade:
governo, iniciativa privada, ONGs e até mesmo da própria população, que clama
por mais clareza e idoneidade nas relações. Porém, a prática é bem diferente.
Se a retórica usa e abusa de jargões como protagonismo, sustentabilidade,
transparência e reinvenção, na hora do vamos ver os processos são sempre os
mesmos e as vítimas também.
O que observamos é que o Brasil de hoje permanece o mesmo
há décadas, apesar do potencial de inovação existente em todos os setores. A
famosa onda de conservadorismo se estende também para dentro da maioria das
empresas, que mantém regras, métodos, culturas e costumes que não atendem mais
às necessidades de uma sociedade cada vez mais digital e reivindicadora.
Vejamos o caso de Brumadinho. Depois das vidas perdidas e
da destruição, o Ministério do Desenvolvimento Regional pediu que órgãos e
entidades de fiscalização fizessem um pente fino nas condições das barragens e
avaliassem imediatamente a necessidade de remover instalações que coloquem
pessoas em risco. Obviamente, este trabalho deveria estar sendo feito há muito
tempo, de maneira consistente.
Certificações ambientais, licenças, auditorias e
governança em dia: desde o acidente em Mariana (MG), em 2015, já era sabido que
a forma como esses documentos são emitidos não era das mais eficientes. Enfim,
nunca se pensou em uma nova forma de fiscalizar e cobrar das empresas e também
das certificadoras a famosa transparência, embora existam meios para tal.
Ao ver a quantidade de lama que invadiu o Brumadinho, as
pessoas desabrigadas e os animais em agonia, pergunto-me porque ninguém pensou
em pesquisar tecnologias capazes de controlar a segurança desses locais. Por
que ninguém pensou em um controle distribuído, onde as informações não ficassem
apenas concentradas dentro de uma certificadora ou empresa, dependendo do aval
de um único fiscal. Por que ninguém enxergou como o Blockchain poderia ser uma
tecnologia alternativa para garantir mais segurança, agilidade e rapidez em
tempo real, fazendo com que as decisões fossem compartilhadas e demonstradas
por todos aqueles que desejam pesquisar.
Apesar das denúncias de que a barragem de Brumadinho
representasse um risco desde 2015, foram quatro anos seguindo os mesmos padrões
de certificações, com licenças ambientais carimbadas em um papel timbrado e
guardadas dentro de uma gaveta, não se sabe de quem e em quais circunstâncias.
Defendo o Blockchain como um novo ecossistema
descentralizado e transparente, para ser utilizado por todos que desejam
quebrar paradigmas e impactar positivamente a sociedade, libertando as amarras
de processos burocráticos tradicionais em nosso País. Se a necessidade de um
novo Brasil passa pela redefinição cultural de todos os agentes, e
principalmente pela criação de uma nova forma de compliance, o Blockchain pode
ser a tecnologia disruptiva capaz de assumir esse papel e muito mais. É como um
ponto de luz em meio à escuridão.
Obviamente, novas tecnologias e processos requerem estudo,
capacitação, investimentos, profissionais engajados e empresas dispostas a
mudar suas tradições e encarar desafios impostos pela jornada. Mas se esse é o
preço a ser pago para manter vidas a salvo, acredito que vale a pena.
A verdade é que já existem maneiras de colocar um ponto final em
entraves burocráticos e nebulosos, que interessam apenas a um grupo de pessoas.
Mas é preciso envolvimento dos tomadores de decisão e vontade política para
fazer uma transformação acontecer. Enquanto isso Brumadinho e o restante do
Brasil sente o gosto amargo das palavras bonitas que estão longe de transmitir
seu real significado.
Arthur Miranda - colaborador da GOBlockchain.