O esporte pode ser
uma metáfora poderosa para ser utilizada perante desafios organizacionais
Fui uma criança muito tímida. Tinha grande
dificuldade de falar em público, hesitava em me aproximar de outras pessoas e
mal conseguia encarar os adultos quando conversavam comigo. Tanto que, depois
de formado, foi uma surpresa para todos que me conheciam me verem trabalhando
com gestão de pessoas, extrovertido, sociável e ministrando palestras, algumas
vezes para milhares de pessoas. O que me ajudou a me relacionar com o mundo?
Entre alguns fatores, certamente o esporte.
Na infância e na adolescência, encontrei nas
quadras a melhor maneira de fazer amizades e criar vínculos. Ao que me lembro,
nunca fui o melhor jogador, mas certamente jogava feliz basquete, handebol e
futebol. A máxima que a genialidade vem 1% da inspiração e 99% da transpiração
sempre funcionou para mim, por isso me dedicava às atividades com muita
intensidade. Mudei de Ribeirão Preto para São Paulo, me graduei em
administração de empresas e entrei para o mundo corporativo, sempre carregando
os valores que aprendi no esporte.
Muitos dizem que o ambiente corporativo pode ser
comparado a uma família, mas para mim se aproxima mais muito mais a uma equipe
esportiva. Afinal, o esporte pode funcionar como uma metáfora poderosa sobre a
natureza humana e seus desafios. E, em meio a ótimas séries sobre atletas
lançadas recentemente, como a “Arremesso Final", sobre o Chicago Bulls dos
anos 1990 e “Lakers: Hora de Vencer”, sobre a equipe de Los Angeles, a
"Man in The Arena", sobre o New England Patriots, exemplifica bem
isso.
A trajetória dos atletas do Patriots capitaneados
contém todos os elementos para fazermos um paralelo sobre a importância da
cultura criada nas equipes – e como ela pode fazer uma enorme diferença nos
períodos difíceis. E, como não poderia ser diferente, o foco está no Tom Brady,
reconhecido por muitos (e por mim) como o melhor quarterback
(aquele responsável por armar as jogadas) de todos os tempos.
A premissa de Bill Belichick, o técnico que ganhou
três Superbowls com o Patriots no intervalo de quatro anos, era:
nenhum homem é maior do que o time. Esse lema fazia tanto sentido que, muitas
vezes, ele tomou decisões impopulares. Em 2021, por exemplo, ele foi duramente
criticado quando deixou o quarterback Drew Bledsoe, no banco, mesmo depois de
recuperado de uma grave lesão.
No lugar ele manteve Brady, então o novato
desconhecido. O surpreendente é que, mesmo se sentindo pronto para entrar na
arena, Drew apoiou Brady e o time em todos os jogos nos quais esteve no banco,
inclusive na vitória do Superbowl. No mundo corporativo,
vemos colaboradores de destaque que não têm essa maturidade quando não são
convocados para uma tarefa importante e decisiva. Em muitas situações, se transformam
em competidores ( ou adversários), esquecendo que estão disputando o mesmo
campeonato.
Apresentam esse espírito de equipe aqueles que têm
bem internalizados o propósito e a cultura organizacional da companhia, e esse
é o principal desafio de um gestor. Brady incorporou a cultura do Patriots
desde que entrou no time, em 2001. Nos relatos de companheiros, ele é descrito
como humilde, motivado e com um controle emocional acima da média.
E a inteligência emocional está à6 frente entre as
habilidades mais procuradas pelas empresas, de acordo com a pesquisa
Inteligência Emocional e Saúde Mental no Ambiente de Trabalho*, feita no Brasil
pela Robert Half com a The School of Life, e publicada em
2021. O estudo aponta que 55,74% dos líderes priorizam o comportamento/inteligência
emocional à formação acadêmica e aos certificados no momento da contratação. E
mais: 45,95% acreditam que é a inteligência emocional que mais gera lucro para
os negócios.
Tom Brady admite na série que não tinha o melhor
preparo físico ou habilidade quando ganhou seu primeiro campeonato na NFL. Isso
ele aprimorou ao longo dos anos. Mas tem certeza de que sua força mental foi
determinante para permanecer como o principal quarterback do time, com apenas
24 anos.
Aqui, faço também um paralelo com o Michael Jordan,
do Chicago Bulls, e o Kobe Bryant, que jogou no Los Angeles Lakers até falecer
em 2020. Phil Jackson, único coach (sim, coach) a ter treinado essas duas
lendas do basquete explica no livro “Onze Anéis” que, como Brady, a principal
semelhança dos dois era a força mental e a obstinação.
É também nos momentos de dificuldades que a cultura
de um time, ou de uma empresa, é colocada à prova. Depois de uma derrota ela
entra em ação para reerguer os atletas, identificar as falhas, resetar
estratégias e comportamentos, assim como traçar novas metas. É papel dos
líderes lembrá-los que eles têm um objetivo comum maior, e isso só funciona com
uma cultura organizacional que toque corações, refletindo de fato os valores
das pessoas envolvidas.
A escola do esporte ajudou a formar a pessoa e o
profissional que sou hoje e me inspira como gestor de RH da Dasa. Assim como a
arte, a música e a literatura, acredito que é um caminho que ajuda a
compreender o mundo. E na formação de líderes, é importante ver que trajetória
de um time glorioso vai além da vitória ou da derrota: ela está relacionada a
conhecer quem você é, onde você está e com quem você pode contar, celebrar,
aprender e chorar.
Venâncio Guimarães - Diretor
de Produtos- Pessoas e Cultura da Dasa
ROBERT HALF E THE SCHOOL OF LIFE. Inteligência
Emocional e Saúde Mental no Ambiente de Trabalho. https://www.roberthalf.com.br/sites/roberthalf.com.br/files/documents/Inteligencia%20Emocional%20e%20Saude%20Mental_RH%20e%20TSOL_set2021.pdf
Acesso em 6 de julho de 2022.