Filme à base de
algas e nanocelulose criado na UFSCar é seguro ao meio ambiente, reduz a perda
de nutrientes e pode substituir o uso de microplástico na agriculturaO filme biodegradável foi usado para moldar vasinhos
com 4 cm de altura por 3,5 cm de diâmetro
foto: André Felipe Silverio Neubern
Pesquisadores da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) desenvolveram, em parceria com um
produtor de antúrios de Holambra, no interior de São Paulo, um filme à base de
algas e nanocelulose que substitui, com vantagens, o material importado usado
pelo agricultor como recipiente para reproduzir a planta. Isso porque o filme
criado pelos brasileiros é capaz de liberar fertilizante lentamente no
substrato. Com adaptações, poderá ser utilizado na reprodução de diversas
culturas, além do ornamental antúrio.
“No caso do
antúrio, nosso parceiro usa um recipiente fabricado por uma empresa estrangeira
para reproduzir o tecido vegetal em laboratório. Essa empresa produz um papel e
uma máquina. Outros empreendedores compram o papel e a máquina e fornecem esses
vasinhos que, segundo ele, são muito caros”, explica à Agência FAPESP Claudinei Fonseca Souza,
do Grupo de Pesquisa em Engenharia de Água, Solo e Meio Ambiente da UFSCar, no
campus de Araras.
Em busca de um
diferencial em relação ao produto importado, a equipe da UFSCar teve a ideia de
usar a carragena (substância extraída de algas vermelhas) e o alginato (obtido
de algas marinhas marrons) como meio para armazenar um fertilizante, o MAP
(fosfato monoamônico, composto químico de fórmula NH₄H₂PO₄), amplamente empregado em diversas culturas.
“O desafio na
utilização de polímeros como a carragena e o alginato está na obtenção de
materiais com resistência, já que eles tendem a se dissolver rapidamente em
contato com a água. Por isso, adicionamos nanofibras de celulose ao material,
em diferentes concentrações, na expectativa de melhorar suas propriedades
mecânicas, físicas, químicas e térmicas”, conta o pesquisador.
Assim, a equipe
obteve um filme com o qual moldou vasinhos (de 4 centímetros de altura por 3,5
cm de diâmetro) que podem substituir aqueles tradicionalmente usados na
reprodução da planta.
“Esse filme tem de
manter a estrutura da planta, mas não pode oferecer resistência ao sistema
radicular. Ou seja, tem de ser resistente, mas não muito. Por isso, fizemos o
teste agregando de 1% até 5% de nanocelulose ao material. Obtivemos o melhor
resultado com 4%. Nossa intenção agora é patentear o material e partir para
testes com outras culturas”, adianta Souza.
Ele ressalta que a
raiz tem dupla importância para a planta: primeiro, de suporte, e segundo na
absorção de água e nutrientes. “Ao conceber o material, não podemos esquecer de
nenhuma delas. A partir desse filme com 4% de nanocelulose, passamos para o
teste em campo, que ainda não foi publicado. Usamos uma técnica que consegue
dar uma ideia do material liberado a partir da condutividade elétrica do solo.
Fizemos também um teste de degradação. A cada 30 dias íamos até Holambra,
coletávamos as plantas e fazíamos uma avaliação. E observamos que o material
desaparece após 90 dias.”
De acordo com
Souza, a liberação dos nutrientes acontece por diferença de potencial entre o
material enriquecido com fertilizante e o substrato da planta, que não contém a
substância.
“Estamos testando
numa condição real, no campo, fazendo igualzinho o agricultor. Com amparo,
portanto, da agronomia. Há técnicas pelas quais se consegue monitorar a
liberação do material quase em tempo real.”
O trabalho, publicado na
revista Cellulose, teve apoio da FAPESP por meio de Auxílio à Pesquisa Regular concedido
à professora Roselena Faez, segunda autora do artigo.
Vantagens
Em laboratório, os
cientistas fizeram placas de 10x20 centímetros do material em uma impressora 3D
de filamentos ABS (resina termoplástica derivada do petróleo, obtida a partir
da combinação de três monômeros: acrilonitrila, butadieno e estireno). Depois,
enrolaram o filme em um gabarito de aço redondo e colaram para formar os
vasinhos.
“Nessas placas,
conseguimos fazer umas ranhuras que facilitam a saída das raízes. E a própria
raiz, depois que vai crescendo, faz uma espécie de reforço do material”, diz
Souza.
Para ele, é
perfeitamente possível produzir o filme em grande escala, pois o Brasil tem
facilidade de acesso a algas e é o maior produtor de celulose do mundo. “Só
que, para chegar em escala, precisamos desenvolver essa parte final, analisar
os resultados do trabalho de campo e patentear o material. Estamos procurando
matérias-primas que existam em abundância e tenham preço bom, porque não
adianta nada desenvolver um filme excelente e muito caro, que não chega ao agricultor.”
Souza ressalta que
o filme à base de algas e nanocelulose tem diversas vantagens: promove a
economia de fertilizante, pois há menos perda por lixiviação (a alga segura os
compostos, que não são levados pela chuva ou irrigação) e pode evitar a utilização
de plástico, pois o filme também se presta a substituir as esferas de
microplástico usadas pela agricultura em larga escala para liberação de
fertilizantes. “Utiliza-se a mesma técnica de inserção de fertilizante nas
esferinhas de plástico, só que nosso material é biodegradável. Depois de 90
dias, ele praticamente desaparece.”
O artigo Enhancing
marine algae composites with cellulose nanofibrils for sustainable nutrient
management pode ser acessado em: https://link.springer.com/article/10.1007/s10570-024-05947-0#Ack1.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/material-libera-fertilizante-para-plantas-de-forma-controlada-e-se-degrada-apos-90-dias/52804
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