C. difficile é uma bactéria que causa infecção intestinal, principalmente após o uso de antibióticos. Estima-se que afete quase meio milhão de pessoas nos Estados Unidos a cada ano (imagem: CDC) |
Camundongos que não produziam a molécula conhecida como IL-22BP apresentavam defesas fortalecidas, relatam pesquisadores em artigo publicado na PNAS. Entendimento sobre o papel da proteína na saúde do intestino abre caminho para novas estratégias terapêuticas
Estudo publicado na revista Proceedings
of the National Academy of Sciences (PNAS) revela como a presença de
uma proteína específica – chamada IL-22BP – afeta o equilíbrio intestinal e
regula a resposta do corpo a infecções bacterianas.
“Descobrimos que camundongos
que não produzem essa proteína estão mais protegidos contra infecções
intestinais por bactérias como Clostridioides difficile e Citrobacter
rodentium”, conta à Agência FAPESP Marco Vinolo, professor do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de
Campinas (IB-Unicamp), onde é responsável pelo Laboratório de Imunoinflamação.
Isso acontece porque a IL-22BP
(acrônimo em inglês para proteína de ligação à citocina IL-22) reduz a
quantidade disponível de interleucina 22 – uma proteína produzida por células
do sistema imunológico que ajuda a manter a barreira protetora do intestino,
fortalece as células que revestem suas paredes e está envolvida na produção de
substâncias antimicrobianas.
“Nossa explicação para esse
resultado foi que, na ausência da IL-22BP, a interleucina 22 atua de forma mais
eficaz, fortalecendo as defesas intestinais antes mesmo de a infecção começar”,
detalha Vinolo, que teve apoio da FAPESP em estudo sobre mecanismos moleculares envolvidos na
microbiota durante a inflamação.
No artigo recém-publicado, os
pesquisadores relatam que a composição de bactérias encontradas no trato
gastrointestinal dos camundongos que não tinham a proteína IL-22BP era
diferente. Ao transferir as bactérias intestinais desses animais para aqueles
com a produção normal da IL-22BP, observaram o efeito de proteção contra
infecções, sugerindo que a ausência da proteína de ligação resulta em uma
modulação benéfica da microbiota intestinal.
“Vimos que essa resistência à
infecção estava relacionada ao aumento na produção de ácidos graxos de cadeia
curta, moléculas liberadas pela fermentação de fibras alimentares por bactérias
intestinais e que possuem efeitos benéficos à saúde do intestino, incluindo a
promoção de um ambiente anti-inflamatório e o fortalecimento da barreira
intestinal”, detalha José Luís Fachi, pós-doutorando na Washington University School of Medicine (Estados
Unidos) e primeiro autor do artigo.
O pesquisador teve apoio da Fundação durante o doutorado, quando estudou a interação entre
as bactérias intestinais e a colonização por C. difficile, bacilo
resistente a diversos agentes antimicrobianos. Os ácidos graxos de cadeia curta
são produtos do metabolismo bacteriano durante o processo de fermentação de
fibras alimentares e exercem um efeito protetor frente às infecções
intestinais, tal como a causada pela bactéria C. difficile.
Vinolo, que também foi
orientador de Fachi no doutorado, destaca que a ausência de IL-22BP modifica a
composição e a funcionalidade da microbiota intestinal “e resulta em um perfil
benéfico ao organismo, o que ressalta o papel da microbiota na regulação das
respostas do organismo, assim como indica a possibilidade de atenuar ou
prevenir infecções intestinais via inibição de IL-22BP”.
Novos
caminhos
Com o achado, estudos futuros
podem ser delineados para aprofundar o entendimento e a aplicação terapêutica
da descoberta. “Primeiramente, é essencial investigar a eficácia de inibidores
de IL-22BP em modelos animais e, eventualmente, em ensaios clínicos para tratar
infecções intestinais graves”, pondera Fachi. Além disso, explorar como
diferentes tipos e quantidades de fibras alimentares afetam a produção de
ácidos graxos de cadeia curta. “A composição da microbiota na ausência de
IL-22BP pode fornecer informações valiosas”, ressaltam os autores.
A modulação da microbiota
intestinal pode beneficiar outras condições inflamatórias intestinais, como a
doença de Crohn e a colite ulcerativa, além de infecções intestinais causadas
por outros patógenos.
“Estudar como IL-22 interage
com outras moléculas e células do sistema imunológico na ausência de IL-22BP
ajudará a entender melhor sua função na imunidade intestinal. Esses estudos
futuros têm o potencial de transformar nosso entendimento sobre o papel dessas
proteínas na saúde intestinal e levar ao desenvolvimento de novas estratégias
terapêuticas para prevenir e tratar infecções intestinais”, conclui Vinolo.
O estudo envolveu pesquisadores
do Departamento de Genética, Evolução, Microbiologia e Imunologia do IB-Unicamp
e do Departamento de Patologia e Imunologia da Washington University School of
Medicine, nos Estados Unidos.
O artigo Deficiency of
IL-22–binding protein enhances the ability of the gut microbiota to protect
against enteric pathogens pode ser lido em: www.pnas.org/doi/10.1073/pnas.2321836121.
Ricardo Muniz
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/estudo-identifica-proteina-que-afeta-o-equilibrio-intestinal-e-a-resposta-do-corpo-a-infeccoes-bacterianas/52256
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