Quando o cidadão brasileiro pergunta por que o Brasil, um país tão cheio de riquezas, não consegue conferir ao seu povo uma vida mais digna, pode ouvir várias respostas que perpassam os campos político, administrativo, ético e econômico.
Não há dúvidas de que o potencial econômico de uma
nação pode ser anulado por gestões marcadas pela incompetência, pela omissão,
pela corrupção ou por fatores imponderáveis, como grandes tragédias naturais ou
conflitos armados.
No caso específico do Brasil, uma das principais
causas de o país ainda não ter retomado o caminho do desenvolvimento para criar
as condições adequadas para a garantia do bem-estar de sua população está na
irresponsabilidade com os gastos públicos e leniência com a corrupção.
Essa falta de controle, que contraria os princípios
da gestão eficiente, não é recente, porém vem se agravando. Dados publicados
pelo Ministério da Fazenda em 13/12/2019 e atualizados em 23/01/2020, mostram
que no período de 15 anos, entre janeiro de 2001 até dezembro de 2015
(predominantemente governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff), os
gastos do governo saltaram de R$ 205 bilhões/ano para R$ 1,154 bilhão/ano.
O incremento dessas despesas foi de extraordinários
463%, o correspondente a 2,77 vezes a inflação do período, medida pelo IPCA, de
166,9% (Exame – 13/12/2019 – Instituto Milenium). Esse excesso de gastos custou
ao país nada menos que R$ 606,85 bilhões/ano, número que fala por si.
Outra causa do crescimento dessa despesa foi o
aumento do número de funcionários públicos federais, que chegou a 35% em 15
anos (de 2001 a 2015). É quase o dobro do que aumentou a população nesse
período: 18,82%.
O fato é que o país gasta cada vez mais para
sustentar uma máquina de dimensões maiores ano após ano. Em 2001, o país gastou
R$ 63,2 bilhões com o funcionalismo público. Esse número subiu para R$ 298
bilhões em 2018. Ou seja, a despesa cresceu R$ 106,38 bilhões/ano, o
correspondente 471,52%. Em valores nominais, foram R$ 234,80 bilhões a mais, e
R$ 191,62 bilhões acima da inflação (IPCA) do período.
Os efeitos disso são devastadores. Matéria
publicada pelo jornal Folha de S. Paulo em 29 de janeiro de
2023 mostra que o déficit atuarial previdenciário atingiu R$ 6 trilhões, valor
equivalente a 93% da dívida pública líquida. Uma hora a conta vai chegar, e vai
custar caro.
Conforme a reportagem, “os governos federal,
estaduais e municipais têm dispensado valores crescentes de sua receita líquida
para pagar servidores aposentados, além daqueles na ativa, sobrando cada vez
menos para custear a máquina administrativa e investir”.
Em pouco mais de três décadas, segundo cálculos do
especialista em contas públicas Raul Velloso citados na matéria, a despesa
previdenciária da União disparou de 19,2% do total do gasto para 51,8%. Por
outro lado, caiu de 33,7% para apenas 3,1% o total que o governo federal dispõe
para os gastos discricionários. Resultado: os investimentos relativos a 2023
foram reduzidos de 16% para 0,3%, conforme matéria publicada jornal Folha de S.
Paulo (edição de 30/01/2024, pág. A16).
A situação não é melhor quando se analisa a curva
dos gastos primários da União. No período compreendido entre
1997 e 2002, portanto no governo Fernando Henrique Cardoso, os gastos primários
cresceram 0,6 ponto percentual do PIB, o que hoje corresponderia a R$ 62,53
bilhões/ano. De 2002 até 2015, final do governo Dilma, já estivemos em 19,5% do
PIB, o que hoje corresponderia a um aumento de R$ 260 bilhões/ano. Tivemos um decréscimo
nos governos Michel Temer e Bolsonaro que reduziram para 18,0% do PIB. Agora,
novamente entre 1º de janeiro e 31 de dezembro 2023, primeiro ano do terceiro
mandato de Lula, o crescimento foi de 1,3 p.p. do PIB, ou R$ 135,46
bilhões/ano.
Desde 1997 até hoje, os gastos primários da União
cresceram de 14,1% do PIB naquele ano para 19,3% do PIB, agora em 2023.
Em contrapartida, nas últimas quatro décadas o
investimento público em infraestrutura teve bom desempenho apenas em 1983,
caindo vertiginosamente depois, nesse período. Em 1983, correspondia a 5,7% do
PIB. Em 2023, foi de apenas 2,1%, uma redução de 63% no investimento em 40
anos, inobstante o aumento da carga tributária em 50%. Ou seja: crescem os
gastos com funcionalismo público e cresce a carga tributária sem que a máquina
administrativa consiga dar a resposta adequada às necessidades da população
porque não se investe, não tem capacidade de investir nas prioridades para
garantir qualidade de vida às pessoas. Se desperdiça tanto dinheiro público que
não sobram recursos para investimento onde deveria ser prioritário, por ex,
investir em educação, segurança, saúde, saneamento e habitação.
Sem austeridade nos gastos públicos e sem
equilíbrio fiscal é impossível para o país desenvolver um projeto social sério
e eficiente, a começar pela implantação de educação em tempo integral para
todas as crianças e jovens. E, assim, o Brasil não caminha para ao menos
diminuir as desigualdades sociais.
Não se trata de nenhum preceito da economia moderna, mas de uma lição que remonta há mais de 2.000 anos, dada pelo senador romano Marco Túlio Cícero, no ano 55 a.C.: “O Orçamento deve ser equilibrado, o Tesouro Público deve ser reposto, a dívida pública deve ser reduzida, a arrogância dos funcionários públicos deve ser moderada e controlada, e a ajuda a outros países deve ser eliminada, para que Roma não vá à falência. As pessoas devem novamente aprender a trabalhar, em vez de viver às custas do Estado!”.
Samuel Hanan - engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, empresário, e foi vice-governador do Amazonas (1999-2002). Autor dos livros “Brasil, um país à deriva” e “Caminhos para um país sem rumo”. Site: https://samuelhanan.com.br
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