No Brasil, também
há pedido da sociedade civil para superar barreiras de patentes para o acesso
ao dolutegravir
A Colômbia decidirá em breve
se autoriza a quebra de patente de um importante medicamento para o tratamento
da AIDS: o dolutegravir. Se aprovada, a medida reduzirá os preços do remédio
para a população com o fim do monopólio do laboratório ViiV Healthcare (uma
joint venture entre a GlaxoSmithKline, Pfizer e Shionogi), que atualmente
produz e distribui o produto farmacêutico no país. Antecipando a decisão da nova resolução do Ministério da Saúde em uma
das nações mais influentes do hemisfério sul, mais de 120 organizações da
sociedade civil e outros atores escreveram ao Ministro da Saúde da Colômbia,
Guillermo Alfonso Jaramillo, reforçando a necessidade de ampliar o acesso ao
dolutegravir, chamando a medida de “defender a justiça na saúde”. Para
Francisco Viegas, assessor da Campanha de Acesso a Medicamentos de Médicos Sem
Fronteiras (MSF), “a decisão, que permitirá a liberação de versões genéricas
mais acessíveis do dolutegravir, é louvável. Esse compromisso reforça a crença
de que a vida das pessoas vale mais do que o lucro das empresas.”
A resolução propõe licenças compulsórias, mas
conhecidas popularmente como quebra de patentes, que permitem à Colômbia
fabricar ou importar dolutegravir genérico sem a permissão do proprietário da
patente. O medicamento é recomendado como tratamento de primeira linha e
preferencial, incluindo em mulheres grávidas, de acordo com as orientações da
Organização Mundial da Saúde (OMS). Internacionalmente, os genéricos estão
disponíveis por uma fração do preço praticado pela farmacêutica no mercado onde
ela atua com exclusividade.
No Brasil, o dolutegravir é
distribuído no Sistema Único de Saúde (SUS) para mais de 460 mil pessoas desde
2017, mas também há entraves para a compra e produção de genéricos. Em 2020, o
Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) concedeu a patente à
empresa sem a anuência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Desde então, o laboratório Viiv tem impedido o Ministério da Saúde de comprar o
medicamento genérico do Laboratório Farmacêutico Miguel Arraes (Lafepe), do
governo do Estado de Pernambuco, que já produzia o remédio a preço mais baixo
por meio de uma Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) com um laboratório
privado nacional. Essa parceria é anterior a concessão da patente do
dolutegravir.
A sociedade civil brasileira,
liderada pelo Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI), submeteu uma carta em maio deste ano ao Ministério da Saúde
requerendo o licenciamento compulsório do dolutegravir. Dois meses depois, foi
aprovada uma
moção com o mesmo objetivo na 17ª Conferência Nacional de Saúde.
“Acreditamos que o licenciamento compulsório do medicamento no Brasil fortalece
a soberania sanitária nacional, permitindo a aquisição segura através de uma
parceria público-privada. A medida possibilita a redução de preços, gerando
economia de recursos públicos, contribuindo para a sustentabilidade das
políticas de saúde e diminui o risco de desabastecimento desse medicamento
essencial ao viabilizar mais de um fornecedor”, explica Susana van der Ploeg,
coordenadora do GTPI. No entanto, até o momento, o Ministério da Saúde não se
posicionou sobre o assunto.
A “quebra de patente” na Colômbia é um importante
marco internacional e exemplo para o Brasil. Caso a medida seja aprovada, será
uma derrota significativa para a indústria farmacêutica baseada em monopólio,
que há muito contava com o país colombiano como um alicerce de apoio à política
global de patentes e aos interesses comerciais dos EUA e da Europa no exterior.
De acordo com Viegas, MSF usa amplamente o medicamento como tratamento de primeira linha em programas na África, na Ásia e nas Américas, e viu os benefícios para os pacientes com menos efeitos colaterais e menor risco de resistência. “Os esquemas recomendados pela OMS devem estar disponíveis para todas as pessoas, onde quer que elas vivam. No entanto, MSF e os Ministérios da Saúde de alguns países de renda média, como a Colômbia, lutam para fornecer dolutegravir. Uma licença compulsória, tanto no Brasil como na Colômbia, resultaria em acesso a versões genéricas acessíveis. No Brasil, inclusive já existindo produção nacional, a medida poderia mudar substancialmente a situação dos pacientes,” conclui.
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