Francisco Gomes
Junior, advogado especialista em direito digital e crimes cibernéticos escreve
sobre o direito a privacidade e intimidade nas redes sociais
No momento em que comentários sobre a vida íntima
de uma atriz que foi estuprada e optou por entregar o bebê fruto dessa
violência para adoção ganham enorme repercussão nas redes, com pessoas
opinando, julgando e até ofendendo, devemos nos perguntar se tais pessoas têm
esse direito. E obviamente é resposta é negativa.
Não se deve adentrar na privacidade e intimidade da
atriz não somente porque a Constituição Federal proíbe, ao colocar o direito à
privacidade e intimidade como um princípio que não pode ser violado, mas também
por humanidade, empatia, ética e respeito.
Não há justificativa ou consentimento para violar a
imagem, os dados pessoais e a intimidade de uma pessoa. Ainda mais após a
pessoa ter sofrido extrema violência e enfrentar momentos de muita dificuldade,
decorrentes da dor a que foi submetida.
Foram utilizados fatos sigilosos, íntimos e mesmo
dados sobre a saúde da atriz e da criança recém-nascida, que também teve sua
intimidade violada. Uma crueldade sem limites e que literalmente jogou a atriz
ao impiedoso julgamento das redes sociais.
Todos temos vida privada, ou seja, nossa vida que
diz respeito apenas a nós mesmo. E dentro dessa vida privada, a intimidade é a
parcela mais sensível e que merece maior preservação.
No momento em que “lacradores” invadem a
privacidade de uma mulher e violam sua intimidade para dar uma “informação
chocante”, divulgando fato que a própria pessoa resolveu manter consigo,
tamanha a dor que lhe provoca, eles violam a lei e atropelam conceitos básicos
de civilidade como empatia e respeito a outro ser humano.
Resolvem expor a intimidade e fazem juízo de valor
sem nenhum conhecimento. Para que se tenha uma ideia da crueldade, além de
expor a dor e trauma de um estupro, houve que de forma irresponsável condenasse
a atriz vítima, pelo fato dela ter entregue a criança fruto desse abuso para
adoção. Pessoas reincidentes em ofender e aparecer por isso afirmaram uma
infinidade de coisas, até mesmo que se tratava de abandono de incapaz o fato de
entregar a criança para adoção, o que é de um absurdo e falta de conhecimento
básico jurídico espantoso. O que se espera de alguém em um veículo de
comunicação público é que tudo seja checado e que conceitos não sejam lançados
se não estiverem corretos.
Agindo irresponsavelmente equiparam-se a abutres,
talvez criminosos, ao atentarem contra a honra da vítima de um ato de
violência.
A vítima, portanto, sofreu a violência sexual, a
gravidez indesejada e não interrompeu a gestação por conta de suas convicções.
Mas após o nascimento, optou por entregar a criança para adoção. Se é um trauma
de difícil e demorada superação, a divulgação de tudo que ocorreu além de
trazer à tona tudo pelo que passou ainda a obriga a submeter-se ao julgamento
das redes sociais. Simplesmente desumano.
Repita-se, falta de ética, de empatia, de
humanidade, falta de bondade. E no absurdo dos absurdos utilização política da
tragédia, com direita e esquerda trocando acusações e manifestando seu
posicionamento.
Em condições normais poderia a vítima representar
contra as pessoas que atingiram sua honra de forma tão violenta, mas pode ser
que ela prefira superar e afastar fato tão traumático de sua vida.
Quem busca uma relevância meteórica lacrando, pode
durar algum tempo, mas ao final se não tiver conteúdo voltará ao lugar de
partida. Do pó vieram e ao pó voltarão.
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