Em vigor a partir deste ano, o chamado Novo Ensino Médio reformula a matriz de referência curricular e propõe uma nova concepção para essa última fase da Educação Básica. Desde a sua aprovação, em 2017, o assunto gera dúvidas e reflexões. O que motivou tal mudança? Quais serão os desafios de agora em diante? O que muda para alunos e professores? E como as escolas terão que se adaptar?
As respostam surgem a partir
do entendimento do cenário contemporâneo e da compreensão das necessidades da
educação brasileira. O século XXI tem exigido, mais do que nunca, rápidas
mudanças e adaptações, o que impacta diretamente o mercado de trabalho, bem como
os rumos da sociedade. A partir daí surgem as demandas com relação ao
desenvolvimento de novas habilidades por parte dos estudantes e de novas
práticas pedagógicas por parte dos professores e escolas.
Complementando essa
realidade, é importante ressaltar, também, as lacunas que o setor educacional
tem apresentado nos últimos anos. Os indicadores de frequência e desempenho do
Ministério da Educação (MEC) apontavam, em 2016 – antes da aprovação da reforma
–, que 28% dos estudantes desta etapa encontravam-se com mais de 2 anos de
atraso escolar, enquanto 26% dos alunos abandonavam a escola ainda no 1º ano.
Neste mesmo sentido, a
variação positiva apresentada pelo IDEB (Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica) foi de apenas 0,3 pontos entre 2005 e 2011, e nenhum
aumento nos últimos 10 anos. Manteve-se, portanto, estagnado e abaixo das metas
estabelecidas. A partir destes dados, fica clara a desmotivação dos jovens com relação
aos estudos, bem como a necessidade de uma reformulação curricular capaz de
trazer à tona novos modelos de ensino.
Principais mudanças
contempladas no Novo Ensino Médio e como podem influenciar a educação
brasileira
Responsável pelas diretrizes
do Novo Ensino Médio, a Lei nº 13.415/2017 institui alterações que estabelecem
maior integração e flexibilidade curricular, além da oferta de itinerários
formativos para os alunos. Ou seja, estruturas fundamentadas a partir de
conjuntos de práticas e experiências
educativas (projetos, oficinas, núcleos de estudo, entre outras
possibilidades de trabalho), que os estudantes poderão escolher no ensino
médio, tomando como base os eixos estruturantes e as áreas que mais se identificam,
como Linguagens e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias,
Matemática e suas Tecnologias e Ciências Humanas e Sociais aplicadas e suas
Tecnologias.
Em suma, o currículo do Novo
Ensino Médio contemplará as competências e habilidades relacionadas aos eixos
estruturantes e às áreas de conhecimento. Parte da carga horária se aplica a
Formação Geral Básica, que contempla a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
está por sua vez, orienta a elaboração do currículo de cada Rede e unidade
escolar.
Com isso, o Novo Ensino
Médio pretende atender às necessidades e às expectativas dos jovens,
fortalecendo seus papeis de protagonistas, enquanto participam ativamente do
processo de aprendizagem, já que têm autonomia para escolher as áreas em que
desejam aprofundar seus conhecimentos. Além disso, as práticas pedagógicas se
organizarão tendo como premissa a aprendizagem, considerando a perspectiva de
quem aprende, e não somente de quem ensina.
De acordo com o cronograma
do MEC, as mudanças serão aplicadas por etapas. Em 2022, as alterações serão
obrigatórias apenas ao 1º ano. Em 2023, ao 2º. Já em 2024, além do 3º ano, as
novas diretrizes contemplarão também o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).
Impactos e desafios para os
alunos
A partir deste contexto, os
estudantes desenvolverão novas estratégias de aprendizagem, além de expandir as
habilidades ligadas aos eixos estruturantes dos itinerários formativos –
investigação científica; mediação e intervenção sociocultural; processos
criativos; bem como empreendedorismo –, cujos papeis são proporcionar novas
experiências educativas conectadas à realidade, a fim de colaborar para as
formações pessoal, profissional e cidadã.
Neste sentido, aprimorarão o
autoconhecimento, a autorreflexão e o senso crítico, para que possam encontrar
seus caminhos, vocações e habilidades para a efetivação de seus projetos, como
a capacidade de acessar, atualizar e produzir conhecimentos ao longo da vida,
de criar e inovar, de questionar, intervir e ser agente de transformações
sociais, culturais e ambientais.
Impactos e desafios para os
docentes
Para os docentes, os
desafios englobam a mudança de perspectiva sobre o ensino e a adaptação às
novas abordagens, que passam a enxergá-lo não somente como aluno, mas como um
ser integral preparado para lidar com todas as vertentes da sociedade com
participação ativa no processo de aprendizagem. Com isso, professores agora
assumem um papel de mediadores, que é mais desafiador do que ser apenas um
vetor responsável pelas informações.
Nesse processo cabe ao
professor pensar e estudar a forma como ele pode contribuir para que desenvolva
experiências sólidas de aprendizagem, e para isso, é imprescindível que haja
conexão entre o objeto de estudo e o que acontece na vida, de forma que a
experiência escolar tenha cada vez mais sentido.
Impactos e desafios para as
instituições de ensino
Neste cenário, as escolas
terão autonomia para definir quais os itinerários formativos irão ofertar. A
partir disso, um dos principais desafios, além da transição de uma prática
pedagógica predominantemente transmissiva para uma abordagem ativa de
aprendizagem, e sua reorganização estrutural, é envolver toda comunidade
escolar nos processos de tomada de decisão. Mudanças são complexas e exigem
clareza de onde se quer chegar, senso de interdependência e ambiente de
confiança para que sejam efetivas e gerem os resultados esperados.
Um exemplo disso pode ser o
envolvimento dos próprios estudantes no assunto em questão, por meio de
assembleias e outros fóruns de discussão. Dessa forma, é possível fazer com que
atuem tomando decisões e respondendo por elas responsavelmente, apoiados pela
equipe pedagógica – professores, coordenadores e orientadores educacionais.
Por outro lado, é
fundamental que as instituições capacitem seu corpo docente, no qual muitos
professores terão que tomar consciência sobre seus modelos mentais, pois deixam
para trás seus papeis expositivos e de supostos detentores do saber e assumem o
de mediadores, de fato, da aprendizagem. Com isso, o planejamento de uma aula
como tradicionalmente conhecemos – o adulto fala e os estudantes escutam, sai
de cena e dá espaço para o desenho de experiências de aprendizagem, com
intencionalidade pedagógica, que aguçam a criatividade, a autonomia, a criticidade,
a responsabilidade, a capacidade de resolver problemas e o desenvolvimento de
competências cognitivas e socioemocionais de todos os envolvidos.
Para as redes de ensino que já iniciaram o processo
de atualização, cabe ampliarem vivências, experiências, integralizar os eixos
estruturantes e alinhar o projeto pedagógica em toda a Educação Básica. Um
exemplo disso, é uma prática coerente com a concepção de uma criança potente,
que a encoraje em suas investigações e descobertas sobre o mundo, contribuindo
para que desenvolva e amadureça suas hipóteses, por meio da interação com seus
pares e adultos num espaço pedagogicamente organizado. No Ensino
Fundamental, o engajamento dos estudantes em projetos de trabalho e a vivência
de metodologias ativas criam oportunidades desde então para que desenvolvam o
papel de estudante investigativo potencializando ainda mais a experiência dos
itinerários formativos quando chegarem no Ensino Médio.
Apesar dos desafios existentes
frente à nova resolução do Ensino Médio, as expectativas são positivas com
relação aos ganhos para a educação brasileira. A proposta da nova reforma,
alinhada às demandas do século XXI, chega para trazer mais sentido para a vida
dos estudantes, uma vez que o ato de aprender se configure como uma experiência
pessoal, organizada, ativa e investigativa.
Rita
Rangel - Gestora Pedagógica da rede de colégios Santa
Marcelina,
instituição que alia tradição à uma proposta educacional disruptiva e alinhada
às principais tendências do mercado de educação.
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