O
psicólogo Pablo Sauce, Coordenador do Programa para Dependência Química da
Clínica Holiste, esclarece os principais tabus sobre dependência química
O Relatório Mundial sobre Drogas 2020 realizado
pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) confirmou que a
crise da COVID-19 e a retração econômica ameaçam agravar ainda mais os riscos
das drogas. O estresse, ansiedade, o medo e outros sintomas da pandemia podem
elevar o consumo de álcool, remédios e substâncias ilícitas. Assim, com o
isolamento social, muitas famílias tiveram que enfrentar os problemas causados
pela dependência química mais de perto - ou até mesmo pela primeira vez.
Nessas horas, a principal dúvida é: Quando procurar
ajuda especializada? E, em casos mais graves, como identificar a necessidade de
internação? O psicólogo Pablo Sauce, Coordenador do Programa para
Dependência Química da Clínica Holiste, explica que existem alguns sinais que
acendem uma luz de alerta sobre a possibilidade de uma intervenção.
“Primeiramente considero uma internação necessária quando o usuário perdeu o
controle sobre o uso da substância, esse descontrole repercute no âmbito de
convivência, seja familiar ou social”, aponta.
Pedido de ajuda: Muitas vezes,
o pedido de ajuda parte do próprio usuário quando o uso da substância não está
mais associado à busca de prazer, mas ao apagamento de uma dor ou sofrimento
associado à falta da droga. “Este é o sinal de que, passada a fase da lua de mel,
a relação com a droga está virando uma lua de hell, ou seja, transformando a
vida do paciente em um inferno.
Alcoolismo crônico: Nos casos
de alcoolismo crônico, um sinal importante é o quadro de confusão mental. Com
aumento significativo dos esquecimentos e do número de acidentes cotidianos,
assim como as perturbações causadas pela perda das funções hepáticas, são
indícios evidentes da necessidade de uma internação urgente.
Ciclo de Mentiras: O psicólogo
explica que quando o usuário entra no círculo vicioso das mentiras, sem se
preocupar com as evidências que atestam a gravidade do problema, é indício da
entrada em uma espiral difícil de sair sem auxílio. “Geralmente os usuários se
reinternam neste estágio porque sabem que passado este ponto não há retorno,
“só paro na internação”, como tenho ouvido dizer inúmeras vezes”, comenta.
Mudança de Rotina:
Concomitante com os sinais anteriores, mudanças de rotina, como trocar o dia
pela noite, mudança radical de turma ou isolamento, descuido pessoal,
esvaziamento dos compromissos e reorganização da vida em função do uso da
substância, indicam um quadro à beira de uma intervenção da ordem de uma
internação, explica Pablo Sauce.
Furtos e Violência: Um
inequívoco indício da necessidade de internação é quando o usuário passa a
trocar objetos por substâncias, sejam dele ou furtados da família. Ou ainda,
passa a se endividar para sustentar a dependência, assim como quando passa a
exigir dinheiro ou objetos dos familiares.
Qualquer um destes pontos acende um sinal de alerta
que indica a necessidade de acompanhamento psiquiátrico. É importante frisar
que a Dependência Química ́ não é um problema moral, mas de uma questão médica
que deve ser acompanhada de perto por um profissional da saúde. “A ajuda
profissional é fundamental porque, por se tratar de uma dependência, os
sintomas de abstinência podem ser insuportáveis. Se livra do vício não é uma
mera questão de força de vontade, é um trabalho difícil que depende da ajuda de
quem está no entorno do paciente, profissionais e família.”, defende.
Como lidar com um dependente químico em casa?
De acordo com Pablo, na maioria dos casos os
familiares costumam ficar divididos entre a culpa e a angústia. “A culpa por
achar que são inteiramente responsáveis pelas consequências do “desvio” de
conduta do usuário, agem como se o usuário fosse uma vítima, sem decisão
própria e sem responsabilidade pelas consequências de seus atos”.
O problema é que essa posição de culpa acaba
dificultando a tomada de decisão sobre o tratamento. O profissional conta que
muitas famílias entendem o tratamento por uma via negativa e se mostram
dispostas a fazer o impossível para poupar o usuário da “privação” que o
processo de desintoxicação representa no imaginário. “Sobretudo o ato da
internação por determinação médica, ou popularmente, a involuntária, é visto
como um acontecimento traumático, do qual o usuário nunca mais poderá se
recuperar ou perdoar a família - e não é assim”, comenta.
Nesses casos, além do dependente químico, a família
também precisa de ajuda profissional para aprender a entender a situação e a
lidar com os próprios sentimentos. “A orientação nesses casos é ajudar a
família a perceber, entre suas expectativas, o que há de falsas soluções
negacionistas e indicar o caminho da co-responsabilidade, dela e do usuário”,
pontua o psicólogo.
Dependência Química x Pandemia
No Brasil, pesquisas apontam que a pandemia
impulsionou o consumo de álcool, maconha e outras substâncias. “Este fenômeno
parece indicar que as ondas do uso de substâncias acompanharam, ao menos
parcialmente, a oscilação da pandemia - maior e menor distanciamento. O
distanciamento implicou no aumento do uso de “ansiolíticos” e o menor
distanciamento implicou no aumento do uso das drogas “estimulantes”, finaliza o
psicólogo.
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