Fomos às ruas, no governo
Dilma. O Brasil se quebrava, como ainda se estilhaça. A esquerda jamais vira a
"massa" manifestar-se tão exuberantemente, por conta própria. Afinal,
ela é a "guia universal dos povos". Titubeou, inicialmente; ou se
amalgamaria a tão gigantescas e continentais manifestações, ou se tornaria poeira.
Optou por começar suas próprias aparições nas ruas, bem identificadas suas
cores rubras. O verde-amarelo não fora conduzido pela direita, de resto
politicamente incapaz de fazê-lo. O povo plantou as raízes grossas e profundas
do impeachment.
A espontaneidade desse
movimento, contudo, foi soterrada pelos "grupos conscientes". Os
políticos profissionais fizeram olhar de mercadores, sofreram e sublimaram-se,
ignoraram as maiores expressões populares das ruas brasileiras. Afinal, tinham
de tocar suas vidinhas, suas carreiras. Ao retornar a suas casas o povo
brasileiro, o terreno ficou livre da esplêndida floresta que nascera: aos
políticos de todo o gênero. A velha esquerda ocupou parte mínima da terra sobre
a qual andara o povo, sobretudo num domingo mágico. Idem, a direita.
Desse modo, restaram três
segmentos atuantes; a politicagem tradicional e ambos os grupos ideológicos. Os
primeiros, sem dor, amor e cor; os segundos, com suas emoções descontroladas e
desbussoladas para solucionar nossa crise com olhar contemporâneo, liberto dos
velhos dogmas. E o povo, disseminada a possibilidade do Terror, não mais sai
aos espaços públicos, acuado.
Daí estarmos a viver um
momento ilusório, acampados sobre um vulcão. Envelhecidos, cansados.
O homem - tanto o comum como
o neurótico ou quase-neurótico que procura os extremismos - tem seu
inconsciente, não raro, entranhado em áreas misteriosas, das profundezas do
ser, distanciado do limiar consciente. São, como disse Jung, áreas
desconhecidas e ocultas. Tanto no plano pessoal como coletivo. Quando afloram à
consciência, seus sentimentos são dissimulados, levam um chega para lá da
suposta razão, do elemento apaziguador, do a ver como ficarão as coisas.
Essa mordaça pelo povo que silenciou imposta sobre sua própria expressão
decorreu do ódio que tomou conta os grupos ditos ideológicos. É melhor não
atritar com os filhos e com os amigos. Aquietemo-nos, ainda que o vulcão fique
cada vez mais incandescente. Nele hibernam os mais ousados.
Um governo tampão - bambo -
não produziu as reformas esperadas. Jamais teve condições políticas a tanto.
A insegurança jurídica
corroeu os grampos das âncoras e da confiança na funcionalidade institucional.
Assim, temos que manter
nossas crenças diurnas, cotidianas, e deixar nossos sonhos cobertos pelos
mantos noturnos.
Se as próximas eleições -
democracia e governo não se limitam a urnas - nada resolver, abrir-se-ão as
comportas e o povo deixará as grutas em que considerou conveniente homiziar-se.
A "nova república" implodirá. Virá à tona uma força juvenil
irreprimível. Em termos politicamente conhecidos, uma revolução; do
inconsciente fundo e febril virá novo maio de 1968. Macron já o experimenta.
Nossos jovens em rebelião terrível mostrarão quais são as forças
vivas da nação. Arrastarão trabalhadores e intelectuais. O restante será de
zumbis conservadores, corruptos e apáticos. Tudo aparentemente sólido
desmanchará no ar. Não será refundada somente a república. Depois de cinquenta
anos, diz-se que há um ante e um após 1968. Teremos um após 2018. De
cinquenta em cinquenta anos, a mudança de todos os valores será a larva
dos vulcões do bem.
Vivamos um pouco mais. Não
se vá, ante uma plantada revolução de novos jovens, raiz das árvores do
século XXI.
Amadeu Garrido de
Paula - Advogado, sócio do
Escritório Garrido de Paula Advogados.
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