Especialista
explica as diferenças e alerta para as falhas na denominação das doenças em
reportagens recentes
Diversas reportagens têm
trazido belíssimas histórias em torno de jovens portadoras de microcefalia com
diferentes manifestações clínicas e que atingiram a adolescência com
importantes conquistas. A primeira delas é Ana Victória, de 17 anos, moradora
de Manaus. A outra, Victória, de 15 anos, de Ituberá, Bahia. Em comum,
além do nome, ambas têm obtido êxito na carreira de modelo, mesmo com todas as
eventuais dificuldades que têm enfrentado, com apoio de suas famílias e desde
seu nascimento.
As coincidências entre as
meninas são diversas. Tanto a menina de Manaus, como a da Bahia são portadoras
de microcefalia primária, que é mais frequentemente causada por mutações
genéticas, que podem ou não interferir no crescimento do córtex cerebral já nos
primeiros meses do desenvolvimento fetal.
Segundo o Dr. Thomaz
Gollop, Professor Livre-Docente em genética médica pela Universidade de São
Paulo, a microcefalia primária pode não vir acompanhada de nenhuma outra
anomalia neurológica exceto, em alguns casos, déficit intelectual de
intensidades variáveis, e não há anomalias esqueléticas ou de outra natureza a
ela associada.
Os quadros parecem com os
relatos de ambas as mães. Ana Victória consegue se comunicar de maneira simples
e seu desenvolvimento mental equivale ao de uma criança de oito anos.
Já Victória, que foi
adotada 17 dias após o nascimento, começou a andar e falar no tempo esperado
para qualquer criança da mesma idade. Frequentou escolas regulares, conseguindo
acompanhar as outras crianças até o quinto ano. Hoje, segue os estudos com
acompanhamento especializado.
Como é possível perceber,
são casos de meninas e famílias batalhadoras, que merecem todo o nosso apoio e
respeito. Histórias de superação como estas certamente servem de estímulo para
muitos pais que hoje, eventualmente, encontram-se diante de situações
semelhantes.
Por outro lado, existe a
microcefalia secundária. Esta ocorre por causas do meio ambiente e compromete
fetos ou recém-nascidos e até adultos que originalmente são normais, explica o
Dr. Thomaz.
"São as agressões
decorrentes do excesso de ingestão de álcool na gravidez (Síndrome do Álcool
Fetal), agentes infecciosos, como por exemplo, as Síndromes Congênitas da
Rubéola, Citomegalovírus, Toxoplasmose, Sífilis e, atualmente, a Síndrome
Congênita do Zika. Esta última tem, além da microcefalia, lesão irreversível do
cérebro, dilatação dos ventrículos cerebrais, calcificações intracranianas,
lesões oculares e auditivas e, em alguns casos artrogripose (rigidez grave das
articulações ou "juntas"). É um quadro clínico gravíssimo que vai
muito além da microcefalia isoladamente e traz grave déficit intelectual e
motor."
E o Zika vírus?
As meninas acima relatadas
nada têm a ver com o vírus da Zika, alerta o especialista.
"Elas têm uma
microcefalia primária que, como vimos, não é acompanhada de outras anomalias.
Mais do que isto, é lógico que o seu quadro clínico não está relacionado ao
vírus Zika até porque há 15 e 17 anos não havia epidemia por este vírus. São
casos completamente diferentes entre si!"
É um equívoco muito grande
associar a Síndrome Congênita do Zika à microcefalia isoladamente e até mesmo
dizer que a principal consequência da infecção pelo Zika vírus na gravidez é a
microcefalia, avalia o Dr. Thomaz.
"A microcefalia é,
entre outras manifestações desta síndrome, um de seus sinais e não é o mais
grave seguramente", afirma.
Segundo o Ministério da
Saúde, o Brasil teve 214 mil casos prováveis de Zika de fevereiro até 17 de
dezembro de 2016, período no qual a notificação dos casos tornou-se obrigatória.
Cerca de 11 mil infecções em gestantes foram comprovadas.
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