Há mais de um ano do início da vacinação no Brasil, esse tema ainda vem gerando diversos debates na área do Direito do Trabalho.
Mesmo a vacina sendo tão aguardada pela maioria da
população, há uma parcela da sociedade que por motivações negacionistas,
antivacina ou mero receio, optou por não se vacinar. Entretanto, essa opção não
traz impacto apenas para quem não se vacina, além de, não contribuir com o fim
da Pandemia, também pode passar a representar um maior risco de contaminação
aos demais indivíduos que compartilham do mesmo ambiente.
Quando se trata de um ambiente coletivo de
trabalho, a opção deste empregado de não se vacinar, pode impactar na vida dos
demais colaboradores daquela empresa e a partir desta situação que começaram a
surgir os questionamentos. Afinal de contas, pode demitir quem se negar a tomar
vacina? Essa demissão pode ser por justa causa? Quem não quer se vacinar, pode
pedir rescisão indireta por entender que a empresa está o discriminando?
Nos últimos tempos esse vem sendo um assunto em
alta na Justiça do Trabalho de todo o país, empregadores e empregados buscando
a tutela de seu direito, na intenção de se discutir se o direito individual
prevalece sobre o coletivo, ou o contrário.
Ao analisar as decisões sobre o tema, verificamos
que os Tribunais estão entendendo como possíveis as demissões em razão da
negativa de vacinação por parte do empregado, inclusive convalidando as
demissões por justa causa, exatamente por entenderem que se negar a tomar a
vacina caracteriza ato gravíssimo, visto que o empregado coloca em
risco não apenas a sua saúde e vida como também a de seus colegas de
trabalho e de toda a comunidade onde convive, considerando ser público e
notório que o vírus da Covid-19 é altamente contagioso e somente a vacina,
juntamente com as medidas protetivas indicadas pela Organização Mundial de
Saúde são suficientes para combater a pandemia.[i]
Ou ainda, que no ambiente do Estado de Direito, muitas liberdades
convivem e, não raro, colidem. O direito de escolher se deseja ou não ser
imunizado é uma delas, deve ser assegurado a quem - em que pese não existir
para essa decisão um mínimo motivo com fundamento científico - não desejar
fazê-lo. Tal exercício de liberdade não pode, entretanto, vilipendiar o
interesse coletivo (dentro da empresa) e social (dentro da comunidade) de
ampliar a proteção de todos, diminuindo as infecções e, com elas, a sobrecarga
do sistema público de saúde. Concluindo que se equipara
à liberdade individual de negar-se à imunização, o direito patronal de não
manter em seus quadros de empregados, ampliando os riscos de infecção de outros
empregados ou de clientes, aquele que se recuse imotivadamente ao ato de
imunização.[ii]
Bem como, que é dever do empregador oferecer aos seus
empregados ambiente de trabalho salubre e seguro, nos termos da Lei, e
que uma vez que a empresa disponibilizou aos seus colaboradores informativos
sobre a necessidade de minimizar os riscos de contágio, incluindo, por óbvio, a
necessidade de aderir ao sistema de imunização, o Tribunal ficou plenamente
convencido de que a conduta adotada pela reclamada (aplicação da justa causa)
não se revelou abusiva ou descabida, mas sim absolutamente legítima e regular,
porquanto, para todos os efeitos, a reclamante não atendeu à determinação da
empresa.[iii]
E nas situações em que o empregador exige a vacinação
sob pena de demissão e o empregado se sente injustiçado, procurando o Poder
Judiciário por entender haver uma falha grave do empregador ao atuar com abuso
de poder, nossos Tribunais entenderam de forma oposta, isto é, que não há um
ato discriminatório ao exigir a vacinação do empregado, afirmando que o juízo
de origem agiu com acerto ao indeferir a rescisão indireta do contrato de
trabalho, à vista da clarividente prevalência do interesse coletivo e de saúde
pública em face da grave pandemia que assola o mundo, em detrimento de seu
interesse individual, não desconsideradas suas convicções ideológicas,
especialmente por se ativar a reclamante em clínica que dispensa cuidados a
idosos, categoria da maior vulnerabilidade e letalidade quando infectada pelo
Sars-Cov-2, causador da Covid-19. E concluiu o julgamento afirmando
que o art. 8º da CLT determina, ipsis litteris, que: 'que nenhum interesse
de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público". Portanto,
nenhuma posição particular, convicção religiosa, filosófica ou política ou
temor subjetivo do empregado pode prevalecer sobre o direito da coletividade de
obter a imunização conferida pela vacina, prevista em programa nacional de
vacinação e, portanto, aprovada pela Anvisa, e inserida nas ações do PCMSO.[iv]
Ou seja, diante de todos estes julgados que fizemos
questão de colacionar a fim de comprovar que as decisões seguem a mesma
tendência em todas as regiões do país, a conclusão que chegamos é a de que a
exigência de vacina do empregado por parte do empregador não caracteriza abuso
de poder e nem mesmo atitude discriminatória, estando esta atuação dentro de
seus poderes diretivos. E que o contrário, a negativa de vacinação por parte do
empregado configura ato de insubordinação passível de dispensa por justa causa,
uma vez que a CLT prevê que o interesse coletivo se sobrepõe ao individual.
Sendo assim, diante das diversas orientações da OMS
sobre o tema e de toda a legislação de enfrentamento à pandemia da COVID-19, o ideal
é que as empresas, a fim de minimizar os impactos econômicos na vida dos
trabalhadores, busque primeiramente a conscientização de todos sobre a
importância e necessidade da vacinação, inclusive criando um canal de
comunicação com seus empregados visando desmistificar seus medos em relação à
imunização. Contudo, o empregado sendo irredutível quanto a decisão de não se
vacinar, ele deverá pedir demissão ou assumirá o risco de ser demitido,
inclusive por justa causa, abdicando de suas verbas rescisórias, visto que esta
é a tendência dos Tribunais, no intuito de preservar um bem maior, no caso, a
vida de toda a comunidade que vem buscando contribuir com o fim da Pandemia da
COVID-19, obedecendo às orientações sanitárias e se vacinando adequadamente.
Debora Regina Ferreira da Silva – advogada,
sócia do escritório Akiyama Advogados Associados. Possui pós-graduação em
Processo Civil e do Trabalho na Escola Paulista de Direito – EPD. concluída em
2016. Para mais informações sobre a atuação da especialista ou sobre o
escritório, acesse http://www.akiyama.adv.br/ ou ligue
para (11) 3675-8600.
[i] TRT-11 00001687920215110019,
Relatora: SOLANGE MARIA SANTIAGO MORAIS, 1ª Turma, 07/12/21.
[ii] TRT-2
1001359-61.2021.5.02.0030, Relator: MARCOS NEVES FAVA, 15ª Turma, 07/04/22.
[iii] TRT-2
1000122-24.2021.5.02.0472, ROBERTO BARROS DA SILVA, 13ª Turma, 19/07/21.
[iv] TRT-15
0010091-68.2021.5.15.0068, Relator: ROSEMEIRE UEHARA TANAKA, 3ª Câmara,
22/07/21.