Em
19 de março de 2015 fora publicado no Diário Oficial da União o Decreto
8.420/15, o qual regulamenta a Lei 12.846/13 – a denominada Lei Anticorrupção –
que, por sua vez, dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas
jurídicas pela prática de atos contra a administração pública nacional ou
estrangeira.
Nada
obstante o Governo Federal valer-se de referida regulamentação como verdadeira
bandeira político-partidária no sentido de demonstrar sua atuação (tardia atuação)
voltada ao combate da corrupção, certo é a Lei Anticorrupção é um largo passo
em favor do compliance
corporativo.
Entertanto, é preciso
convocar atenção ao fato de que não se trata de regra que inaugura mecanismos
anticorrupção no ordenamento jurídico brasileiro. Podemos citar a Lei 8.429/92
(enriquecimento ilícito dos agentes públicos); a Lei 8.666/93 (licitações e
concorrências públicas); a Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro) e a Lei 12.527/11
(acesso à informação) – não se olvidando o Código Penal, o qual tipifica os
crimes de corrupção passiva e ativa – dentre outros tantos exemplos.
Em brevíssima síntese, nos
termos da Lei Anticorrupção a empresa poderá ser responsabilizada mesmo que não
tenha autorizado o ato corrupto ou mesmo que tal ato não seja de conhecimento
de seus dirigentes, sendo certo que a responsabilidade subsiste mesmo nas
hipóteses de alteração contratual, transformação, incorporação, fusão ou cisão
societária, havendo solidariedade entre controladoras, controladas, coligadas e
consorciadas.
A lei busca punir os
denominados “atos lesivos”, ou seja, aqueles que atentem contra o patrimônio
público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou
contra os compromissos internacionais assumidos pelo brasil.
São atos lesivos segundo a
lei: a) prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a
agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; b) financiar, custear,
patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos
previstos nesta lei; c) valer-se de interposta pessoa para encobrir os
interesses ou a identidade do beneficiário do ato corrupto e d) fraudar,
frustrar ou impedir, de forma fraudulenta, a realização de processo
licitatório.
Serão aplicadas às pessoas
jurídicas consideradas responsáveis pelos atos lesivos as seguintes sanções: a)
multa de 0,1% a 20% do faturamento bruto do último exercício anterior ao da
instauração do processo administrativo e, caso não seja possível utilizar o
critério do valor do faturamento bruto da pessoa jurídica, a multa será de seis
mil a sessenta milhões de reais; b) publicação extraordinária da decisão
condenatória à expensas da pessoa jurídica, em meios de comunicação de grande
circulação; c) reparação integral do dano; d) desconsideração da personalidade
jurídica com aplicação das sanções a administradores e sócios com poderes de
administração; e) suspensão ou interdição parcial de suas atividades e f)
dissolução compulsória da pessoa jurídica.
Possível perceber, a sanção
mais prática é a aplicação de multa a ser fixada – como já apontado - entre
0,1% a 20% do faturamento bruto do ano anterior, cujo pagamento há de ser
adimplido tão logo seja aplicada pela Justiça, observado o prazo legal, sendo
facultado à empresa sancionada contestá-la judicialmente.
Importa também salientar,
para tentar evitar aludida contestação, a lei prevê um mecanismo denominado de
“acordo de leniência”, por meio e força do qual a autoridade máxima de cada
órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo com as pessoas jurídicas
responsáveis pela prática dos atos previstos nesta lei que colaborem
efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa
colaboração resulte: a) a identificação dos demais envolvidos na infração,
quando couber e b) a obtenção célere de informações e documentos que comprovem
o ilícito sob apuração.
O acordo somente poderá ser
celebrado se preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) a
empresa seja a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a
apuração do ato ilícito; b) a empresa cesse completamente envolvimento na
infração investigada a partir da propositura do acordo; c) a empresa
admita sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com
as investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas,
sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.
O acordo de leniência libera
a empresa da publicação extraordinária da decisão condenatória e de 2/3 da
multa aplicada, mas não a libera da reparação do dano causado e da perda de
contratos com a Administração Pública.
Por todo o exposto as
empresas estão sob mais um desafio, qual seja, desenvolver mecanismos que
evitem a responsabilização – inclusive de seus sócios e diretores – por atos
ilícitos. Neste sentido, salientamos a necessidade de desenvolver a cultura de compliance, promover a
gestão de riscos, desenvolver canais de denúncia e remediação e promover uma
constante melhoria dos sistemas e compliance.
A cultura de compliance deve ser
patrocinada pela alta administração da organização; a partir desta decisão,
deve a corporação estabelecer um Código de Conduta, Políticas e Procedimentos
amplamente divulgado aos membros que a integram, bem como aos stakeholders.
A gestão de riscos há
de permitir permite identificar os riscos relativos à corrupção em setores,
atividades, processos e pessoas mais vulneráveis na organização; atividades de
treinamento e capacitação contínuos para informar a todos o Código de Conduta,
Políticas e Procedimentos e a legislação que lhe dá suporte.
Os canais de denúncia e
remediação devem ser acessíveis para todos, garantidas a confidencialidade e a
não retaliação; medidas disciplinares contra os infratores devem ser aplicadas,
seja qual for o cargo ou a função.
Por fim, a melhoria contínua
de compliance exige
revisão e monitoramento constantes para identificar regras aplicáveis aos
produtos e mercados, bem como problemas nos processos internos. Para aprofundar
o programa, deve-se promover due
diligence de fornecedores, incluindo terceiros com os quais se
relacionam, com direito de auditoria. A due
diligence também deve ser aplicada antes das aquisições, assim como
na integração de empresas.
É o que sempre reiteramos em
nossas palestras sobre o compliance
corporativo e treinamentos internos: é melhor prevenir a indenizar!
Fernando Borges Vieira - sócio titular da banca Fernando Borges Vieira –
Sociedade de Advogados