Imagine-se buscando em uma loja virtual uma roupa nova para um
jantar. Você acessa a barra de busca e recebe uma série de sugestões. Nada de
novo até aí, certo? Mas e se você colasse um link com o traje que você acha
inspirador e recebesse uma resposta personalizada, com o seu tamanho, e que
você pode adquirir em um estabelecimento físico, a poucos quilômetros da sua
casa? Ali mesmo a reserva seria feita, e você ainda receberia outras ofertas
que poderiam ser do seu interesse, como um sapato que cairia muito bem.
O que parece um “jogo de adivinhação” por meio da tecnologia é o
que a Inteligência Artificial (IA) espera fazer no mundo dos negócios em pouco
tempo. Esse foi um dos pontos mais interessantes que pude testemunhar no Google
Next 2024, evento da big tech que aconteceu recentemente em Las Vegas (EUA) e
que abordou as últimas novidades de inspiração, inovação e educação.
Essa capacidade de embedar a IA em um canal de relacionamento com
o cliente é um dos ganhos centrais há muito tempo já vislumbrados por empresas
e negócios. Em canais de bancos ou de instituições de saúde, as oportunidades
são muitas. É de se tirar o chapéu ao Google neste sentido, pois esse cuidado
com o usuário final é parte de seu core business e, perante as novidades
apresentadas, se vê um link grande com os mundos B2B e B2C. Ou seja, há uma
preocupação com o cliente dos clientes da companhia em suas plataformas.
Essa busca pelo protagonismo do Google também é vista em estudos
recentes. De acordo com a 7ª edição do AI
Index, compilado pelo
Centro de IA Centrada no Ser Humano (HAI) da Universidade de Stanford (EUA), os
investimentos em IA em 2023 foram de US$ 95,99 bilhões, dos quais US$ 25,2
bilhões voltados para a IA Generativa. No total, 149 modelos básicos (foundation
models) foram lançados, com a Google liderando as publicações (com 18).
Apenas o Gemini Ultra, da companhia, custou US$ 191 milhões para ser treinado,
bem acima dos US$ 78 milhões gastos pela principal concorrente, a OpenAI, no
GPT-4.
O que não mudou, e ficou reforçado no evento em Las Vegas, foi o
protagonismo do cliente no centro das operações e dos negócios. Com uma maior
profissionalização e com a consolidação de uma estrutura já presente e robusta,
o Google mostrou um portfólio de soluções integrado, que participa de ponta a
ponta dos resultados: do processador que inicia o processo, passando pela nuvem
que armazena os dados e até o usuário final, o maior beneficiário em toda a
cadeia. E a big tech quer fazer a diferença em todas as etapas disso.
Outra tendência muito clara é o desenvolvimento dos SLMs (Pequenos
Modelos de Linguagem, na sigla em inglês), mais especializados, em detrimento
ao amplos a abrangentes LLMs (Grandes Modelos de Linguagem), estes mais
generalistas e presentes no Gemini, ChatGPT e várias outras ferramentas de IA
Generativa. Com modelos pré-treinados, menores e mais especialistas, é possível
gerar soluções com custos menores e eficiência otimizada, de acordo com a
demanda necessária.
A oportunidade de complementar essa ampla gama de possibilidades
no ambiente Google é algo que atrai os olhares de consultores e especialistas
de todo o mundo. Deveremos ver muitas ofertas nos próximos meses justamente
neste sentido. O que também me parece ainda mais claro, passado o Google Next
2024, é que ainda não temos casos relevantes e concretos do uso da IA no
mercado. Há especulação, com poucos resultados práticos.
No papel, a IA vai mudar a vida das pessoas de maneira substancial
e irreversível, abrindo espaço para novos negócios e novas formas de
interpretar pequenas ações do nosso cotidiano, seja na vida pessoal ou
profissional. Porém, é certo que todo e qualquer investimento nessa tecnologia
só será possível com um caso de negócio bem desenhado, que mensure os potenciais
retornos. Logicamente, nem tudo é calculável e muita coisa ficará pelo caminho
ao longo das implementações.
Em 2023, tivemos um ano de muitas provas de conceito, de educação sobre a IA. Todos estão tentando aprender a usar, a verificar como e em quanto podem ser os ganhos em suas respectivas áreas de atividade. Mas penso que teremos mais projetos neste ano e chegaremos no futuro a uma estabilização dos modelos em algum momento, a uma equação factível de custos. Quando? Neste momento, nem o Gemini poderia nos dar uma resposta 100% apurada.
Jonatas Leandro - VP de Inovação da GFT Technologies no Brasil.
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