Conclusão é de pesquisadores da UFSCar e da University College London que acompanharam durante oito anos 7.030 pessoas com 50 anos ou mais rawpixel/Freepik |
Obesidade abdominal e fraqueza muscular, quando associadas, aumentam em 85% o risco de morte por doenças cardiovasculares em pessoas com mais de 50 anos. A constatação é de pesquisadores das universidades de São Carlos (UFSCar) e College London (Reino Unido) que acompanharam durante oito anos 7.030 participantes do English Longitudinal Study of Ageing (Estudo ELSA) com 50 anos ou mais de idade.
"A fraqueza muscular em si aumenta em 62% o risco de morte por
doença cardiovascular. No entanto, quando analisamos os dois fatores juntos –
obesidade abdominal e fraqueza muscular – observamos que o risco de morte por
doença cardiovascular aumenta para 85%. Curiosamente, as pessoas analisadas que
tinham apenas gordura abdominal não apresentaram um aumento significativo no
risco de morte cardiovascular", conta Tiago da Silva Alexandre,
professor do Departamento de Gerontologia da UFSCar e autor do estudo apoiado pela
FAPESP.
Um trabalho anterior,
que envolveu 6.173 participantes do ELSA e do Estudo SABE (Saúde, Bem-Estar e
Envelhecimento), realizado em São Paulo, já havia demonstrado que a obesidade
abdominal dinapênica (a combinação de obesidade abdominal e fraqueza muscular)
aumentava em 37% o risco de mortalidade geral. Da mesma forma, as pessoas
analisadas que tinham apenas gordura abdominal não apresentaram um aumento
significativo no risco de mortalidade geral. No entanto, ainda não estava
estabelecido naquele momento que a obesidade abdominal dinapênica aumentava
também especificamente o risco de mortalidade cardiovascular (leia mais em: agencia.fapesp.br/39452/).
Neste novo artigo, divulgado na
revista Age and Ageing, os pesquisadores explicam que a
obesidade abdominal dinapênica aumenta o risco de morte por doenças
cardiovasculares porque a gordura gera uma inflamação crônica. "Já
demonstramos que a gordura abdominal é um fator de risco para a fraqueza
muscular. Isso porque a gordura prejudica o músculo. Mas ainda não sabemos o
que vem antes: a obesidade ou a fraqueza. De qualquer forma, são componentes
sinérgicos, pois geram mioesteatose, que é caracterizada pelo acúmulo excessivo
de gordura dentro da musculatura esquelética. E essa condição amplifica a
inflamação, prejudicando o metabolismo do indivíduo e aumentando o risco de
doença cardiovascular", explica Alexandre.
Basicamente,
a obesidade mantém o sistema imunológico constantemente em alerta, ativando
células de defesa como os macrófagos, mastócitos e linfócitos T. Como
resultado, pode ocorrer uma inflamação crônica moderada conhecida como
metaiflamação, que acarreta resistência à insulina, inibição da síntese
proteica e aumento do catabolismo muscular – quando o corpo passa a obter
energia a partir das próprias fibras musculares.
Já a
dinapenia e a obesidade abdominal dinapênica podem resultar em maior disfunção
da mitocôndria – organela responsável por fornecer energia às células –, bem
como o aumento do estresse oxidativo, prejudicando o endotélio vascular e as
células do músculo cardíaco responsáveis pelo permanente fluxo sanguíneo
(cardiomiócitos), o que pode levar à aterosclerose e outras doenças cardíacas.
"Todos
esses fatores prejudicam o metabolismo e aumentam o risco de incidência de
doenças cardiovasculares e, por consequência, o risco de morte por essas
doenças", explica Paula Camila Ramírez, autora do artigo que é fruto de
seu trabalho de doutorado.
No estudo,
o diagnóstico de obesidade abdominal dinapênica foi feito com base na
circunferência de cintura maior que 102 centímetros para homens e maior que 88
centímetros para mulheres. Já a fraqueza muscular (dinapenia) foi medida usando
como referência a força da mão – menor que 26 quilos para homens e menor que 16
quilos para mulheres –, que é medida por um aparelho chamado dinamômetro.
Paradoxo
da obesidade
No estudo,
os pesquisadores surpreendentemente não encontraram aumento significativo de
risco por morte cardiovascular para os indivíduos que apresentavam apenas obesidade
abdominal (e não tinham fraqueza muscular). Os resultados do estudo contribuem
para um conceito que vem sendo abordado por especialistas que se chama
"paradoxo da obesidade".
"Sabe-se,
e os nossos números comprovam isso, que pessoas obesas têm maior risco de
apresentar doenças cardiovasculares e menor risco de morrer por isso. Isso
configura o que a literatura tem chamado de ‘paradoxo da obesidade’, algo ainda
controverso, mas com explicações bem plausíveis para o nosso achado. Uma das
explicações está [na hipótese de] a gordura servir como uma reserva energética
muito útil para o paciente com doenças cardíacas. Outro fator é que as pessoas
obesas que preservam o músculo, ou seja, que ainda têm massa muscular, têm o
metabolismo menos afetado do que as que perdem músculo e força", explica
Ramírez.
"O
nosso achado coloca mais um tijolinho na construção do paradoxo da obesidade.
Mostramos que a questão não é só a quantidade de gordura, mas sim a quantidade
de gordura e a condição desse músculo ser capaz de gerar força. Pois, quando
está com gordura infiltrada [mioesteatose], ele já enfraqueceu e isso gera uma
tempestade perfeita para o aumento de risco de morte cardiovascular",
afirma Alexandre.
Além de
apontar para os maiores fatores de risco para morte por doença cardiovascular,
o estudo também serve de alerta. "A obesidade abdominal dinapênica é uma
condição completamente reversível que pode ser tratada com treinamento aeróbio,
exercício de ganho de força muscular e alimentação adequada", diz
Alexandre.
O artigo Is dynapenic abdominal obesity a risk factor
for cardiovascular mortality? A competing risk analysis pode
ser lido em: https://academic.oup.com/ageing/article/52/1/afac301/6966518?login=false.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/obesidade-abdominal-associada-a-fraqueza-muscular-eleva-em-85-o-risco-de-morte-por-doenca-cardiovascular/42053/
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