Pesquisadores da Universidade
Estadual Paulista (Unesp) desenvolveram uma estratégia para remover da água
resíduos de glifosato – um dos herbicidas mais vendidos no mundo. Idealizada de
acordo com os conceitos da economia circular, a técnica usa como matéria-prima
o bagaço da cana-de-açúcar, um detrito gerado nas usinas durante a produção de
açúcar e de etanol.
“Isoladas e funcionalizadas
quimicamente, as fibras de celulose do bagaço podem ser empregadas como
material adsorvente [superfície sólida insolúvel, geralmente porosa, à qual
moléculas dispersas em um meio líquido ou gasoso podem aderir], retendo em sua
superfície as moléculas do glifosato. Dessa forma, é possível remover, por
filtração, decantação ou centrifugação, o contaminante da água”, conta à Agência FAPESP Maria Vitória Guimarães Leal,
primeira autora do artigo publicado na
revista Pure and Applied Chemistry.
Devido ao baixo custo e alto
potencial para intensificar a produtividade agrícola, o glifosato tem sido
amplamente empregado no controle de ervas daninhas em diversas culturas
agrícolas. Contudo, estudos apontam possíveis impactos à saúde humana, sobretudo
aumento no risco de câncer. A aplicação de produtos contendo glifosato foi
restringida ou banida em países como Alemanha, Áustria, Dinamarca, Bulgária,
Grécia, Colômbia, Costa Rica e El Salvador, entre outros. No Brasil, porém,
são usadas 173.150,75
toneladas ao ano – sendo parte desse montante carregada pelas chuvas, podendo
contaminar rios, riachos, poços e outros ambientes aquáticos.
Com apoio da FAPESP por meio de
três projetos (14/50869-6, 20/06577-1 e 21/09773-9),
pesquisadores da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Unesp, em
Presidente Prudente, buscaram uma forma para remover o produto do meio aquoso.
O trabalho foi coordenado pelo pós-doutorando Guilherme Dognani e
pelo professor da FCT-Unesp Aldo Eloizo Job.
Passo a passo
Dognani detalha o procedimento:
“Depois de triturar o bagaço, é preciso isolar a celulose, separando-a da
hemicelulose e da lignina, que também compõem o resíduo da cana-de-açúcar.
Isolada a celulose, o passo seguinte é funcionalizar as fibras, agregando
grupos de amônia quaternária em sua superfície, conferindo carga positiva ao
material, e possibilitando assim obter microfibras catiônicas de celulose
(cCMF, da expressão em inglês cationic cellulose microfibers),
que se ligam facilmente ao glifosato”, relata.
Leal acrescenta que algumas condições
podem favorecer o processo. É o caso da variação do pH, que foi o foco do
estudo. “Ao variar o pH, tanto o material adsorvente quanto o glifosato
apresentam diferentes configurações moleculares. O pH 14 é o mais eficiente
para a interação entre eles, gerando uma maior adsorção e, consequentemente,
melhor remoção”, afirma.
Para avaliar a capacidade de
adsorção, a partir de uma solução única de glifosato, foram preparadas frações
com pH 2, 6, 10 e 14, ajustadas com auxílio de pHmetro. Em seguida, foram
adicionadas a cada fração quantidades idênticas de microfibras de celulose
funcionalizadas. Os frascos com a solução contaminada por glifosato mais a
celulose foram mantidos sob agitação por 24 horas. Seguindo o procedimento
descrito na literatura, as soluções foram aquecidas em banho-maria para que a
reação ocorresse, resfriadas à temperatura ambiente e então analisadas por
espectrofotometria na região do espectro visível. A eficiência de remoção foi
calculada de acordo com a relação entre a concentração final e a concentração
inicial de glifosato em cada amostra. E a capacidade de adsorção em função do
pH foi calculada em seguida.
O artigo pH dependence of glyphosate adsorption from aqueous solution using
a cationic cellulose microfibers (cCMF) biosorbent pode ser
acessado em: www.degruyter.com/document/doi/10.1515/pac-2022-1205/html.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/metodo-desenvolvido-na-unesp-permite-limpar-agua-contaminada-por-glifosato/42199/
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