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sábado, 3 de junho de 2023

Reflexões Sobre Empreendedorismo e Metodologias Ativas

Fazer uma graduação pode desenvolver competências que preparam jovens para empreender. Recentemente, uma reportagem questionava a capacidade das instituições de ensino superior de desenvolverem conhecimentos e habilidades suficientes para incentivar o empreendedorismo. A reportagem se baseava em uma pesquisa realizada pela ABMES – Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior - em parceria com a Educa Insights e relatava que somente 32% dos jovens pesquisados acham que a faculdade oferece cursos que estimulem os alunos a colocarem a mão na massa para desenvolver soluções inovadoras para velhos problemas. Assim, para reverterem essa percepção e serem capazes de prepararem os jovens para empreender, as próprias instituições de ensino precisam inovar no seu processo pedagógico.

Para entendermos tal possibilidade, precisamos revisitar o que é empreendedorismo, suas abordagens acadêmicas e as práticas pedagógicas que podem ser usadas para atingir o objetivo de uma formação empreendedora.

Empreender é essencialmente o processo de identificar oportunidades e criar soluções inovadoras para aproveitar essas oportunidades. Tradicionalmente, as instituições de ensino costumam preparar seus estudantes para descobrir uma oportunidade, buscar recursos para o projeto e desenhar um plano para sua implantação. A partir dessa abordagem, as decisões são tomadas de forma racional com base em informações relevantes disponíveis e no cálculo da expectativa de retorno oferecida por cada opção identificada e analisada. Como produto dessa análise, os estudantes produzem um plano de negócios. Essa abordagem é conhecida como Abordagem Causal.

Contudo, na vida real, empreendedores não agem de forma tão racional. Em condições de incerteza, empreendedores adotam uma lógica de decisão diferente do modelo tradicional e racional. A lógica que prevalece é baseada no processo experimental e no aprendizado interativo, onde o empreendedor busca encontrar a melhor combinação dos meios que ele tem disponíveis. Eles partem do que conhecem e de quem conhecem, interagindo com as pessoas que elas conhecem. Nesse processo, o empreendedor experimenta, considera quais são as perdas aceitáveis, é mais flexível e trabalha com pré-acordos com quem conhece. Ou seja, não é um processo nem racional, muito menos linear. Essa abordagem é chamada de Abordagem Effectual.

Embora as duas abordagens sejam complementares, a abordagem effectual é muito mais próxima da dinâmica real de empreendedorismo que a abordagem causal. O problema é que tipicamente, as instituições de ensino preparam seus estudantes somente para a abordagem causal.

Para desenvolver a abordagem effectual em seus cursos, as instituições de ensino não podem se basear em práticas pedagógicas que privilegiem somente a dimensão cognitiva. As aulas tradicionais, que a reportagem em questão diz serem baseadas em um saber enciclopédico, são conteudistas.

É então que se faz urgente e necessário o desenvolvimento de práticas pedagógicas inovadoras, as metodologias ativas. Para formar empreendedores, as instituições de ensino precisam se preocupar em desenvolver competências e não somente conhecimentos. Quando o foco muda para a competência, as estruturas curriculares passam a considerar não somente os conhecimentos necessários, mas precisam também desenvolver habilidades e atitudes. Algumas das metodologias ativas mais indicadas para desenvolver as competências empreendedoras no ensino superior são a Aprendizagem Baseada em Projetos e a Aprendizagem Baseada em Problemas.

Nas duas metodologias, os estudantes são confrontados com dilemas e precisam em grupo criar soluções. Para tanto, desenvolvem habilidades e atitudes. Os estudantes exercitam a autonomia porque se tornam protagonistas do seu processo de aprendizagem e dos caminhos que seus projetos desenvolvem. Os estudantes precisam negociar com outros atores os recursos necessários e, como os projetos são desenvolvidos em grupo, precisam saber influenciar e mobilizar as pessoas. Praticam assim também a capacidade de trabalharem em grupo. Precisam ser flexíveis e tomar decisões com base em perdas aceitáveis. As atividades não privilegiam somente as análises racionais, mas também o processo experimental. Por exemplo, como os estudantes podem calcular a demanda de um negócio que ainda não existe? Ou como calcular o preço considerando custos que ainda não se compreendem? 

São fartos os estudos que reforçam a importância da Hélice Tríplice para o fomento da inovação e do empreendedorismo. A interação entre universidades, empresas e governo é a chave para a inovação e o empreendedorismo, isso porque a universidade é a geradora do conhecimento. Nesse sentido, desempenha papel fundamental na transferência de tecnologia e na incubação de novas empresas. Contudo, ela precisa assumir seu protagonismo na formação das mentes que impulsionarão o empreendedorismo e para isso, a sala de aula precisa mudar com a adoção de metodologias ativas que privilegiem o desenvolvimento de competências empreendedoras. Não será somente com uma disciplina de empreendedorismo, em uma sala de aula expositiva, que se forma um empreendedor.


Flávia Freitas -Coordenadora da Graduação em Administração e em Marketing da FACHA


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