Ampliação
do exame no SUS pode salvar 300 recém-nascidos por ano que sofrem de Atrofia
Muscular Espinhal (AME) no Brasil
É uma corrida
contra o tempo. Os primeiros dias de vida são decisivos para um bebê que nasce
com Atrofia Muscular Espinhal (AME). O que se passa nesse período determina se
a criança terá liberdade para brincar e crescer com mais autonomia. Nos casos
mais severos, dependente de alguém que lhe dê comida na boca, banho, troque de
roupa e supervisione os equipamentos que a ajudam a respirar a cada minuto.
Todas essas
graves consequências podem ser evitadas. Mas, por questões que vão do excesso
de burocracia à falta de conhecimento sobre a doença, bem como a imobilidade do
poder público, temos condenado quase 300 crianças por ano no Brasil a essas
condições ou, nos piores cenários, à morte.
Considerada
urgência pediátrica, a AME é o maior fator genético de mortalidade infantil,
atualmente. Uma doença rara, que afeta os neurônios, gerando fraqueza muscular
e atrofia. Em poucos meses, pode resultar na perda de controle dos braços,
pernas e pescoço, dificuldades respiratórias e de deglutir um simples alimento.
Quanto mais rápido se reconhecer o quadro, melhor chance há de dar qualidade de
vida à criança, inclusive com manutenção dos movimentos, da respiração e de
total – ou quase completa – independência. Se é assim, o que falta para
avançarmos no tratamento?
Entre os fatores
primordiais, o acesso ao diagnóstico. A triagem neonatal, também conhecida como
Teste do Pezinho, é obrigatória pela legislação e é oferecida gratuitamente
pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com objetivo de reconhecer precocemente e
tratar doenças antes de os sintomas aparecerem. Com o diagnóstico precoce, uma
criança que tenha testado positivo para AME, se medicada até os 06 meses de
idade, pode nem desenvolver a doença.
O Teste do
Pezinho tradicional abrange apenas seis doenças. Em 2021, a Lei nº 14.154
estendeu para 52 o número de enfermidades identificadas e propôs um
escalonamento em cinco fases para a incorporação das doenças. A AME será
incorporada apenas na última fase. A extensão proposta pela lei democratiza o
acesso às informações sobre saúde e facilita a realização do tratamento
adequado. Considerando a complexidade de incorporação dessas “novas” doenças na
triagem, o Ministério da Saúde ainda não se debruçou sobre essa questão. Por
isso, após dois anos de a lei ter sido sancionada, o processo segue com
pouquíssimos avanços. Até o momento, foi incorporada apenas 1 doença, disposta
na primeira fase do escalonamento. Ainda não temos sequer um cronograma oficial
de incorporação, o que compromete o cuidado com inúmeras doenças raras no país.
Além de dar celeridade a essas fases, é essencial que a incorporação da AME
seja antecipada.
Boas razões não
faltam. A partir do diagnóstico e apesar de a cura ainda não ter sido
descoberta, o tratamento é realizado no próprio SUS com medicações altamente
eficazes. Associado a esse ponto, há uma rede de apoio sólida aos pacientes
proporcionada por organizações da sociedade civil e uma capacidade admirável de
transformar a vida das pessoas para sempre com o tratamento.
Somado à possibilidade de reduzir despesas do governo e das famílias com o tratamento ao longo das décadas, apoiar o Teste do Pezinho ampliado traz um forte componente humano. Uma maneira nobre de salvar vidas e permitir que homens e mulheres de todas as classes sociais sonhem, cresçam e se tornem uma prova viva de que essa luta é essencial para melhorar as condições de saúde da população.
Adriane Loper - uma das líderes do Universo Coletivo AME (Atrofia Muscular Espinhal), maior coalizão em prol da causa no Brasil, e presidente do Instituto Fernando, criado em memória do filho. Engenheira de computação e professora universitária, também é mãe de Marcela, 13 anos.
Andréa Gozetto - consultora em Advocacy, coordenadora acadêmica da Formação Executiva Advocacy e Políticas Públicas da FGV/IDE e doutora em Ciências Sociais pela Unicamp. É co-autora do Guia para construção de estratégias de Advocacy: como influenciar políticas públicas.
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