Conscientização sobre os riscos e as ações para reduzi-los aumentaram globalmente, mas medidas de adaptação têm sido insuficientes diante da magnitude do problema, avaliam autores do novo relatório divulgado pelo órgão (cena do desastre causado pelo excesso de chuvas em Petrópolis, no Rio de Janeiro; crédito: Tânia Rego/Agência Brasil)
A conscientização sobre os riscos
climáticos e as ações para reduzi-los aumentaram globalmente. A implementação
de medidas de adaptação, contudo, ainda é insuficiente diante da magnitude dos
impactos das mudanças climáticas que já têm sido observados em todas as regiões
habitáveis do planeta e que podem se agravar em um cenário de aquecimento
global acima de 1,5 ºC dos níveis pré-industriais.
A avaliação é de um grupo
internacional de cientistas autores do novo relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), sobre impactos, adaptação
e vulnerabilidade – WGII/AR6 –, lançado nesta segunda-feira
(28/02).
Entre os
autores estão cinco cientistas brasileiros, dos quais quatro participaram da
elaboração do Sumário para os Tomadores de Decisão (SPM) publicado
conjuntamente com o relatório.
“Há uma série de medidas que foram
adotadas nos últimos anos em diferentes regiões do mundo com o objetivo de
reduzir os riscos climáticos, mas que estão mais associadas à mitigação, como a
redução das emissões de gases de efeito estufa”, diz à Agência FAPESP Jean Ometto,
pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e autor-líder
do capítulo 12 e do capítulo especial sobre florestas tropicais do relatório.
“As medidas de adaptação, porém, têm
sido muito pontuais e localizadas”, afirma Ometto, que também é membro da
coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre
Mudanças Climáticas Globais.
Na
avaliação dos autores da publicação, os governos nacionais e locais, bem como
as empresas e a sociedade civil, têm reconhecido a crescente necessidade de
adaptação às mudanças climáticas. Pelo menos 170 países – entre eles o Brasil –
e muitas cidades, como São Paulo, incluíram a adaptação em suas políticas e
processos de planejamento relacionados ao clima.
O
progresso nesse tema, no entanto, tem sido desigual e há grandes lacunas entre
as medidas de adaptação tomadas e as que são necessárias em muitas regiões do
mundo, especialmente em países com menor renda. Essas lacunas são causadas pela
falta de financiamento, compromisso político, informações confiáveis e senso de
urgência. Isso tem tornado as pessoas e ecossistemas mais vulneráveis a serem
atingidos pelos impactos das mudanças do clima, sublinham os cientistas.
“A
adaptação tem de ser uma ação objetiva e efetiva. E para que aconteça é preciso
primeiro reconhecer que os impactos das mudanças climáticas já estão
ocorrendo”, diz Ometto.
Também há
grandes lacunas na compreensão da adaptação às mudanças climáticas, como quais
ações têm o potencial de reduzir o risco climático e se podem ter consequências
não intencionais ou efeitos colaterais, causando mais malefícios do que
benefícios – chamadas de má adaptação. Entre essas ações está a construção de
muros marítimos, que podem proteger em curto prazo áreas costeiras do avanço do
mar, mas podem destruir durante as obras ecossistemas inteiros, como recifes de
coral.
“A má
adaptação pode ser evitada com planejamento e implementação de ações de
adaptação flexíveis, multissetoriais, inclusivas e de longo prazo, com
benefícios para muitos setores e sistemas”, ressaltam os cientistas.
Limites à adaptação
O autores
do relatório também apontam que a adaptação é essencial para reduzir danos,
mas, para ser eficaz, deve ser acompanhada de reduções ambiciosas das emissões
de gases de efeito estufa uma vez que, com o aumento do aquecimento, a eficácia
de muitas opções de adaptação diminui ou pode tornar-se inviável.
“Há
algumas regiões no mundo que já estão vivendo uma situação de não retorno,
apresentando uma margem de manobra para adaptação muito baixa”, diz Ometto.
A pobreza
e a desigualdade, que são questões sensíveis a países como o Brasil, também
impõem limites de adaptação significativos, resultando em impactos inevitáveis
para mulheres, jovens, idosos, minorias étnicas e religiosas, além de povos
indígenas e refugiados, destacam os cientistas.
“A
desigualdade, não só socioeconômica, mas também de acesso a serviços básicos
como água e saneamento, aumenta a vulnerabilidade de núcleos sociais.
Sociedades com altos níveis de desigualdade são menos resilientes às mudanças
climáticas”, diz Ometto.
De acordo
com números apresentados no relatório, quase metade da população global – entre
3,3 e 3,6 bilhões de pessoas – vive hoje em países com alta vulnerabilidade
humana a mudanças climáticas.
Concentrações
globais de alta vulnerabilidade estão surgindo em áreas transfronteiriças que
abrangem mais de um país como resultado de questões interligadas relativas a
saúde, pobreza, migração, conflito e desigualdade.
Desde
2008, mais de 20 milhões de pessoas em todo o mundo foram deslocadas anualmente
por condições extremas relacionadas a eventos de clima, sendo as tempestades e
inundações as causas mais comuns.
“A
diminuição da disponibilidade de água e da capacidade de cultivo agrícola em
algumas regiões já tem induzido movimentos migratórios em algumas regiões do
mundo”, afirma Ometto.
Globalmente,
a exposição a impactos causados pelo clima, como ondas de calor, precipitação
extrema e tempestades, em combinação com a rápida urbanização e falta de
planejamento estão aumentando a vulnerabilidade de populações urbanas
marginalizadas.
A pandemia
de COVID-19 deverá aumentar as consequências adversas das mudanças climáticas,
uma vez que os impactos financeiros levaram a uma inversão nas prioridades e
restringiram a redução da vulnerabilidade, indica o relatório.
Webinário sobre o relatório
Nesta quinta-feira
(03/03) a FAPESP realiza um webinário que reuni os autores brasileiros do
relatório para analisar os principais resultados e as perspectivas que o novo
documento abre para o debate sobre as mudanças completo e o sumário para
decisores políticos podem ser acessados em: www.ipcc.ch/report/ar6/wg2/.climáticas
no planeta e no Brasil.
O relatório completo e o sumário para
decisores políticos podem ser acessados em: www.ipcc.ch/report/ar6/wg2/.
Elton Alisson
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/mundo-esta-despreparado-para-os-proximos-impactos-das-mudancas-climaticas-alerta-ipcc/38040/
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