Neurocirurgião Feres Chaddad e neuropsicóloga Daniela Coelho alertam sobre os impactos dos aneurismas para o cérebro
Os aneurismas cerebrais correspondem a uma das mais importantes causas de mortalidade em todo o mundo. A hemorragia subaracnóidea, que tem como principal fator a ruptura de um aneurisma, equivale a 5% de todos os acidentes vasculares cerebrais (AVC). Esse tipo de acometimento é mais prevalente no sexo feminino, com manifestação entre 40 e 60 anos, afetando o período de maior produtividade dos pacientes.
"A detecção de aneurismas intracranianos não rotos está se tornando cada vez mais comum, com o avanço da medicina e a utilização de angiografias por TC, RM e subtração digital, que permitem a avaliação detalhada da circulação arterial intra e extracraniana com suas diversas aplicações. Entretanto, existe uma parcela de pacientes que permanecem sem tratamento ou sem avaliação neurológica adequada, o que implica na ocorrência de danos ao cérebro e sérios impactos cognitivos quando acontece a ruptura, como alterações de memória e funções executivas", explica Dr. Feres Chaddad, Professor e Chefe da disciplina de Neurocirurgia da UNIFESP e Chefe da Neurocirurgia da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Diversos estudos têm demonstrado a relação de aneurismas a altos níveis de depressão e ansiedade, déficit cognitivo, instabilidade emocional, distúrbios do sono, síndrome de estresse pós-traumático, entre outros. O estudo clínico "Cognitive function, depression, anxiety and quality of life in chinese patients with untreated unruptured intracranial aneurysms", publicado no Journal of Clinical Neuroscience, apresentou dados importantes sobre a associação de aneurismas não rotos (ainda não rompidos) com consequências neuropsicológicas.
A pesquisa avaliou a função cognitiva, a incidência de depressão e ansiedade, assim como a qualidade de vida em 31 pacientes chineses com aneurisma não tratado e outros 25 com controles saudáveis, no período de 1 mês, 1 ano e 5 anos após o diagnóstico. Foi identificado que 39% dos participantes seguiram com depressão e 32% pacientes apresentavam ansiedade leve a severa após 5 anos da detecção do aneurisma. Sobre a qualidade de vida, não houve significância ao se comparar ao grupo controle. Já no aspecto da cognição, após 5 anos houve uma diminuição significativa nas habilidades medidas pelo do MoCa em 97% dos pacientes, sugestivo de comprometimento cognitivo leve quando comparados ao grupo controle.
Outro estudo que apresenta dados ainda mais recentes é o "Unruptured intracranial aneurysm treatment effects on cognitive function: a meta-analysis", do Journal of Neurosurgery. O trabalho avaliou pesquisas que relatavam o estado cognitivo de pacientes com aneurismas intracranianos não rotos antes e após o tratamento do aneurisma. As análises consideraram oito estudos (total de 281 pacientes), focando no efeito do tratamento no funcionamento cognitivo geral, com ênfase em 4 domínios cognitivos específicos: funções executivas, memória verbal e visual e funções visuoespaciais.
Como resultado, a pesquisa evidenciou que o tratamento não afetou o funcionamento cognitivo geral, nem significativamente as funções visoespaciais. No entanto, as funções executivas e os domínios de memória verbal tenderam a ter comprometimento pós-tratamento. O desempenho de tarefas de memória visual tendeu a melhorar. Por último, o tratamento não afetou significativamente as funções visuoespaciais.
"Uma
razão potencial para a melhora na capacidade cognitiva funcional após o
tratamento dos aneurismas não rotos é o alívio da ansiedade. Antes do
tratamento, o paciente se encontra como se fosse uma “bomba-relógio”. Essa
ansiedade pode resultar em comprometimentos cognitivos importantes. Por essa
razão, o tratamento busca aliviar a ansiedade e melhorar a cognição. Por outro
lado, outros danos relacionados ao tratamento, como danos à substância cinzenta
ou branca adjacente ou danos às paredes dos vasos sanguíneos, podem contribuir
para pequenos déficits no funcionamento cognitivo", reforça Feres.
Alterações neuropsicológicas
Cerca de metade dos pacientes com hemorragia subaracnóidea por ruptura de aneurisma cerebral podem vir a demonstrar sintomas significativos de ansiedade e depressão nos tempos posteriores à hemorragia. Porém, outros fatores de influência também precisam ser considerados, tais como: quantidade de hemorragia, a localização da ruptura e o tratamento adotado.
"Quando
falamos da localização da ruptura do aneurisma cerebral, aquela que ocorre na
circulação posterior está associada a quadros clínicos mais delicados,
inclusive com índices mais elevados de ansiedade e depressão e demais
distúrbios de ordem psiquiátrica. Comparando a sua localização especificamente
à artéria cerebral média, pacientes com rupturas do lado esquerdo desta artéria
têm piores resultados cognitivos em relação a pacientes com rupturas do lado
direito", completa Feres.
Subnotificação de danos neurológicos e necessidade de acompanhamento global
"A desaternção aos sintomas neurológicos leves e intermediários, a dificuldade do acompanhamento de pacientes e grupos de risco que não acessam o sistema de saúde e a falta de atendimentos integrais que observem os impactos na saúde de maneira específica, mas abrangente, é ainda um grande desafio. Parte desses pacientes podem apresentar manifestações neurológicas e psicológicas tardias e ter seu processo terapêutico impactado. Por isso, é fundamental estabelecer o perfil cognitivo dos indivíduos atendidos, tanto antes, quanto após o tratamento, para que haja orientação neuropsicológica e indicação de processos de reabilitação que contemplem as necessidades e déficits apresentados", reforça Dra. Daniela Coelho, Psicóloga da Saúde e Neuropsicóloga - CFP, Especialista em Neurologia e Neurocirurgia – UNIFESP e Mestre em Neurologia e Neurociências - UNIFESP/
Implementar
centros de triagem neurológica em hospitais e postos de atendimento é urgente.
O acompanhamento longitudinal, com equipes multidisciplinares e check-ups
médicos regulares, é fundamental para os pacientes com aneurismas. Incluir
avaliação neurológica para examinar vários domínios cognitivos pode identificar
alterações neurológicas, de maneira precoce, e assim trabalhar na redução da
incidência de danos graves e riscos futuros.
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