A distrofia muscular de Duchenne eleva os níveis da
enzima creatinoquinase fração MB (CKMB), indicador usado para identificar
problemas cardiovasculares.
O coração é um órgão formado basicamente por
músculo. Não é incomum que, quando há suspeita de problemas cardiovasculares,
os médicos solicitem exames laboratoriais que podem indicar variações nos
níveis de enzimas que sofrem alterações quando existem problemas relacionados a
tecidos musculares. O nível sérico da CKMB - uma das três formas separadas
(isoenzimas) da enzima creatina quinase (CK) - pode apontar se um paciente
sofreu um infarto do miocárdio, por exemplo.
No entanto, o que poucas pessoas sabem é que o nível sérico da CK, também
conhecida por CPK ou enzima creatinofosfoquinase, pode ser igualmente utilizado
para encurtar a jornada de pacientes que investigam um tipo específico de
doença rara, a distrofia muscular de Duchenne (DMD). E isso pode ser decisivo
no processo de diagnóstico da doença, uma vez que, ao identificar níveis
elevados da enzima, se torna necessário o teste genético para confirmação da
suspeita.1
A DMD é a forma mais comum de distrofia muscular em crianças e se caracteriza pela
degeneração e fraquezas progressivas dos músculos responsáveis pelos movimentos
do corpo.2 Os
meninos são os mais afetados, já que a condição é causada por um defeito em um
gene do cromossomo X, portanto o filho naturalmente receberá o Y de seu pai e,
no caso de receber o X alterado de sua mãe, manifestará a doença. Essa condição
no gene impede a produção da distrofina, proteína fundamental para o
funcionamento dos músculos do corpo. Sem ela, as fibras musculares se danificam
a cada contração e relaxamento do músculo. O rompimento dessas fibras é o que
eleva os níveis de CK no sangue.3
A médica Ana Lúcia Langer, pediatra e membro do conselho deliberativo da
Aliança Distrofia Brasil (ADB), entidade que abrange mais de 15 associações de
todo o Brasil, explica que em um infarto, o coração sofre um bloqueio do fluxo
sanguíneo levando a uma lesão do músculo que, consequentemente, eleva os níveis
de CKMB no organismo. Dessa forma, pode indicar e confirmar algumas suspeitas
de doenças que danificam o músculo. “Por ser um exame simples e que os
convênios cobrem com mais facilidade, é essencial ampliar a conscientização
sobre a DMD na sociedade, para que cada vez mais o teste CK (fração MM) seja
utilizado para auxiliar na jornada dos pacientes em busca de diagnóstico e,
como consequência, permitir que eles tenham acesso a um tratamento
multidisciplinar de forma precoce para desacelerar ou até mesmo frear o
desenvolvimento da doença”.
Em geral, o teste genético para confirmar o diagnóstico será solicitado por um
especialista neuromuscular mediante alterações na creatinoquinase. Por ser mais
complexo e com custo mais elevado, os convênios tendem a pedir todo o histórico
e justificativas dos médicos, antes de autorizarem o exame genético.1
“Precisamos encurtar o diagnóstico da DMD. Isso é urgente. A idade média de
diagnóstico é 6 anos, quando muitas lesões permanentes já ocorreram, o que
dificulta muito o tratamento. Por se tratar de uma doença degenerativa
progressiva, quanto antes tivermos um diagnóstico, maiores serão as chances de
sucesso e melhor será a qualidade de vida do paciente”, ressalta a médica.
A distrofia muscular de Duchenne não tem cura. Atualmente, há terapias que tem
como objetivo postergar o avanço da doença. Para garantir a qualidade de vida
ao paciente, é importante o acompanhamento multidisciplinar tanto na área de
reabilitação como na clínica.1,4,5
Segundo a pediatra, a pessoa que tem DMD aos poucos vai apresentando
dificuldades motoras e, em estágios mais avançados, complicações para respirar.
“Por isso, o acompanhamento médico multidisciplinar visa não somente tratar os
sintomas ou possíveis problemas que venham a surgir decorrentes da distrofia,
como preparar a criança para que ela consiga desempenhar suas atividades
diárias de forma independente por mais tempo”.
Saiba mais sobre a distrofia muscular de Duchenne
A distrofia muscular de Duchenne (DMD) é uma doença de base genética que causa
fraqueza e perda de massa muscular de forma progressiva. Ligada ao cromossomo
X, ocorre em uma frequência de um caso a cada 3.500-5.000 recém-nascidos do
sexo masculino.1
A alteração genética faz com que a proteína distrofina não seja produzida. Na
ausência desta proteína, a musculatura torna-se frágil e ao longo do tempo vai
se degenerando. O saldo final é a fraqueza, que impede os pacientes de subir
escadas, caminhar e movimentar os braços ao longo da doença.4 Em fases
avançadas da DMD, o comprometimento muscular é extenso, afetando inclusive a
musculatura respiratória, com risco de morte e exigindo a necessidade de
suporte ventilatório, além de complicações cardíacas.6
Sobre a ADB
A Aliança Distrofia Brasil (ADB) é a maior organização de abrangência nacional
representativa de pessoas com distrofia muscular do País, agrega associações
regionais, fundações e outras formas de movimento social. É uma instituição
privada e sem fins econômicos. Trabalha para mudar a história das Distrofias
Musculares no Brasil, potencializando o advocacy e a defesa dos
pacientes, seja pela cura, tratamento ou pela formulação e aperfeiçoamento de
políticas públicas que possam melhor assistir as pessoas com seus familiares,
cuidadores e profissionais de saúde.
1 Araujo
APQC, Carvalho AAS, Cavalcanti EBU, Saute JAM, Carvalho E, França MC Junior,
Martinez ARM, Navarro MMM, Nucci A, Resende MBD, Gonçalves MVM,
Gurgel-Giannetti J, Scola RH, Sobreira CFDR, Reed UC, Zanoteli E. Brazilian
consensus on Duchenne muscular dystrophy. Part 1: diagnosis, steroid therapy
and perspectives. Arq Neuropsiquiatry 2017;75(8):104-113
2 Flanigan
KM. Duchenne and Becker muscular dystrophies. Neurol Clin 2014; 32: 671--688
3 Muntoni
F, TorelliS, Ferlini A. Dystrophin and mutations: one gene, several proteins,
multiple phenotypes. Lancet Neurol 2003;2(12):731-40.
4 Bushby
K, Finkel R, Birnkrant DJ, Case LE, Clemens PR, Cripe L, et al.; DMD Care
Considerations Working Group. Diagnosis and management of Duchenne muscular
dystrophy, part 1: diagnosis, and pharmacological and psychosocial management.
Lancet Neurol. 2010 Jan;9(1):77-93.
5 Moreira
ASS, Araújo APQC. Não reconhecimento dos sintomas iniciais na atenção primária
e a demora no diagnóstico da distrofia muscular de Duchenne. Rev Bras Neurol.
2009 Jul-Set;45(3):39-43.
6 Birkrant
DJ, Bushby K, Bann CM, et﹒al﹒ Diagnosis and management of Duchenne muscular
dystrophy, part 1: diagnosis, and neuromuscular, rehabilitation, endocrine, and
gastrointestinal and nutritional management. Lancet Neurol. 2018;17:251-67.
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