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segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Melatonina: os prós e contras da liberação do hormônio

Com a liberação pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) do uso da melatonina para a formulação de suplemento alimentar, o hormônio ganhou destaque, mas gerou preocupação, já que a venda sem receita médica pode resultar em uma série de problemas.


 

O lado bom da melatonina


Segundo a Dra. Claudia Chang, pós doutora em endocrinologia e metabologia pela USP e Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM); a melatonina é um hormônio produzido pela glândula pineal (uma pequena estrutura do sistema nervoso central) e responsável pelo nosso ritmo circadiano que, além de regular o estado de vigília e sono, controla temperatura corporal, equilíbrio das células, níveis hormonais, entre outras funções.

 

“Quando não há luz, por exemplo, a retina envia informações para uma região do cérebro, o hipotálamo, que manda uma mensagem até o epitálamo, fazendo com que a glândula pineal libere melatonina, promovendo o sono na ausência de luz. Daí a relação da melatonina com o sono”.

 

De acordo com pesquisas da National Sleep Foundation (NSF), pelo menos 40 milhões de pessoas sofrem com mais de 70 tipos de distúrbios do sono, e 60% dos adultos relatam ter problemas de sono algumas noites por semana ou mais. A maioria das pessoas não é diagnosticada e tratada. Além disso, mais de 40% dos adultos experimentam sonolência diurna severa o suficiente para interferir em suas atividades diárias.

 

“A privação do sono afeta a produção de novas células neuronais, gerando uma série de déficits cognitivos, como fadiga, diminuição dos reflexos, sonolência, envelhecimento precoce, queda da imunidade, dificuldade de concentração, problemas de memória e até transtornos psiquiátricos. Por isso, dormir é uma necessidade tão natural quanto comer. O momento do descanso é essencial para repor as energias, ajudar o organismo a se recompor do estresse do dia, além de auxiliar no sistema imunológico”, pontua o Dr. Adiel Rios, Mestre em Psiquiatria pela UNIFESP, pesquisador no Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP e Membro da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).


 

Onde mora o perigo


Segundo a endocrinologista Claudia Chang, ainda que haja critérios no uso da melatonina como suplementação (ter mais de 19 anos, consumir até 0,21 mg por dia, não ser gestante ou lactante e ter acompanhamento médico em casos de doenças), a liberação do hormônio pode ser perigosa.

 

De acordo com a própria ANVISA, apesar de necessária ao organismo, a substância tem contraindicações – "há riscos associados à utilização da melatonina que não podem ser ignorados: o consumo de medicamentos contendo a substância pode causar inchaço da pele, boca ou língua, perda de consciência, depressão, irritabilidade, nervosismo, ansiedade, aumento da pressão arterial e função anormal do fígado, entre outros problemas”.   

 

“Embora não haja consenso científico sobre seus supostos benefícios, a melatonina se popularizou, por meio das farmácias de manipulação, como uma substância milagrosa não só para o sono, mas com promessas para tratar emagrecimento, diabetes, enxaqueca e até mesmo câncer e doença de Alzheimer”, conta Claudia Chang.

 

O dermatologista Dr. Renato Pazzini, Membro do Corpo Clínico dos Hospitais Albert Einstein e Oswaldo Cruz, reitera. “Muitas pessoas acreditam que a melatonina soluciona problemas decorrentes do envelhecimento, como a flacidez da pele. De fato, o hormônio facilita o transporte de aminoácidos para o interior das células, proporcionando melhores condições para que sintetizem diferentes proteínas, entre elas, o colágeno. No entanto, sua atuação é indireta. O uso da melatonina, por si só, não tem efeito rejuvenescedor se não houver outros tratamentos concomitantes e, principalmente, acompanhamento médico”, frisa Pazzini.

 

A maior preocupação dos especialistas é a liberação do hormônio no Brasil sem necessidade de receita médica, motivando a “automedicação” (ainda que se trate de uma suplementação). Dados do Conselho Federal de Medicina indicam que 77% dos brasileiros fazem o uso de substâncias sem qualquer orientação médica.

 

Entre os riscos da automedicação, a intoxicação é a mais perigosa. De acordo com o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, cerca de 30 mil casos de internação são registrados por ano no Brasil por decorrência de intoxicação. Outro risco da automedicação é o fato de que, se uma substância é ministrada na quantidade inapropriada, ou ainda, se combinada a outra, ela pode mascarar sintomas de uma doença mais grave.

 

“Mesmo que a melatonina tenha baixa incidência de efeitos colaterais (dor de cabeça, sono fragmentado, aumento da incidência de pesadelo, tontura, náuseas, sensação de estar dopado, sonolência durante o dia e elevação dos níveis do hormônio prolactina), quando estes ocorrem, a causa habitualmente é a utilização de doses elevadas (acima de 3 mg) ou pela presença de substâncias ocultas na fórmula. Por isso, mesmo sem a obrigatoriedade de receita médica, é fundamental buscar orientação especializada antes de fazer uso de suplementação da melatonina”, finaliza o psiquiatra Adiel Rios.


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