Foi por um triz. Se o voto da ministra
Rosa Weber seguisse sua própria convicção, teria soado para corruptos e
corruptores o “liberou geral” da roubalheira. E o Mecanismo teria recebido, da
mais alta Corte do país, seu alvará de funcionamento. A esse ponto chegamos.
Trata-se, porém, de uma triste vitória,
cuja validade vence ali adiante quando a questão de fundo for a exame do
plenário. Nesse momento, o assunto será a constitucionalidade da pena de prisão
aplicada antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Para essa
deliberação, salvo nova interferência divina, os votos já estão contados e as
consequências, bem conhecidas.
Foi
repugnante testemunhar o vigor retórico com que os horríveis ministros Gilmar
Mendes, Marco Aurélio, Toffoli e Lewandowski,
alegando defender os pobres, votavam favoravelmente aos corruptos
milionários, cujos interesses estavam indiretamente representados pelos
dispendiosos advogados do abonado réu Lula. Aquela eloquência demagógica e
populista dos quatro julgadores não era ouvida, porém, nas celas infectas e
superlotadas dos nossos presídios. Quem não perdia uma palavra da sessão era a
nata prisional do país e aqueles que, fora das prisões, só conseguem dormir
quando soam as seis badaladas do sino da igreja sem que lhes batam à porta.
Horríveis,
esses ministros contaminados pelo lulismo. Sua prática é a mesma do réu cujo
nome estava na capa do processo em pauta, depois de furar a longa fila das
precedências. Também o réu Lula, com uma das mãos servia generosamente os ricos
enquanto, com a outra, jogava míseros farelos aos pobres.
Assim,
estamos. Fenômenos análogos já foram descritos como círculos de ferro,
referindo-se, por exemplo, às oligarquias, ou à burocracia. Nós vivemos sob o
círculo de ferro da impunidade que envolve o topo dos três poderes de Estado.
Jogam afinados. No Executivo, opera a matriz dos negócios. No Legislativo
enquanto umas leis definem os crimes, outras protegem os criminosos, embaraçam
os ritos e frustram a aplicação das penas. Do topo do Judiciário saem os
comandos que se empenham em recobrir as indecências da impunidade com as vestes
talares da justiça e o manto da mais fingida misericórdia. Ainda tenho diante
dos olhos a figura de alguns ministros, na lamentável sessão do dia 23 de
março, lavando os pés dos advogados de Lula e regurgitando admiração quando um
deles falou francês.
Não
consegui arregimentar em mim alegria suficiente para qualquer comemoração.
Breve, muito em breve, salvo milagre, o talão de cheque dos criminosos
endinheirados varrerá de seu caminho a desagradável obrigação de cumprir as
penas a que forem condenados. O círculo de ferro da impunidade se fechará e a
execução das sentenças de prisão ficará postergada para o Juízo Final, após a
ressureição dos mortos. Nessa ocasião, o horrível Celso de Mello falará por
todos.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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