Genética e grave, a SQF obriga que as
pessoas afetadas tenham uma dieta restrita de gordura.1,2
Somente aos 35 anos, o socorrista, Francisco Abreu de
Araújo, 42 anos, descobriu que tem a síndrome da quilomicronemia familiar
(SQF), doença ultrarrara que eleva os níveis de triglicerídeos no sangue,
obrigando a pessoa a seguir uma dieta alimentar restrita contendo no máximo 20
gramas de gordura por dia.1,2
A médica cardiologista e professora do setor de Lípides,
Aterosclerose e Biologia Vascular, da Universidade Federal de São Paulo, Maria
Cristina Izar, explica que a síndrome da quilomicronemia familiar, causada por
uma mutação genética, impede o corpo de digerir gorduras (triglicerídeos)
gerando um acúmulo que pode deixar o paciente debilitado e, dependendo da
gravidade das manifestações, levar à morte.2 “A SQF afeta tanto
homens quanto mulheres e pode se manifestar em qualquer momento da vida. Os
seus sintomas inespecíficos, como pancreatites e dores abdominais intensas,
levam ao subdiagnóstico da doença, que sem um manejo adequado pode agravar o
quadro do paciente. Diante da suspeita, o exame genético pode auxiliar na
confirmação do diagnóstico para a enfermidade”, explica Maria Cristina.
Desde o nascimento, os pais de Francisco, sabiam que
algo não estava certo com a saúde do filho. Vivendo em uma zona rural na época,
o casal notou o choro excessivo e a falta de ganho de peso do bebê, no entanto,
devido à falta de informações, Francisco foi rotulado apenas como "uma
criança doente". Na infância, apresentava alta de triglicerídeos no
sangue, além de manchas na pele, conhecidas como xantomas.
Embora os médicos ainda não tivessem um diagnóstico
definitivo, o controle dos triglicerídeos se tornou uma prioridade, levando
Francisco a seguir uma dieta rigorosa, embora, muitas vezes, com erros que o
faziam passar mal. “Eu comia corretamente, fazia atividade física, nunca bebi.
Há algo errado. Daí começaram os questionamentos sobre minha alimentação.
Trocavam as medicações. E eu acabava indo para outro médico”, diz ele.
Após sofrer três episódios graves de pancreatite,
Francisco decidiu que era hora de ir atrás de uma resposta definitiva. A
pancreatite é uma das manifestações causadas pela SQF. Ela costuma ser
extremamente dolorosa e ataques repetidos podem levar a danos a longo prazo ao
órgão,3 bem como a desenvolver diabetes pancreática, também
conhecida como tipo 3C.4
A cidade onde morava não contava com especialistas,
então ele viajou para Juazeiro, onde consultou endocrinologistas, nutrólogos e
nutricionistas. Foi apenas após uma consulta com um gastroenterologista, que o
encaminhou a um endocrinologista em Fortaleza, que Francisco encontrou a
esperança que procurava. Lá, conheceu uma médica, que estava conduzindo uma
pesquisa sobre doenças raras, e o ajudou a finalmente obter o diagnóstico.
Desde então, Francisco passou a buscar mais
informações sobre a doença e descobriu que sua irmã mais velha também tem a
mutação, mas a doença se manifesta de forma menos severa. Ele se engajou ainda
com a causa de outras pessoas que, assim como ele, enfrentam os desafios
causados pela doença.
Saiba mais sobre a síndrome da quilomicronemia familiar (SQF)
A SQF é uma doença rara e autossômica recessiva, ou
seja, a pessoa afetada precisa herdar de ambos os pais os genes alterados para
desenvolvê-la. Sendo assim, se pai e mãe carregam o gene alterado, cada filho
do casal tem 25% de chance de ser afetado pela doença. Estima-se que a doença
afete entre uma e duas a cada 1 milhão de pessoas no mundo e ainda não há dados
oficiais de prevalência no Brasil.1 A doença se caracteriza por uma
falha no gene responsável pela produção da enzima lipoproteína lipase (LPL), ou
por falhas em outros genes associados à função da LPL, que tem o papel de
metabolizar os triglicérides.4 Com isso, ocorre um acúmulo de
quilomícrons, que são partículas de gordura que transportam os triglicérides
pelo sistema sanguíneo. Esse excesso eleva muito as taxas de triglicérides,
desencadeando dores abdominais, pancreatites, alterações nos vasos da retina, e
lesões cutâneas, chamadas xantomas eruptivos. Para minimizar as complicações da
SQF, o paciente deve se submeter a uma dieta muito restrita por toda a vida,
normalmente de até 20 gramas de gordura por dia.1
Referências
1Burnett JR, Hooper AJ, Hegele RA, et al. Familial Lipoprotein Lipase Deficiency. In: GeneReviews® [Internet]. Seattle (WA): University of Washington, Seattle; 1993?2020.
2Falko JM. Familial chylomicronemia syndrome: a clinical guide for endocrinologists. Endocr Pract. 2018;24(8):756–763.
3Davidson M, Stevenson M, Hsieh A, et al. The burden of familial chylomicronemia syndrome: interim results from the IN-FOCUS Study. Expert Rev Cardiovasc Ther. 2017;15(5):415-423.
4Williams L, Rhodes KS, Karmally W, et al. Familial chylomicronemia syndrome: Bringing to life dietary recommendations throughout the life span. J Clin Lipidol. 2018;12(4):908–919.
5Baass A, Paquee M, Bernard S, Hegele RA. Familial chylomicronemia syndrome: an
under recognized cause of severe hypertriglyceridaemia [published online ahead
of print, 2019 Dec 16]. J Intern Med. 2019;10.1111/joim.13016.
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