Publicado há mais de cinco anos, Sociedade do Cansaço, de Byung-Chul Han, contextualizou que “cada época possuiu suas enfermidades fundamentais. Desse modo, temos uma época bacteriológica, que chegou ao seu fim com a descoberta dos antibióticos. Apesar do medo imenso que temos hoje de uma pandemia gripal, não vivemos numa época viral. Graças à técnica imunológica, já deixamos para trás essa época. Visto a partir da perspectiva palotógica, o começo do século XXI não é definido como bacteriológico nem viral, mas neuronal. Doenças neuronais como a depressão, transtorno de déficit de atenção com síndrome de hiperatividade (TDAH), Transtorno de personalidade limítrofe (TPL) ou a Síndrome de Burnout (SB), determinam a paisagem patológica do começo do século XXI.”
Os
anos de 2019 e os que rapidamente se sucederam demonstraram que embora a
Ciência esteja extremamente avançada e com capacidade de dar respostas céleres
para novos desafios, inclusive virais, ainda temos muitos desafios atrelados
com vírus. A estes se somam a aventada onda de casos envolvendo saúde mental
que parecem se avolumar mais no que se refere ao diagnóstico a cada dia,
especialmente no Brasil, país sempre apontado entre os primeiros nos rankings
de ansiedade e depressão.
A
reflexão que proponho agora é que a busca pela efetividade do direito à saúde
integral das pessoas, da qual faz parte a saúde mental, é uma luta que não
começou agora. Há leis nacionais e internacionais a respeito, diversos órgãos e
entidades cotidianamente atuando em prol de melhores condições à saúde das
pessoas há muito tempo e com alguns avanços, porém muitos desafios. De qualquer
forma, a saúde de cada um, aliás, impacta no coletivo e deve ser cada vez mais
tema de interesse individual e coletivo.
A
Organização das Nações Unidas, por meio da Agenda 2030, dá especial ênfase à
saúde e bem-estar das pessoas e mesmo antes dessa, por meio de seu clássico
conceito de saúde, já reforçava a importância do assunto. Aliás, como Ingo
Wolfgang Sarlet destaca, saúde se conecta de maneira inconteste com vida, “como
critério aferidor do que seja uma vida saudável, parece-nos apropriado utilizar
os parâmetros estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde, quando se refere
a um completo bem-estar físico, mental e social, parâmetro este que, pelo seu
reconhecimento amplo no âmbito da comunidade internacional, poderia igualmente
servir como diretriz mínima a ser assegurada pelos Estados” (2009, p. 37).
Devemos
pensar a cada dia como vamos colaborar para o completo bem-estar físico, mental
e social das pessoas e, também, de cada um de nós. As escolhas cotidianas,
nossas intenções e práticas para um estilo de vida cada vez mais saudável, isto
é, que dialogue com prevenção e tratamento de aspectos físicos, mentais e
sociais, é fundamental.
Com
isso, reforçamos que a saúde é de fato direito de todos e dever do Estado, só
que não esqueçamos que, embora o Estado deva ter uma estrutura capaz de
assegurar o mínimo para este direito, fato é que nós somos partícipes do mesmo
e podemos auxiliar muito para que a saúde realmente seja efetivada.
Por
onde começar? Sugiro algumas práticas bem simples: prestemos mais atenção em
nós mesmos, mapeando de maneira preventiva eventuais necessidades em saúde;
cuidemos melhor de nossos hábitos e relacionamentos interpessoais (laços de
família e de amizade são tão importantes para nossa saúde); em hipótese alguma
menosprezar uma questão de saúde mental, pois merece este respeito e
acolhimento adequados; e que superemos a ideia de que somos uma “Sociedade do
Cansaço”, nos tornando uma “Sociedade de Vitalidade”. Cada ação virtuosa de
cidadania ativa conectada com o potencial humano de transformar realidades é
fundamental.
Aline da Silva
Freitas - professora de Direito da
Universidade Presbiteriana Mackenzie em Campinas e doutora em Direitos Humanos
pela USP.
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