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quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Nego do Borel x Eduarda Reis - julgamento social ou judicial?

Mais um dia normal entre os internautas: Nego do Borel é acusado por sua ex noiva, Eduarda Reis, de violência doméstica. Para tanto, a influenciadora digital expôs em sua rede social que sofreu diversas agressões físicas e psicológicas do cantor, que envolviam xingamentos e desrespeito, afirmando que se sentia ameaçada por ele.

Após ter ciência de uma traição, em vídeos claramente triste e com medo, Eduarda pede que nenhuma mulher se deixe abusar, mencionando que os abusadores tentam fazer com que elas sejam taxadas de "loucas", descredibilizando qualquer posicionamento delas. Por temer pela sua segurança, a influenciadora compareceu na delegacia da mulher, narrando as agressões físicas e psicológicas.

Infelizmente, esse é um episódio mais corriqueiro do que imagina-se, pois diversas mulheres passam uma vida inteira sendo alvo de agressões psicológicas e, na maioria das vezes, nem percebem o que isso significa. E isso traduz o medo, a insegurança, achar que sempre se é culpada de tudo, entre outros sentimentos.

Por sorte, com o passar dos anos, diversas corajosas mulheres passaram a denunciar as agressões sofridas, sendo que uma das histórias mais conhecidas e emblemáticas foi a da Sra. Maria da Penha, que, em 1983, sofreu uma tentativa de homicídio, oportunidade em que seu marido lhe deu um tiro de espingarda. Apesar de ter escapado da morte, ele a deixou paraplégica e, ao retornar para a sua casa, ele tentou eletrocutá-la.

Após sobreviver ao seu marido, e não ter qualquer posicionamento da justiça brasileira, a Sra. Maria da Penha acionou o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), que levaram o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1998. Lá, o Estado brasileiro foi condenado por omissão e negligência pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, tendo que se comprometer a reformular suas leis e políticas em relação à violência doméstica.

A partir deste momento criou-se a chamada "Lei Maria da Penha", que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, tendo em seu artigo 5º definido que violência doméstica e familiar contra a mulher é composta de qualquer ação que resulte em sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial a ela. A nova legislação possibilitou, ainda, a criação das Varas Especializadas de Violências Domésticas e Familiares, que possuem competência exclusiva para processar e julgar estes crimes.

Triste perceber que muitas mulheres tiveram que passar por tanta violência e humilhação, grande parte por seus companheiros, no interior de suas casas, durante muito tempo, com muito pouca, ou nenhuma, possibilidade de resistência. Por outro lado, é esperançoso observar que existe uma significativa melhora, claro que ainda há muito para se evoluir, porém já é possível visualizar algum avanço no combate à violência doméstica. Seja na polícia, que possui, nas grandes cidades, delegacias especializadas, Delegacias de Defesa das Mulheres - DDM, aparelhadas e, na maioria, atendidas por mulheres, com tratamento adequado. Já foi o tempo em que a mulher ouvia na delegacia: "se apanhou deve saber o motivo".

Da mesma forma se observa o repúdio da sociedade que já não aceita mais esses tipos de crime. O ditado popular "em briga de homem e mulher não se mete a colher", hoje é desacreditado e, por sorte, desconhecido pelas novas gerações, especialmente nas redes sociais. Inclusive, é possível observar que os autores de violências domésticas frequentemente são repreendidos, condenados e muitas vezes excluídos, antes mesmo da investigação ser iniciada, pelas mídias sociais, sendo certo que ali o julgamento é imediato, sem a possibilidade de contraditório ou direito de defesa.

Igualmente, os patrocinadores e apoiadores não perdoam ao verem seus nomes associados aos autores de violências e, na maioria das vezes, os excluem sumariamente, simplesmente por se envolverem em notícias depreciativas, independentemente terem ou não praticado os fatos noticiados, através de cláusulas contratuais neste sentido.

Conforme se observa, atualmente não basta parecer sério, é preciso realmente ter essa postura, constantemente. Claro que não se pode confundir os julgamentos sociais, ou os realizados nas redes sociais, com o judicial. Na justiça o processo deve seguir a lei, as diretrizes impostas pela Constituição Federal - entre elas o devido processo legal, a legalidade das provas e o direito de defesa. Já nas redes sociais, a cada pauta cria-se uma régua própria do que parece aceitável ou não e, mesmo sendo muito cruel algumas vezes, dessa dinâmica têm saído diversas discussões que ajudam, e muito, muitas mulheres.



Felipe Mello de Almeida - advogado criminalista, especialista em Processo Penal, Pós-Graduado em Direito Penal Econômico e Europeu.


Luiza Pitta - advogada, Pós-Graduada em Direito Penal Econômico e associada do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM.

 

FM Almeida Advogados


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