O que
prejudica os motoristas é a falta de atenção causada pelo conteúdo da conversa,
e o não o fato de dirigir apenas com uma das mãos (Crédito: Shutterstock)
Tempo
de percurso e resposta de reação frente a obstáculos sofrem alterações quando o
motorista usa o celular, mesmo com o dispositivo em viva voz
Celular e direção são uma
combinação perigosa. A Associação
Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) revelou que o uso de celular é
a terceira maior causa de mortes no trânsito no Brasil – atrás apenas do
excesso de velocidade e do consumo de álcool pelos motoristas. São cerca de 150
óbitos por dia no país e quase 54 mil por ano provocados pela utilização
indevida do aparelho na hora de dirigir. A entidade promoveu um estudo para avaliar
a interferência causada pelo ato de falar ao telefone celular, com o
dispositivo em viva voz, e constatou que fatores humanos como a distração e a
falta de concentração, ocasionadas pelo uso do celular, podem motivar o aumento
de sinistros.
Na ocasião, com a ajuda de
um simulador de direção, foram verificados o desempenho de oito voluntários,
sendo quatro homens e quaro mulheres, com idades entre 23 e 52 anos. A
pesquisa observou que os tempos de percurso e reação, além do número de infrações
e acidentes de trânsito se elevaram quando os voluntários falavam ao celular no
mecanismo viva voz, durante a direção simulada. Em condições normais, os
motoristas levariam uma média que varia de 3 minutos e 1 segundo a 3 minutos e
48 segundos para percorrer determinado percurso. Para realizar o mesmo trajeto,
falando ao celular com o viva voz, demorariam entre 3 minutos e 14 segundos a 4
minutos e 17 segundos.
Os tempos de reação
apresentados pelos voluntários variaram de 60 a 66 segundos em condições normais
e de 62 a 74 segundos quando foram testados usando o aparelho. O número
médio de infrações de trânsito cometidas pelos motoristas testados em condições
normais foi de 2,5 e passou para 4,75 quando falavam ao celular. Já o número de
acidentes provocados aumentou de 0,5 para 1,5 em razão da distração provocada
pelo aparelho.
A Abramet calculou também,
usando dados internacionais, que gastamos entre 8 e 9 segundos para atender a
uma chamada telefônica – entre ouvir a chamada, localizar o celular, pegar,
desbloquear e atender. Se o motorista estiver a 80 km/h, por exemplo, ele vai
percorrer quase duas quadras desatento em relação ao trânsito. No caso de
mensagens de texto, a Abramet calculou que levamos de 20 a 23 segundos para
responder uma mensagem básica. Se o condutor estiver a 60 km/h, vai percorrer
quase quatro quadras dividindo a atenção entre o trânsito e o celular.
Dificilmente não vai encontrar um obstáculo pela frente.
Conscientização
A Perkons buscou informações
com o médico especialista em trânsito Aly Said Yassine, que
explicou quais são os fatores que interferem no comportamento dos motoristas
quando eles usam o celular na direção, mesmo com o dispositivo em viva voz. O
primeiro deles é o conteúdo das conversas. “O que prejudica os condutores não é
o fato de estarem com apenas uma mão no volante. O pior é dividir a atenção
entre a via e o conteúdo da mensagem. Imagine a concentração de uma mãe na
direção, se está falando com alguém da escola do filho, avisando que ele está
com febre, por exemplo”, observa o especialista.
O segundo fator é o tempo de
resposta do motorista, frente a um obstáculo, que é mais lento. “Com a atenção
desviada para o celular, o tempo de frenagem, para desviar de um pedestre ou
para respeitar o semáforo é mais devagar. Para se ter uma ideia da gravidade da
situação, a desatenção causada pelo ato de falar ao celular é maior em
comparação à falta de concentração que acomete um motorista sob o efeito do
álcool”, informa Aly Yassine.
A visão periférica é o outro
fator que sofre prejuízo quando o condutor conjuga a direção e a conversa no
celular. “Em condições normais, o motorista consegue perceber o que acontece
nas laterais, como a aproximação de um ciclista, mas quando desvia sua atenção
para o telefone, não consegue perceber o que acontece no entorno”, comenta o
médico.
Ele acrescenta que dirigir
embriagado ou falar ao celular é uma catástrofe anunciada. “Como tudo na vida,
tem hora para tudo. Não vamos de sunga no banco e nem de terno na praia. Com a
tecnologia é a mesma coisa: é preciso saber utilizá-la. Precisamos diminuir o
excesso de velocidade, a incidência de motoristas que bebem e dirigem e aqueles
que usam o celular no trânsito para conseguir diminuir as mortes causadas por
acidentes nas vias públicas”, salienta Aly Yassine.
Para Eduardo Biavati, mestre
em sociologia e consultor em educação para segurança no trânsito, o grande
problema no Brasil, é o retrocesso na legislação e nas medidas de trânsito, que
deveriam ser mais severas no que diz respeito ao uso de celulares e ao excesso
de velocidade, que são os grandes causadores dos acidentes de trânsito no país.
No entanto, na opinião dele, o que se vê, por parte dos órgãos públicos, é a
preocupação com medidas pouco efetivas, como multar pedestres que atravessam
fora da faixa e ciclistas que adotem comportamento arriscado nas ruas – a
legislação entra em vigor abril do próximo ano, conforme a Resolução
706/2017.
“Não conseguimos nem
fiscalizar o uso de celulares na direção e agora pretende-se fiscalizar
pedestres e ciclistas? O grande problema é que estamos olhando para as vítimas
e não para os motoristas, que são os causadores de mortes no trânsito quando
colocam a vida das pessoas em risco ao falar no celular quando dirigem ou
excedem o limite de velocidade, principalmente nas rodovias”, finaliza.
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